quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Os Manos e as Minas: 16) Além dos campos de Eduardo

Ultimamente, pelo menos em duas ocasiões, tratei do tema morte (aqui e aqui). E não é que me vejo obrigado novamente a escrever a respeito da malfadada? Neste 13 de agosto último, nem bem cheguei ao trabalho, liguei o computador, dei uma olhadinha nas manchetes do dia, e eis que me deparei com a notícia do acidente aéreo que matou Eduardo Campos, candidato à Presidência da República. Confesso que fiquei em estado de choque; levei mesmo uns bons minutos pra voltar a mim. Ainda incrédulo, peguei-me lendo a respeito do assunto, sem fixar a atenção no que lia, embasbacado que estava. Não, não cheguei a chorar – o Lula chorou, segundo li –, não era pra tanto. Afinal, Eduardo não era meu parente, amigo, conhecido, nem mesmo meu candidato, mas... era um cara que eu aprendi a admirar.

Claro, mais por uma única entrevista sua a que assisti no programa Roda Viva, da TV Cultura, e menos pelo que lia sobre ele na mídia impressa. Afinal, de todas as coisas que li a seu respeito, nada me havia chamado demasiadamente a atenção a ponto de me fazer considerar a hipótese de torná-lo meu candidato (pelo menos até hoje). Talvez seja miopia minha, mas, no geral, grande parcela da mídia impressa dá a impressão (perdoem o involuntário trocadilho) de simpatizar mais com o PSDB que com os demais partidos. Digo isso meio en passant, pra não chegar ao exagero de afirmar que a tal mídia se mostra claramente antipetista (e antiesquerda em geral). Mas pulemos essa parte, pois falar de partidos atualmente tem gerado em terceiros as mesmas reaações exaltadas com que outrora nos deparávamos ao falar de certos times de futebol.

Deixando, pois, de lado tanto extremistas partidários quanto torcedores fervorosos, voltemos a Eduardo. Tenho sido defensor de uma reforma política que expulse de vez da vida pública os abutres de sempre, os velhos coronéis sobreviventes de um tempo que não existe mais (ou não deveria mais existir) que, contudo, mantêm-se ali, agarrados a seus cargos, como se fossem vitalícios, impedindo assim o tal do progresso que consta de nossa bandeira, a renovação, enfim, a chegada tardia do século XXI à política nacional. A ditadura acabou, mas muitos de seus caquéticos atores continuam por aí, sobretudo em Brasília, como empecilhos à democracia, tentando manter o direito às benesses que décadas atrás conquistaram pelas armas. 

E não é que tais matusaléns parecem "imorríveis"? Daí surge um camarada como Eduardo, jovem (sim, hoje em dia, 49 anos é o auge da juventude – principalmente em se tratando de política), competente e cheio de ideias pra oxigenar o cenário político, e morre da maneira mais besta possível? Fico até com a impressão de que há alguma maldição pairando sobre nosso país. Ou que, simplesmente, colhemos o que plantamos. Afinal, toda essa imundície que estamos acostumados a ver, essas alianças esdrúxulas que dão um minuto a mais de tempo ao candidato tal e hipotética quantidade a mais de eleitores etc., tudo isso faz parte de nossa realidade também de cidadãos, não se trata apenas de um comportamento político. Podemos ver algo parecido tanto em nossas relações profissionais quanto nas pessoais.

Não acredito, portanto, que Eduardo representasse a salvação da lavoura. Não ainda nessas eleições, pelo menos. Talvez em 2018... Tanto que, como frisei acima, não o tinha como meu candidato. Sobretudo, achava um tanto ambígua sua relação de afeto com relação a Lula contrastando com as críticas que disparava ao governo Dilma. Mas, contradições à parte, sempre vejo com bons olhos o surgimento de novas figuras políticas de peso capazes de olhar mais pra frente que pra trás. Claro, possivelmente, se ele, porventura, vencesse as atuais eleições, não iria escapar de se ver tendo alguma dessas abomináveis criaturas enrodilhadas a seus pés, quais bichos rastejantes; mas apenas o fato de ter-se coligado a Marina Silva já era um sinal de que dava passos na direção oposta.

Via com bons olhos a ascensão de Eduardo principalmente porque significava uma opção a essa balança já um tanto enferrujada que traz de um lado PT, do outro PSDB. Sempre fui petista desde que comecei a exercer meu direito de eleitor (e mesmo antes), mas admito que, pra frustração minha, tenho visto o brilho dessa estrela minguar aos poucos. Claro que sei que, sob o sistema de governo atual, é impossível que alguém governe sem, como disse o ator Paulo Betti, "colocar a mão na merda". No entanto, desagrada-me perceber que o PT, após afundar suas puras mãos nessa merda, acomodou-se e acostumou as narinas à fedentina ao redor. Ainda voto no partido, porém, mais por falta de opção, visto que, por outro lado, o modus operandi tucano jamais me representou.

Claro, eu, na condição de nordestino e oriundo das camadas mais pobres da sociedade, nunca fui engabelado pelo discurso mauricinho do PSDB. Consigo até admitir certa admiração por um ou outro de seus partidários, mas o fato de jamais um de seus candidatos ter conseguido dialogar sem afetação com as classes D e E (como é o caso do sr. Aécio Never) foi o suficiente pra que tal partido não tenha merecido meu voto. O PT, ao contrário, soube melhorar a vida de milhões de brasileiros, principalmente daqueles situados abaixo da linha de pobreza. O preço foi tão alto, que resultou até em cadeia pra alguns. Não sei se eu, na pele deles, teria suportado esse preço. Por essas e outras – e até como modo de forçar o PT a rever seus padrões de ética –, a aparição de Eduardo Campos no cenário político era bem-vinda. Agora, resta Marina Silva, com suas contradições e idiossincrasias. Vejamos o que o futuro nos reserva.

Finalizo com as sempre sábias palavras de Jânio de Freitas, colunista da Folha: "O direito da sua candidatura era inquestionável. Mas, para justificá-la, Eduardo Campos recorreu, sem necessidade, ora a tergiversações, ora ao argumento de que Dilma Rousseff não corrigira as falhas do governo Lula, o que levara ao seu afastamento. Falhas que nunca apontou nos oito anos do governo Lula, ao qual integrou e depois apoiou sem restrições. Insuficiência de Dilma Rousseff a que não se referiu, nem importaram, nos dois anos e meio em que foram aliados. Por mais que o argumento pudesse ser sustentado, e Eduardo Campos não cuidou de explicá-lo, as aparências do carreirismo político prevaleceram. Quando bastaria, no entanto, até com proveito extra, apenas dizer-se portador de um projeto próprio de governo e de país. A melhor justificativa para um candidato – e, ainda que compreensivelmente incompleta –, Eduardo Campos a tinha."*

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*Fragmento de Jânio de Freitas extraído daqui.

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Gostei também da charge de Angeli:


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Assistam à entrevista que Eduardo Campos concedeu ao Roda Viva:



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