A Copa que começa nesta quinta já tem seu grande vilão: a Fifa. Tirante esta, o outro grande vilão, pelo que ando lendo, é o Governo. Manifestantes Brasil afora gritam que não vai ter Copa, que precisam de melhores escolas, hospitais etc. Daí eu fico pensando naquele famoso ditado que diz que "uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa". Em primeiro lugar, não me lembro de ninguém se manifestando contrariamente à Copa no Brasil quando nosso país foi escolhido pra ser a sede desta edição copeira. Efeito retardado? Demorou pra cair a ficha? Em segundo lugar, noto que há certo tom político em tais manifestações, mas esses desavisados manifestantes esquecem que, fosse qual fosse o presidente eleito, nenhum deles iria se declarar contrário à realização desta no Brasil.
E por quê? Os motivos são fartos. Além da óbvia visibilidade que o País ganha, há a imensa quantidade de turistas de todos os lados que chegam com os bolsos cheios de euros, dólares y otras moneditas, loucos pra torrar tudo em nosso país tropical abençoado por Deus e bonito por natureza. Quem ia ser louco de dizer não a tão bem-vinda massa? E, ademais, há a quantidade de empregos gerados tendo como causa a Copa. Os muitos problemas brasileiros já estavam antes e vão continuar depois dela. Não vejo por que discuti-los tendo os olhos do mundo voltados pra nós. Fica parecendo aquele velho papo de lavar a roupa suja em público. O estrangeiro não tem nada a ver com isso. A não ser que você pense que é bonito discutir a relação com visita em casa. O que você acha?
Sei que manifestações são importantes, pois, bem ou mal, causam mal-estar nos governantes e os obrigam a sair da zona de conforto e encarar com mais seriedade nossos problemas mais graves, contudo, discordo um pouco do modo como são (des)organizadas, pois não levam em conta milhares de pessoas que são prejudicadas por elas. Gente que vai sofrer pra chegar ao trabalho ou pra voltar pra casa, pra pegar o filho na escola, pra levar um parente ao hospital etc. etc. Por mim, devia haver um lugar próprio pra tais atos, assim todo o resto da população não arcaria com o ônus sem ter nada a ver com a história. Mas aqui ninguém leva em conta isso. Um exemplo é a greve dos metroviários, sem entrar na questão de sua legitimidade. Estive em Buenos Aires há alguns dias e me deparei com idêntica greve lá. Só que as catracas estavam liberadas! Por que não fazer o mesmo aqui?
Voltando à Copa, outro aspecto positivo é a confraternização entre as nações. Tá, eu sei, essa é manjada, mas nem por isso menos verdadeira. Além disso, os esportes em geral, e o futebol em particular, são antônimos de guerra. Tanto que, todos sabemos, nos anos em que o mundo estava guerreando, não houve Copa. Não teria sido bem melhor se, em vez de soltarem uma bomba ali e outra acolá, matando uma infinidade de pessoas (muitas delas civis), tivessem optado por uma disputa dentro do campo? O mundo perdeu a oportunidade de assistir a duas Copas, em compensação, ganhou o extermínio de milhões. Por falar em guerra, todos conhecem a história do dia em que Pelé e o Santos pararam uma guerra na África, não? Quem não conhece, aproveitando expressão que está na moda, procure saber.
Os tempos hoje são outros, o mundo está bastante mudado, o futebol perdeu em parte sua importância (eu mesmo, na condição de torcedor palmeirense, fui aos poucos deixando o verde desbotar...), os jogadores, embora tenham se profissionalizado mais, trocaram aquele velho amor à camisa pelo amor às loiras, aos carrões e, claro, ao dinheiro (compreensível, visto terem uma carreira curta), mas não devemos nos esquecer de que em algum momento lá no passado o Brasil passou a ser respeitado internacionalmente por vez primeira justamente por causa do futebol. Assisti a um documentário bem interessante a respeito do assunto dia desses. Era sobre a Copa de 1958, ano em que o Brasil pela primeira vez se saiu vencedor da competição.
Talvez os mais jovens não saibam, mas naquela época a imagem do Brasil no exterior era a de um imenso país exótico, sem importância nenhuma, perdido nos cafundós da América do Sul. Não sabiam nem que língua falávamos. E nós, cá, sentíamos na pele, ante o mundo, o que Nelson Rodrigues batizou de complexo de vira-lata, após termos perdido, em casa (em pleno Maracanã lotado), a Copa de 1950, vencida pelos uruguaios. Então veio a Copa de 1958, na Suécia, e pela primeira vez um país sul-americano se tornava campeão em território europeu. Ou seja, nós. E nos vingando dos uruguaios em cima do país-sede, o qual derrotamos na final. Foi a partir daquele 29 de junho de 1958, após um categórico 5 a 2 comandado por um jovem Pelé, que o mundo descobriu o Brasil.
Não digo que foi só por causa disso, mas é óbvio que após essa retumbante conquista a autoestima melhorou bastante, e logo em seguida uma série de acontecimentos daria uma visibilidade cada vez maior a nosso país, como o surgimento da bossa nova, que conquistou o mundo – só então perceberam que a capital do Brasil não era Buenos Aires! Aliás, por falar em capital, pouco tempo depois esta se mudou pra Brasília, na época em que o então presidente, o mineiro Juscelino Kubitschek, prometia fazer o País progredir 50 anos em 5. Brasília, aliás, diga-se, teve seus prédios públicos arrojadamente projetados pelo arquiteto Oscar Niemeyer. Surgia também o Cinema Novo, que virava a página das velhas chanchadas e fazia o cinema brasileiro ser mundialmente respeitado.
Quem diria que 11 fulanos correndo atrás duma bola podiam causar tamanho "estrago" num país, hem? E agora, 64 anos após aquele fatídico 1950, recebemos novamente a Copa em nosso solo. Tirantes erros já sabidos, vejo nova oportunidade de mostrarmos ao mundo nossa boa hospitalidade, nossa ginga e nosso talento. Seria interessante deixarmos a política de lado na hora em que a amarelinha adentrar o gramado. Uma possível vitória nessa Copa não será só de Dilma, será de todos nós (aliás, chega a ser cômico ver a oposição torcer contra, no intuito mesquinho de faturar em cima de hipotético fracasso dos comandados de Felipão). Um futebol bem jogado também é arte, e jogar futebol é também uma profissão e, como tal, merece ser respeitada. Afinal, não é qualquer um que faz o que essa rapaziada faz. Torçamos. Vai que os bons ventos de 1958 voltam a soprar por essas bandas. Já pensou?
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