segunda-feira, 9 de abril de 2018

Esquerda, Volver: 18) Lula, uma ideia

Por Francisco Proner Ramos
"Nunca antes se roubou tanto neste país" é a frase que mais ouvimos sair da boca dos inocentes úteis. Como se roubar no Brasil fosse uma novidade petista, ou melhor, petralha. O que esses inocentes não sabem é que antes do governo petista nenhum presidente deixava ir em frente qualquer investigação que ousasse chegar a seus calcanhares. Não à toa, o procurador-geral do governo FHC foi apelidado de "engavetador-geral". A História, todos sabemos, é contada pelo viés dos vencedores. Fernando Henrique Cardoso, no entanto, a menina dos olhos dos intelectuais, sociólogo, professor universitário, escritor etc., quando virou presidente pediu pra que esquecessem o que ele escrevera. Ou seja, abandonou as convicções e se deixou engolir pelo poder. Tanto, que não fez seu sucessor...

Lula não só fez sua sucessora como também a reelegeu. E mais: durante o governo petista, a Polícia Federal e a juizada toda tiveram liberdade total pra investigar, julgar e prender. Assim, a frase com a qual iniciei esta prosa poderia ser "Nunca antes se investigou tanto neste país". Vamos criticar o PT? Boralá. Aliou-se ao Diabo (com maiúscula) pra chegar ao poder e blá-blá-blá. Concordo. E fui sempre crítico a isso (às vezes ingenuamente). Entretanto, o próprio Lula costuma dizer que é mais fácil ser oposição que situação e que todos esses partidos de extrema esquerda que o criticaram deviam antes ter uma experiência de governo. Mais uma vez concordo. Esqueçamos a ditadura e tratemos de Tancredo Neves pra cá.

Tancredo, que após sua morte foi quase canonizado, teve que se aliar ao Diabo e, morto, pôs em nosso colo um presidente — a saber, José Sarney, seu vice — que nada mais era que um representante direto dos milicos(!!!). Seu partido? PMDB. De lá pra cá, pouca coisa mudou. Entre os vices, por incrível que pareça, quem teve o melhorzinho foi justamente Fernando Collor (Itamar Franco). FHC teve como vice Marco Maciel; Lula, José de Alencar (que, comparado a Temer, foi quase um santo); e Dilma, todos sabemos, o golpista Michel Temer, também conhecido como "vice decorativo" e, nas palavras de Romero Jucá, o presidente do "pacto nacional (com o Supremo, com tudo)" e que segue no poder, apesar de tudo, tentando vender o Brasil no pouco tempo que lhe resta até a volta ao ostracismo.

Isto posto, voltemos a Lula. Se eu acho que ele é inocente? Não, não acho. Entretanto, nem mais nem menos que seus antecessores. Como diz um ditado que gosto de repetir, "não tem virgem na zona". A diferença é que existem culpados e culpados. Lula, como todo grande homem, nunca pensou em si em primeiro lugar — ao contrário dos homúnculos como Doria, Alckmin, Aécio etc., que sempre tiveram sede de poder pra usá-lo em benefício próprio. O primeiro, Doria, todos sabemos que possui uma palavra que não vale nada. "Não político", foi o mais político de todos, a ponto de trair o próprio padrinho em sua ambição pelo poder e abandonar prematuramente a Prefeitura mesmo tendo jurado que não o faria. O segundo anda "pianinho", se fazendo de morto, entregando obra incompleta e rezando pra chegar incólume até as eleições. Já o terceiro, que do pó veio e do pó nunca saiu, exigiu recontagem de votos após sua derrota nas urnas e deu início a uma perseguição que impediu Dilma de governar, e hoje todos sabemos quem é — quer dizer, todos menos Cármen Lúcia.

Nesse parangolé todo, a maior vergonha alheia que sinto é a de nossas "sóbrias" instituições, que tiveram o despudor de agir desde o princípio como um tribunal de exceção no que diz respeito a Lula. E aqui eu peço vênia aos amigos coxinhas pra que tentem por um momento deixar de lado o ódio natural ao "analfabeto" Lula e experimentem pôr em seu lugar algum ente querido. Pode ser um político que represente sua classe, pode ser um tio, um avô ou, pior, um filho!!! E por aí vai... Pensaram? Vocês dormiriam sossegados sabendo que há uma Justiça que persegue fulano e não tem vergonha nenhuma de assumir o medo da tal "opinião pública"? Aliás, que opinião pública é essa? A dos grandes meios de comunicação?

O momento em que vivemos é tão surreal que chega a ser hilário que uma das vozes que mais têm se levantado em favor de Lula seja justamente a de um inimigo histórico do petismo, ou seja, Reinaldo Azevedo. Sim, justo aquele que cunhou o termo "petralha". O Az(ev)edo hoje, dentro da "grande imprensa", surge com mais lucidez que um Ricardo Boechat da vida, que dia desses entrevistava Pepe Mujica e hoje, não sei se com medo de perder o emprego, posa de "isentão", com aquele discurso vazio de "cadeia pra todos", como se não soubesse que isso é conto de fadas. Indo na mesma onda do diretor José Padilha, este sim um fulano que deixou a "glória" subir à cabeça. Tanto, que em ano eleitoral sua netflixiana série O Mecanismo chega como propaganda eleitoreira de pura má-fé. Disso tudo, lamento mais por Selton Mello, que, pra tentar o sucesso internacional que conquistaram os colegas Wagner Moura e Rodrigo Santoro, desceu tão baixo que manchou sua até então louvável biografia.

Acabo de assistir ao último discurso de Lula. Caramba, meu! De onde o cara tira essa força? Ele é o exemplo perfeito de uma frase que gosto de usar: "Quem é, é; quem não é, não é." E Lula é. Não preciso nem dizer tudo o que seu nome representou (e ainda representa) no mundo, não preciso dizer que Barack Obama o chamou "the guy", não preciso dizer que as melhores cabeças pensantes deste planetinha têm por ele imensos respeito e admiração não só por tudo o que ele fez pelo Brasil, mas sobretudo pelos caminhos que apontou pra erradicação da fome mundo afora... Não, não preciso dizer nada. Só preciso dizer que os que o condenaram não valem seu mindinho amputado. Dê poder aos pequenos e veja como se faz uma Lilliput. Tente calar um grande e veja como ele cresce ainda mais. Parafraseando o próprio Lula, prenderam o homem, mas o que ele representa se espalha do lado de fora da cela.

Durmam com a foto acima nas retinas (né, Adolar Marin? — "Mas nossa prole é uma praga/ Que nem a guerra apaga/ Multiplicamos os ramos/ Cabemos em cada fresta/ A nossa prole é uma praga/ Que, um dia, o mundo, infesta...).


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8 comentários:

  1. Sim, parceirinho! A nossa prole é uma praga. E a resistência o nosso caminho natural. Aqui em casa, ambos andamos meio borocochôs. Tudo muito surreal, tudo quase impossível de se acreditar. Não é pra menos: a cada dia percebo que foi tudo milimetricamente planejado, desde o cheirador contestando os votos após as eleições, até o STF agora negando o HC pro presidente.
    Mas, deixa eu dizer uma coisa, Leléo: como eu admiro esse pernambucano que adotou a minha Bernô (São Bernardo do Campo) como sua terra também. Lula é uma força da natureza, como você disse no texto. É vencedor, já está na história e suspeito que ainda vá concorrer às eleições. Não joguei a toalha, não jogo!
    Resisto. Insisto.
    Abraços gonçalvinos pra tu!!

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    1. Dodô, assino embaixo. Só não tenho essa sua fé. Já tenho analisado outras opções.

      Abraços toquiotas,
      Léo.

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  2. Parabéns pelo texto Léo! O Brasil vive um pesadelo sem fim! Não consegui comemorar nem mesmo a vitória do Corinthians sobre o Palmeiras conquistando o "Paulistão". Durante o jogo fui andar no parque com a minha esposa. Eu fiquei perplexo com as notícias da prisão de Lula. Ver pessoas soltando fogos de artifício e batendo em panelas durante a detenção de Lula pela Polícia Federal deu um grande vazio! Existe a elite que não quer que as coisas mudem, porque ao invés da distribuição de renda, aqui em terras tupiniquins persiste o acumulo de renda para poucos, mas ver também parte do povo humilde comemorando a prisão dele e aplaudindo seus algozes é de pirar o cabeção! O Brasil não é para principiantes! Abraços da resistência!

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    1. Totó, a lavagem cerebral é grande, e vem de priscas eras. É preciso ter muita força pra não esmorecer. Tô alerta.

      Abração,
      Léo.

      PS: Sobre o Palmeiras, mudemos de assunto. rsrs

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  3. Leozinho, Parabéns! Só não concordo com o que disse sobre o R Azevedo. Aquilo é cobra criada e tem interesses outros nessa virada de opinião.
    Izabel Schneider

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  4. Ótimo texto Léo!
    Ótima análise
    Beijo

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