segunda-feira, 22 de junho de 2020

Esquerda, Volver: 29) O último homem (de Mary Shelley) — fragmento

Desde que o mês de abril abriu seus portões pra que entrássemos, estamos eu e minha mulher confinados. Ao final de junho, lá se terão ido três meses, mais de 90 dias, tempo suficiente pra (re)pensar muita coisa. Estamos sempre à procura de tempo, reclamando que estamos ocupados com uma série de assuntos que, na maioria das vezes, não têm importância nenhuma e mal nos damos conta de que essas ocupações todas são um artifício da sociedade pra que não tenhamos tempo pra pensar. Pois, como diz o ditado, "de pensar, morreu um burro". É mais ou menos meu caso. Não morri, contudo, pois, mais que burro, sou teimoso. Ah, pra encerrar a questão da pandemia no Japão, já há algumas semanas o confinamento se flexibilizou com a curva descendente da propagação do vírus, mas as coisas ainda estão longe de voltar a sua normalidade.

segunda-feira, 15 de junho de 2020

Os Manos e as Minas: 37) Meus salvadores no Japão (parte 2) — Érico Baymma, meu super-homem de cristal

Há milhares de anos, praticamente em outra vida, tive um grande amigo a quem — até então — eu nunca vira, mas sempre amara. Éramos um par formado por duas figuras ímpares, fora de época e lugar, cavalheiros d'antanho que se comunicavam por e-mail, aproveitando a tecnologia, mas como se essas trocas de correspondências fossem antigas missivas, muito longas por sinal; apenas economizávamos o selo e a ida ao correio. Eu aguardava com ansiedade suas respostas, longas e deliciosas, que eu mais devorava que lia. Eram outros tempos, e eu tinha tempo e ele também — ou, pelo menos, se não tínhamos o inventávamos. Seu nome, Sérgio Veleiro (até lhe fiz uma canção; ouçam-na aqui). Ele era do Ceará — eu também, mas aquele morava em Fortaleza, e eu em Sampa.

terça-feira, 9 de junho de 2020

Eu Não Vi, Mas me Contaram...: 11) Marx e o vírus

Antes de sair de casa, além de me lembrar de pegar a necessária máscara que jazia sobre a escrivaninha, meio escondida entre vários livros, também optei por resgatar de uma gaveta minha velha camiseta vermelha que tem um desenho central de Karl Marx chutando uma bola, do lado esquerdo superior um emblema da CPF (Comuna Proletária de Futebol) e do lado oposto o tão intimidador símbolo comunista da foice fazendo um xis com o martelo. Em tempos de pandemia, todo cuidado é pouco e manter afastados os indesejáveis é salutar. A cada vampiro, seu merecido alho.

terça-feira, 2 de junho de 2020

Esquerda, Volver: 28) Flores contra fuzis

Jan Rose Kasmir
fotografada por Marc Riboud
Nosso periférico planetinha anda girando estabanadamente e eu só não diria que sem direção porque segue pendente de um eixo gravitacional invisível que não permite que ele saia dando cabeçadas universo afora colidindo com astros outros. O caos reina e se prolifera. O homem, o único ser vivente que precisa de cuidados de terceiros durante anos até conseguir se erguer sobre dois pés, continua "se achando", sentindo-se Deus com poderes pra interferir no rumo da História, até que vêm tragédias naturais ou epidemias que se alastram pelo mundo provando como ele, o deus-homem, não passa de um ser insignificante enlouquecido por uma ridícula mania de grandeza. E nem eterno ele é. Com muita sorte, vai viver cem anos e terminar engolido pela terra, dentro da qual sua "eternidade" se verá metamorfoseada em adubo.