1) CIDADE ABERTA
Há algum tempo, pensando em minha relação de amor e ódio com a cidade de São Paulo, compus um soneto duplo batizado de Soneto Paulistano, que acabou ficando engavetado por falta de parceiro afim. Só que, há algumas semanas, quando fiquei sabendo que o usurpador Michel Temer era o primeiro presidente paulista em 110 anos, resolvi, num dos tantos encontros da MPB Universitária no Garagem Vinil, recitar o bendito double soneto e "dedicá-lo" ao Temerário. Fernando Cavallieri, que estava presente no dia, gostou do poeminha e me pediu autorização pra musicá-lo. Poucos dias depois, já rebatizada de Cidade Aberta, nasceu a canção que ora divulgo em primeira mão:
CIDADE ABERTA
Fernando Cavallieri – Léo Nogueira
I
Lá, onde o preconceito faz quermesse,
Onde a felicidade é uma oração
Lá, onde, em se plantando, nada cresce
Ali, plantei também meu coração
Um reino existe ali, desencantado,
Envolto em névoas e poluição
Pra lá eu sempre volto, aniquilado
Na hora em que me arrancam do avião
A chuva mata mais do que chacina
As árvores desabam nas esquinas
O céu é um manto negro de carvão
Barulho e caos nos servem de calmante
Os suicidas sentam-se ao volante
O celular engana a solidão
II
A juventude, atrás da tatuagem,
Vai maquiando sua frustração
O mar, ali, não passa de miragem
E os cães morrem de raiva ou depressão
Cidade de infeliz geografia
Onde infelizes comem macarrão
Obesos e brindando à hipocrisia
Que apelidaram civilização
Cidade aberta a todos, noite e dia
Explodem vidas na periferia
E o sangue escorre, inútil, pelo chão
São Paulo é meu futuro do passado
Com quem eu faço amor, sem ser amado
Ali plantei também meu coração
***
Fernando Cavallieri – Léo Nogueira
I
Lá, onde o preconceito faz quermesse,
Onde a felicidade é uma oração
Lá, onde, em se plantando, nada cresce
Ali, plantei também meu coração
Um reino existe ali, desencantado,
Envolto em névoas e poluição
Pra lá eu sempre volto, aniquilado
Na hora em que me arrancam do avião
A chuva mata mais do que chacina
As árvores desabam nas esquinas
O céu é um manto negro de carvão
Barulho e caos nos servem de calmante
Os suicidas sentam-se ao volante
O celular engana a solidão
II
A juventude, atrás da tatuagem,
Vai maquiando sua frustração
O mar, ali, não passa de miragem
E os cães morrem de raiva ou depressão
Cidade de infeliz geografia
Onde infelizes comem macarrão
Obesos e brindando à hipocrisia
Que apelidaram civilização
Cidade aberta a todos, noite e dia
Explodem vidas na periferia
E o sangue escorre, inútil, pelo chão
São Paulo é meu futuro do passado
Com quem eu faço amor, sem ser amado
Ali plantei também meu coração
***
2) TERMINAL
Fazia tempo que eu não publicava novidades na coluna Cançonetas, dedicada a sonetos musicados; então, como tive dois que foram musicados recentemente (o acima e este), resolvi mesclá-la com o Trinca de Copas, já que a terceira canção não é um soneto. Esse Terminal ganhou melodia de Marcio Policastro, e, apesar de aparentemente se tratar de uma canção de (des)amor, pode ser entendida também como uma metáfora dos dias atuais, se trocarmos o coração pelo Palácio da Alvorada e a musa invasora pelo atual usurpador travestido de presidente da República interino. Os puros de coração e a gente de bem podem ficar com a primeira interpretação; quanto aos demais, refestelem-se com os palavrões escolhidos a dedo pra ilustrar essa perniciosa relação. A ela:
TERMINAL
Marcio Policastro – Léo Nogueira
Não se trata de albergue pra mendigo
Nem de leito pra enfermo terminal
Se não ouve ninguém além do umbigo
Vá cortar seu cordão umbilical
Não se trata da casa do caralho
Mãe Joana jamais morou aqui
Nem pra puta que pariu é o atalho
Se quiser chegar lá, que vá por si
Se é capela ou pensão o que procura
Quem sabe uma prisão, uma clausura
Te oriento a ir noutra direção
Nem bordel, nem hotel e nem hospício
Nem palanque em carência de comício
Mais respeito com esse coração
***
Marcio Policastro – Léo Nogueira
Não se trata de albergue pra mendigo
Nem de leito pra enfermo terminal
Se não ouve ninguém além do umbigo
Vá cortar seu cordão umbilical
Não se trata da casa do caralho
Mãe Joana jamais morou aqui
Nem pra puta que pariu é o atalho
Se quiser chegar lá, que vá por si
Se é capela ou pensão o que procura
Quem sabe uma prisão, uma clausura
Te oriento a ir noutra direção
Nem bordel, nem hotel e nem hospício
Nem palanque em carência de comício
Mais respeito com esse coração
***
3) UM MINUTO NA ETERNIDADE
Meu mano Pedro Moreno me tem sido, durante o razoavelmente pouco tempo em que o conheço, fonte constante de inspiração. Vira e mexe, ele surge com algum comentário cuja ideia é altamente letrável ou mesmo com uns versos inacabados ou ainda uma prosa poética, e lá vou eu me apossar do que ele deixou escapar e transformar em letra de música. Obviamente, devolvo a gentileza e lhe entrego o produto final pra que ele o musique. Uma de nossas mais queridas parcerias nasceu de situação semelhante. Comentava ele sobre o peso do passar dos anos e a obra madura de nossos velhos papas da canção, daí não pensei duas vezes e transformei o assunto na letra desta Um Minuto na Eternidade, que ele, naturalmente, musicou. O vídeo abaixo é parte do programa La sala en casa, que coincidentemente flerta com o Na Minha Casa de Adolar Marin (vejam-no na íntegra aqui). Confiram:
UM MINUTO NA ETERNIDADE
Pedro Moreno – Léo Nogueira
Sou velho e moço
Um poço sem fim de possibilidades
Um macho enxuto
No auge absoluto da vitalidade
Sou moço e velho
Encaro o espelho com serenidade
Me calo e escuto:
O que é um minuto na eternidade?
Quem nunca para pra pensar passa batido
E tarde pensará no que teria sido
Os anos passam como carros numa estrada,
Mas só levamos, do caminho, a caminhada
Longevo e jovem
Me movem pra frente as forças dessa crença
Por isso eu vivo
Pra quem tem motivo, a vida é imensa
Mais velho é o mundo
E segue aí, fecundo e atemporal
Envelhecer
É apreender, do efêmero, o imortal
***
Sou velho e moço
Um poço sem fim de possibilidades
Um macho enxuto
No auge absoluto da vitalidade
Sou moço e velho
Encaro o espelho com serenidade
Me calo e escuto:
O que é um minuto na eternidade?
Quem nunca para pra pensar passa batido
E tarde pensará no que teria sido
Os anos passam como carros numa estrada,
Mas só levamos, do caminho, a caminhada
Longevo e jovem
Me movem pra frente as forças dessa crença
Por isso eu vivo
Pra quem tem motivo, a vida é imensa
Mais velho é o mundo
E segue aí, fecundo e atemporal
Envelhecer
É apreender, do efêmero, o imortal
***
Quem for ao Show de amanhã no Garagem Vinil ouvirá ao vivo "Cidade Aberta". Se chegar pelo menos até as 21:30, of course... :-)
ResponderExcluirÉ isso aí, Cava! Tenho recitado esse soneto em alguns saraus, e a resposta está sendo bastante favorável; cantado então...
ExcluirLéo, parceirao! Esta letra nasceu de um comentario que fiz de uma publicaçao tua sobre o Caetano Veloso (acho que era, Vinil, no qual vc falava sobre as mudanças do "Mano Caetano" ao longo da carreira. Nao me lembro extamente o teor do comentario, mas era mas ou menos que o cantor baiana nao um camaleoa, nao envelhecia.
ResponderExcluirTambém musiquei um soneto teu, lembra, chamado,Gentes?
Abraçao querido
Salve, Pedrão!
ExcluirGrato pelos detalhes! Aliás, acrescento que você musicou outro soneto, "Desistências", lembra?
Abração,
Léo.
Parceiro, gosto muito de Desistência! Forte abraço
ResponderExcluirUnknown, você por acaso seria o Edimundo, ex-Pedro Moreno? rsrs
ExcluirEu gosto muito também; esta foi inspirada por comentário do Veleiro, né?
Abração,
レオ。
Este formarto ´ñe, realmente, parecido com o do Adolar! Pura coincidência. O rapaz, seu homônimo, é colombiano, residente em Madrid. Me contatou umas duas vezes falando do seu perojeto, até que rolou da gente marcar. Ciriosamente só tive contado com o do Adolar meses depois. Forte abraço
ResponderExcluirAh, é o Edimundo, sim. rsrs
ExcluirMundo pequeno, né, parceirão? Os dois bem que podiam fazer um intercâmbio.
Abraços,
レオ。