segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Ninguém me Conhece: 25) Os fragmentos intactos de Alexandre Lemos

A primeira vez que ouvi falar de Alexandre Lemos, se não me falha a memória (e ela costuma falhar!), foi numa segunda autoral no antigo Caiubi, ainda em Perdizes, pela boca de Sonekka, enquanto este apresentava as duas canções que lhe cabiam. Em dado momento, entre a primeira e a segunda canção, disse ele: “Alexandre Lemos, pra mim, é o maior compositor vivo!”. Tomei um choque. Como é que eu nem sequer conhecia um compositor que pra um parceiro chegado era simplesmente o maior vivo? Fiquei encafifado, mas o tempo passou e acabei esquecendo o dito cujo

1) Fragmentos Intactos (Sonekka - Alexandre Lemos)

Certa noite, tempos depois, no mesmo endereço, eis que me deparo com o compositor em pessoa, que havia vindo do Rio não sei se pra conhecer pessoalmente o tão falado Caiubi ou pra fazer algum show. Não importa. O importante era que ele estava lá, e, finalmente, eu ia poder conferir com meus próprios olhos (e ouvidos), o fenômeno ALemos (pros íntimos). Confesso que fiquei frustrado. A apresentação foi morna, as canções não me chamaram a atenção de modo especial e a própria figura de ALemos me pareceu um tanto séria, pra não dizer sorumbática, o que não combina muito, convenhamos, com o que se imagina de um compositor popular. Ainda mais sendo carioca e num palco paulistano. 

Mas Alexandre Lemos não é dado a estereótipos, e, quase mineiramente, desde aquela noite, seu nome não parou mais de me rondar. Ora ouvia Sonekka cantando mais uma parceria com ele, ora era Lis Rodrigues quem cantava uma pérola do moço, ora mais outro, e mais outro. Os CDs que eu adquiria vira e mexe continham seu nome entre os compositores do repertório. Luhli, Guilherme Rondon, Fred Martins... A lista era grande. E lá vinham Tavito, Zé Rodrix, cantar uma parceria com ele ou simplesmente falar a respeito dele e de como ele era fabuloso. Calhou mesmo que um dia, em casa de minha parceira Bárbara Rodrix, no intervalo de um trabalho de lapidação de uma parceria nossa, eis que ela me mostra uma letra quilométrica e me diz: “É uma letra do ALemos que eu musiquei. Quer ouvir?”. Quis. E ouvi. Foi a gota de outra água! Quando me dei conta, estava com os olhos marejados, arrebatado, como que em transe

A partir de então comecei a prestar mais atenção em suas canções e cheguei à conclusão de que jamais ouvira nada dele que não fosse bonito, muitas eram mesmo geniais. Não chegava a ponto de dizer que era “o maior compositor vivo”, mas seguramente ele passou a fazer parte de meu exigente rol de compositores relevantes. O que não é pouco! Lembrei-me de que algumas das canções mais belas do mais recente disco de Luhli eram parcerias com ele; da mesma forma, no disco Tr3s, do Rondon, fora parcerias belíssimas com o talentoso Fred Martins e outras tantas que foram apresentadas num show em dupla com Sonekka, no Villaggio Café.

2) Por Luísa (Guilherme Rondon - Alexandre Lemos) (ouça aqui)

Mas Alexandre Lemos acabou realizando o sonho de muitos bichos-grilos que passaram os anos 70 ouvindo Casa no Campo (de TavitoZé Rodrix). Se mandou do Rio e foi morar em Minas... Numa casa no campo! E em pleno século 21! Por conta disso, foi mais um que abandonou o povo da M-Música (ver texto sobre Luhli). Mas foi, ironicamente, justamente nessa época que recebi um e-mail dele no qual me convidava a uma parceria. Não preciso dizer que fui tomado por uma grande alegria. Não é todo dia que um baita compositor, assim do nada, resolve nos convidar a parceirar. De bom grado aceitei. Enviei-lhe uma letra e ele me enviou uma melodia. Em poucos dias eu havia letrado a melodia dele e ele, por sua vez, havia musicado minha letra. Só que aí o destino pôs suas manguinhas de fora. A gravação que ALemos havia me mandado chegara cortada, de forma que eu não consegui entender a melodia inteiramente e acabei compondo uma letra sobre o que havia ouvido. A letra ficou boa, mas ele não conseguiu fazê-la caber na melodia que fizera. Em contrapartida, também minha letra que ele musicara fora por ele alterada um pouco. Sobre essa alteração fiz outras considerações, e esse pingue-pongue de e-mails, por conta de sua Internet a lenha, acabava sempre sendo muito demorado, o que finalmente nos cansou (mais a ele que a mim). Os e-mails minguaram sem que houvéssemos chegado a um veredito a respeito de nenhuma das duas. Uma parceria que prometia morria assim, de forma lamentável

Só pra efeito de registro, seguem as duas letras. A primeira, a que ele musicou, que acabou se chamando Terra do Sempre, também o nome de sua fazenda: 

Guardo em mim filosofias de botequim/ Frases de para-choque de caminhão/ Calma de nascença/ Fórmulas complexas em que o crime não compensa/ No sótão do coração./ Guardo em mim um elixir que nunca chega ao fim/ No porão, manifestos antissolidão/ Crônicas alheias/ Um harém secreto onde as belas são as feias/ Um sábado, um verão./ Guardo em mim/ No meio da sala um jardim/ E um túnel que vai dar no Japão/ Um casaco pras noites de amizades frias/ Um calor de dar inveja ao sertão./ Guardo em mim ainda o pó de pirlimpimpim,/ Pra que a Terra do Sempre seja onde eu for/ Todo o pó da estrada/ E a conclusão de que a viagem dá em nada/ Pra quem vai sem amor.

A segunda, depois de muita discussão (no bom sentido), intitulamo-la Colisão (ainda que até hoje seja um título provisório):

Ainda vou caminhar/ Sobre teu mar, como um cristo/ Sem me lembrar de que eu não sei nadar/ Navegar no imprevisto/ E me entregar ao risco/ Nas águas da tua mão/ Fosse eu a embarcação./ Ainda vou viajar/ Até tocar tua lua/ Sem me lembrar de que eu não sei voar/ Quem sabe, eu te possua/ Com asas de astronauta,/ Na alta imensidão,/ Dois corpos colidirão./ Enquanto os astros todos dormirão/ Vou entrar como um ladrão/ Do teu coração me apossar/ Vou te levar pra outra estação/ De onde trens só partirão/ Pra um destino que desatinar./ Ainda vou transformar/ Em oásis teu deserto/ Sem me lembrar de que a miragem há/ Vou me sentir liberto/ Sem descansar, decerto/ Até os ventos vão/ Me mostrar a direção./ Ainda vou atear/ Fogo às vestes do teu gelo/ Sem nem lembrar sequer de respirar/ Vou te inflamar em pelo/ No teu iglu-castelo/ Despertar o vulcão/ Que mora em tua prisão./ Enquanto os astros todos dormirão [...]/ Abre as portas do teu sonho/ Que eu me ponho lá.

Muito tempo depois, Affonso Moraes convidou a mim e a Kana pra uma reuniãozinha em sua casa. Lá encontramos, de prosa com Zé Rodrix, ninguém menos que Alexandre Lemos! Novamente me senti muito alegre, pois pensei que pessoalmente pudéssemos encontrar o entendimento que não lográramos por ondas tortas. Novamente me frustrei. Encontrei-o distante, desinteressado de mim. Quando nos despedimos, amenidades... Ainda o encontrei uma ou duas vezes, mas a verdade é que nunca houve por parte dele interesse real em que essa parceria vingasse, apesar de a ideia ter partido dele.


3) Novamente (Fred Martins - Alexandre Lemos)
Fred Martins

Este era pra ser um texto elogioso, acabou um manifesto em defesa de minha falta de tato em lidar com a rejeição... Relevem. Em meus textos sou assim mesmo, inteiro. Mesmo correndo o risco de mostrar uma face não maquiada. Picuinhas à parte, o mais importante disso tudo, como diria Zé Rodrix, são as canções. E Alexandre Lemos sabe fazê-las como poucos. Sorumbático ou não, é um compositor maior, o que é melhor que ser um risonho medíocre (estou falando sob o viés musical, entendam-me!). Quanto às nossas duas meias canções, quem sabe um dia, numa terra do sempre, entrem em colisão..

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ALemos também está no Caiubi.


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17 comentários:

  1. O Alexandre Lemos é simplesmente assim. Ali dentro tem um cara extraordinário, mas pra entrar ali é complexo, como era complexo entrar no rol de grandes amigos do zé rodrix. Tem que haver sobretudo, compreensão de que as pessoas não como queremos que elas sejam, elas são como são.

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  2. Concordo, sem tirar nem pôr. Mas me sentiria desconfortável comigo mesmo se não contasse o ocorrido, visto que foi o mais próximo que chegamos, e esses textos têm, em sua maioria, foco em meu contato direto com os descritos.

    Abração do
    Léo.

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  3. Alemos é daqueles que mereceriam um "Mecenas" pra poder compor até o último minuto dos seus 146 anos de idade, sem se preocupar com a conta de água, de luz...

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  4. Pô, Ricardim, mas aí acabariam os temas! A preocupação com as contas, pelo menos pra mim, ajuda na inspiração. Hehehe!!! No mais, com um mecenas, acho que ele ia era viajar. Hahaha!!!

    Bom te ler por aqui, ainda que bissextamente.

    Abração,
    Léo.

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  5. Léo, você ousou falar de *Deus* putz agora complicou... assim eu chamo o Alemos por quem me apaixonei musicalmente claro desde a primeira vêz que o vi com aquela barba imensa e filmei ele cantando com Fred Martins(outra paixão aff) um encontro inesquecível a primeira vêz que autor de letra cantava com autor de musica sua parceria feita anos antes e nunca cantada juntos a obra prima "NOVAMENTE", nossa que viagem foi aquilo, desde então como não fico filosofando como vcs compositores eu só babo, babo e babo nas musicas, filmo adoidada,curto o amigo, e levo meu babador cada vêz que o encontro como hoje! e ó Léo tiro meu lenço(não uso chapeu) procê ousar assim foi ducaraléo, hoje amo mais ainda você!!! amei o texto!Valeu...beiju ( só tem um erro..a foto não é minha!)

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  6. Pô, no meu show de hoje rola minha única parceria com o Alemos (NA SOMBRA DA TUA LUZ, tumém com o Affonso Moraes e com o Léo Costa). É a estréia da danada, que tanto tem me alegrado, em sua tristeza. Ah, de quebra cantamos umas duas com esse Léo Nogueira (NOVELO, também com o Alê Cueva e NA MODA, também com o Léo Costa). Todas virgens ou pouco usadas! Abs.

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  7. Moniketa! Belo depoimento, mas... Deus? Deixo-lhe então as palavras do não menos "divino" Celso Viáfora: "Porque, se deus não tem deus, como é que pode querer que eu seja crente sendo ele um ateu?"

    Salve, maninho!!! A essas alturas, o show tá acabando. Deve estar sendo um baita show! Pena que não pude ir, mas fiquei curioso pra ouvir o som.

    Beijos gerais do
    Léo.

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  8. Tá tudo gravado! O de bom e o não! Abs.

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  9. As palavras do Léo a meu respeito ( à parte o sorumbático rsrsrs ) estão impregnadas dessa gentileza além da conta que tem sido a marca registrada do tratamento que recebo, desde sempre, dos caiubistas. Nossa parceria realmente bateu na trave mas não por rejeição minha à ele, foi apenas um desses acasos infelizes que fazem parte do jogo. Mas o Léo está bem servidíssimo de parceiros talentosos, e seus versos e rimas têm ecoado em canções belíssimas pelo mundo afora. Obrigado mais uma vez, Léo Nogueira, pelos elogios desmedidos.

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  10. Àlvaro, mano! Sou todo ouvidos!

    ALemos, as palavras são ainda poucas. Releve o "sorumbático", impressão antiga, que se foi com o vento, confrontada com obra tão maior.

    Abraços do
    Léo.

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  11. ah! meu parceiro em 4 musicas.
    Agora só falta vc, Léo!
    ps- curti muito saber do meu parceirinho.Valeu!
    bjs

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  12. Valeu, Irinéa. Vamos engatilhar a nossa também já, já.

    Por hora, Feliz Ano Novo!

    Léo.

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  13. Gosto tanto das músicas do Alexandre que simplesmente 4 das 12 músicas do meu CD são dele. Precisa mais?
    Sou fãzoca até o último fio de cabelo cacheado!
    Beijão,
    Danny.

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  14. Salve, Léo!
    O Alexandre Lemos me parece um artista muito delicado com a sua arte, muito concentrado por isso o resultado é de uma grande beleza. O que escutei do Alexandre Lemos, suas parcerias, outros intérpretes, gostei muitíssimo...
    É um dos ilustres desconhecidos da grande maioria, infelizmente...

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  15. Essa ideia de repostar os textos por conta do aniversário dos homenageados é realmente muito boa. Gente que não tinha lido antes lê, e gente que já tinha lido lê de novo.

    Danny, Cláudio, obrigado pelos comentários, que, embora sejam dirigidos ao ALemos, sinto-os como se fossem dirigidos a mim.

    Beijão do
    Léo.

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  16. Salve Alexandre Lemos! Tens razão Leo ele é super hiper sorumbático... Mas é tri!
    :))

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  17. Hahaha!!! Anja, agora fiquei encafifado! Você o conheceu pessoalmente ou meu texto que te contagiou?

    Beijão do
    Léo.

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