sábado, 28 de junho de 2014

Crônicas Desclassificadas: 133) Considerações sobre o Brasil nesta Copa

Sempre ouvi dizer que quem não se dá o respeito não merece ser respeitado. Este, infelizmente, tem sido o caso do Brasil. Ou, melhor dizendo, de certa parcela da população brasileira. As manifestações Brasil afora são sintomas de uma descrença geral. E eu até entendo os porquês de tal sentimento, contudo, acredito ainda em nosso país. Não a ponto de ser cego a seus problemas, mas o suficiente pra enxergar também os aspectos positivos. Muito da descrença vem da desinformação, que gera baixa autoestima e críticas exageradas, como se só aqui acontecesse isso ou aquilo. Se analisarmos, podemos facilmente chegar à conclusão de que, tirante uma ou outra peculiaridade, não somos muito diferentes do resto do planeta. 

Talvez o que diferencie nosso povo seja sua capacidade de rir da desgraça, como compus numa letra que dizia que "quem faz samba ri de si/ gingando vida afora, qual mané/ e canta quando chora e cai de pé/ por isso o samba nasce aqui". Sim, é essa capacidade que precisamos preservar, o que não significa aceitar tudo calado, mas manter a força de vontade e entender que somos capazes superar os obstáculos. Nosso acervo cultural tem fartos exemplos dessa superação. Por causa disso me entristeço muito quando me deparo (principalmente nas redes sociais) com antipatriotas (alguns deles, professores!), aqueles que acham que só no exterior é que as coisas funcionam, sem saber que parte de nossos problemas existem justamente porque lá fora nos enxergam (e nos tratam) como um país menor. Sem falar nos séculos que passamos sendo roubados.

A Copa do Mundo está aí, a pleno vapor, trazendo uma série de exemplos que podemos usar aqui. Apesar dos profetas do caos, tudo vai bem, obrigado, com os problemas de sempre, mas também com a alegria de sempre. No entanto, incrivelmente, há entre nós aqueles que adoram uma teoria da conspiração e juram que o Brasil comprou a Copa (se compramos, estamos bem de gana, digo, grana!). Estes, sem querer querendo, acabam dificultando o trabalho dos árbitros escalados pra apitar os jogos da Seleção, pois o medo de vir a favorecer pode gerar o efeito contrário, ou seja, que tais árbitros sejam severos com nossos jogadores e compreensíveis com nossos adversários. Sei que na história do futebol já houve casos bisonhos – e que a Fifa não é confiável –, mas ainda prefiro acreditar que uma partida se ganha dentro das quatro linhas do gramado.

No primeiro parágrafo me referia ao fator respeito. No período que antecedeu ao início da Copa, quase tudo o que foi publicado de ruim a seu respeito na imprensa estrangeira teve como base as notícias que foram veiculadas aqui dentro. Passei as férias no Japão e reparei que lá praticamente todos os dias havia uma notícia ruim ou, pior, desrespeitosa sobre nosso país. E agora, durante a Copa, o que estamos vendo? Uma alegria geral, estrangeiros felizes da vida, muitos gols e grandes partidas. Li até mesmo sobre gente que virou a casaca: às vésperas da Copa esperava o pior; hoje, lamenta-se por não ter tirado férias nesse período e, assim, ir aos estádios assistir aos jogos in loco. É mole? Nem vou entrar no mérito político da questão, afinal, a Copa ainda não acabou, e muita coisa ainda pode ser usada em nome dela.

A propósito, uma amiga me enviou o link de determinada coluna escrita por um espanhol sem noção publicada num jornal de grande circulação local. Como não quero dar destaque ao fulano, não vou citar seu nome, apenas uns absurdos que escreveu. A matraca espanhola começou pondo em xeque a honestidade da Fifa ao escolher o Brasil como país-sede. Tudo bem, não ponho a mão no fogo por ela, mas, se formos suspeitar dessa escolha, teremos que fazer o mesmo com todas as anteriores... Em seguida, ele destila a cantilena da turma do "#nãovaitercopa" e das notícias catastróficas pré-Copa. Detalhe: como se se tivessem realizado. Depois, justifica a eliminação de seleções tradicionais (entre elas, a Espanha, claro), pondo a culpa no calor e na umidade "horrorosos".

Pois bem, paro por aqui, senão precisaria de dois textos. Queria centrar apenas nesse nhem-nhem-nhem sobre calor e umidade. A questão não é a umidade, é a (falta de) humildade. O Brasil é um país grande (que devia ser tratado também como um grande país), bonito, heterogêneo, com climas distintos em suas várias regiões, e em todas elas existem campeonatos locais, enfim, a prática de futebol. Inclusive nas ruas, nas várzeas, nas quadras escolares... Nosso clima jamais atrapalhou tal prática esportiva. Muito pelo contrário. Digo mais: o clima, em parte, é responsável pelas características bem peculiares dos jogadores brasileiros, que são desde cedo alvo de olheiros estrangeiros. Ora, pois, se a prática de futebol por aqui fosse impossível, não teríamos tantos craques pra exportar, teríamos?

Agora, vejamos, em alguns países (não só) da Europa, jogadores são submetidos a partidas em temperaturas baixíssimas, às vezes até debaixo de neve. E aí? Tudo bem? Porque é Europa, tudo pode, mas quando se trata de América do Sul, aí não pode? Pode isso, Arnaldo? Por aqui, embora haja muitas críticas (e, nesse caso, com razão), joga-se até nas alturas, onde o ar é rarefeito. E, pra isso, ou os times chegam bem mais cedo, pra terem um período de adaptação, ou em cima da hora, pra não dar tempo de sentirem os efeitos. Oras, daí os espanhóis chegam aqui, esquecem o futebol na Espanha, tomam uma lavada da Holanda (que, enfatizemos, faz parte da Europa; sem falar que lá as temperaturas são até mais baixas) e põem a culpa no clima? Quer saber? É muito mais bonito ver alguém ter a hombridade de admitir que perdeu por incompetência própria.

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Escrevi os parágrafos acima antes do jogo Brasil x Chile, cujo desenrolar só veio ao encontro do que havia escrito. A Seleção Brasileira não vai ter moleza. Se não der o melhor de si dentro de campo, corrigir os muitos erros e aproveitar melhor os talentos individuais, há uma grande possibilidade de abreviar sua trajetória. Como brasileiro e torcedor, espero que não. No entanto, sejam quais forem próximos resultados, o Brasil (e não me refiro à Seleção, mas ao país) já ganhou esta Copa. Contra tudo e contra todos, atropelando até a "imorrível" síndrome de vira-lata à qual se referia Nelson Rodrigues. Ah, pra terminar, um recadinho à turma do contra: se você não está feliz, faça duas coisas: 1) respeite o direito de quem está; e 2) em vez de reclamar, faça sua parte. Afinal, pra seu azar, você não nasceu na Europa ou nos EUA. Então, se quiser continuar vivendo por aqui nas próximas décadas, tente melhorar o Brasil começando por melhorar a si próprio. Que tal?

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