quarta-feira, 1 de julho de 2015

Crônicas Classificadas: 39) A little help, my friends

Já falei mais de uma vez isso por aqui, mas não custa repetir: considero meu camarada Edu Franco uma das inteligências mais apuradas dentre meu rol de amizades. Além de músico e compositor, versa com naturalidade e desenvoltura sobre os mais diversos assuntos. Aliás, na escrita, sua pena é toda estilosa, tanto que, até quando verborrágica (o que costuma suceder amiúde), prende-nos a atenção, e a leitura resulta prazerosa. Só lamento que Edu tenha mais talento pra teorizar que pra executar. Contudo, seus pensamentos filosóficos sempre desaguam em boas prosas. E importantes, sobretudo no meio musical – que é aquele pelo qual transitamos –, visto que estamos um tanto carentes de ideias/cabeças lúcidas que saibam, senão enxergar uma luz no fim desse interminável túnel, ao menos iluminar a escuridão.

Dia desses, Edu atacou novamente: escreveu no facebook (aqui) um novo desabafo, que gerou um intenso debate por lá. Eu tinha uma ou duas palavrinhas a gastar sobre o assunto, mas preferi trazê-lo pra cá, assim democratizamos a discussão e acrescentamos a ela também a opinião dos leigos. Por falar neles, é interessante também que tenham mais contato com o outro lado da arte e dos artistas. Muito fã costuma gostar deste ou daquele artista levando em conta o grau de fama que este atingiu, ignorando que o buraco é mais embaixo e desconhecendo por completo os percalços pelos quais passam tantos geniais – e desconhecidos – artistas desse nosso Brasilzão que ora chora a perda de... de... de... como era mesmo o nome dele?

Ao debate, pois. Se aprochegue e traga suas ideias:


A little help, my friends
Por Edu Franco

Gentes amigas da música [...]; não sei se é só comigo, mas juro que nunca me senti tão desmotivado em minha vida com a música. Será que é por que eu não sabia quem era Cristiano Araújo? (risos)

Sempre procuro guardar os momentos de pessimismo só para mim, mas dessa vez tá difícil. Não vejo mais sentido em nada, em criar, em fazer show que não tem público, em estudar, praticar, não vejo tesão em nenhum aspecto... que coisa! Terminei um show bacana há um mês feito de encomenda para o ECI do Parque da Água Branca: foi bacana por reviver meus tempos de espetáculos e teatro com a Miriam Muniz – aquele grupo da Miriam era uma delícia, muita gente trabalhando junto, focada, confusão todo dia, ensaio, chopinho depois; hoje parece tudo tão solitário, cada qual no seu quadrado... Sinto como se fizesse parte de uma tribo extinta, como diz a música do Vander Lee: "meus amigos são amigos de ninguém", ninguém por todos os lados, canto acompanhado por um coro de silêncios... Que fase desoladora! Desculpem o desabafo, é que guardar um sentimento desses todos os dias só para si é enlouquecedor.

Há tempos, venho procurando outra profissão, trabalho, atividade, mas não é fácil isso em idade avançada num país como o nosso, onde depois dos 40 somos velhos. Tá difícil de imaginar e definir o que vem depois disso; sinto como se tivesse jogado a vida no ralo de um grande engano: fomos enganados pela história, não fazemos parte do Brasil profundo do Pedro Alexandre Sanches – o Brasil profundo dele anda de Camaro amarelo e compõe refrãos com onomatopeias; meu Brasil perdeu seu carro mil e anda pela madrugada perigosa dos novos tempos com um violão nas costas.

Estamos sendo dizimados, enquanto essa música de timbres horríveis, melodias ridículas, letras inacreditáveis, é sucesso de crítica e público. "Chegou o momento de pendurar a viola?", é o que me pergunto todo dia. Trabalho há 20 anos com uma dor insuportável nas mãos, uma doença chamada mialgia dos intrínsecos, movimento repetitivo de tocar horas e horas nos bares da vida... Tem dia que toco uma beleza, tem dia que a mão não segura nada; se treino demais a dor aumenta, se não treino não progrido.

Eu, que sempre vivi de cantar, não sei mais o que pensar. Desculpem-me pelo bode, afinal, além de toda essa "felicidade" desse mundinho "facebooquiano" tem o mundo real, e esse eu nunca vi tão desmobilizado, desmotivado e sob isolamento; a solidão do ofício nos farta atualmente, além do mundo vitorioso e feliz do facebook. Eu me lembro do verso da velha canção ao pedir desculpas pelo desabafo. "Amigo é pra essas coisas" também.


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14 comentários:

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    1. Eduzão, tamo junto, meu velho! É isso aí, a gente tem mais é que botar pra fora as coisas que nos incomodam, pra que não fiquemos doentes depois.

      Abração,
      Léo.

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  2. Falou tudo que eu gostaria de dizer. :) MUito bem! A pessoa se esmera, ensaia.. faz das tripas coração.. apresenta um lançamento de um disco, de um livro, de uns quadros... nem parentes aparece,. nem irmãos... nem amigos por consideração. :( Já aos show das claudias leite e luans santanas vão milhões :( Ídolos deixados de lado sem a minima consideração... Tá todo mundo aí na estrada... batalhando.... De Zé Ramalho a Jerry Adriani Leno e Leoni, Marcio Greicks e Sergio Sampaio que Deus o Tenha... mas ate hj nenhuma reverência a ele e tb os Ilustres desconhecidos da Musica autoral... todos comendo poeira no rastro do milionário mau gosto musical imposto pela mídia a um povo que infelizmente não tem culpa

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    1. Anja, seu depoimento me lembrou que Chico Buarque, há muito tempo, quando da gravação de "Brejo da Cruz", disse que um país forte, mas repleto de gente ignorante, pode ser muito perigoso. O tempo passou, e hoje sentimos isso na pele, seja pela intolerância vigente, seja pela passividade em ouvir só o que nos empurram tímpanos adentro...

      Beijos,
      Léo.

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    2. Oi, Anja! não tenho tanto certeza de que o povo (nós) não tenha culpa.
      Afinal o quadro que vislumbramos, agora, foi e ainda é construído por nossas próprias relações sociais e políticas. E vivemos hoje a era da informação...

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    3. Salve, Cláudio! Bom te ler por aqui de novo!

      Cara, a era da informação é também a era da informação manipulada. Mas vou me ater ao assunto música, que é sobre o que trata o texto. O povo ouve o que lhe empurram, as pessoas em geral não têm tempo nem interesse de pesquisar, sondar, procurar outras alternativas que não a mais fácil. Sem falar no jabá, que facilita a execução de uns em detrimento da de outros.

      Abração,
      Léo.

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  3. Eu também não sabia quem era o recente ilustre defunto...
    Atualmente, aos 51 anos, estou estudando para tornar-me um profissional de redes de computadores e tenciono fazer, algum dia, para meu próprio prazer, o meu cd.

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    1. Folgo em saber de suas conquistas, Cláudio! Sorte aí!

      Abraço,
      Léo.

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    1. Zabé, esta é só uma entre tantas histórias que conheço de pessoas próximas a mim...

      Beijo,
      Léo.

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  5. Hoje tudo é descartável, e arte produto de consumo. Ninguém quer saber de reflexão, a indústria que transformou, não só a arte, mas também a cultura em mercadoria, se interessa em vender efemeridades, para mentes viciadas, é disse que ela vive. E junte a isso, uma massa enorme de pessoas sujeitas a uma vida chata, sem graça e repetitiva, louca pra ser feliz e lhe ofereça rimas fáceis, ritmos alegres, tudo alí na tv de casa. Pronto! Poesia pra que? Pensar em que? Contemplar o que? Uma boa dose de monossílabos na música é diversão garantida, e daqui seis meses temos uma música nova e um famosinho novo ou famosinha nova, para garantir a imatura e confortável felicidade passageira.....eu tb não conhecia o cantor que faleceu, mas tb não assisto TV. Faz tempo, me livrei deste caixote e não tenho sentido muita falta. Ah! Não estou criticando o pagamento a artistas, por seu trabalho. Jamais... Quão incoerente seria eu ao defender essa ideia. Eu critico a desigualdade, mas sei, tb, que é consequencia da estrutura que fomos construindo, uns por hegemonia e outros por consenso. Eu me comovo, quando vejo um artista triste por falta de reconhecimento...profundamente.

    E pra vc Leozinho
    Sucesso, sempre! Muito, muito!
    Vc tb merece.
    Super beijo...

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    1. Vanessíssima, falou tudo!

      Acrescento apenas que não critico artistas por suas escolhas. Cada um sabe onde o sapato aperta. Minha crítica é direcionada a essa indústria maquiavélica que procura embrutecer (e emburrecer) corações e mentes... passando pelos ouvidos.

      Beijos,
      Léo.

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    2. Isso! Os artistas não têm o que ser criticados, cada um tem seu caminho.
      A crítica é para a industria, mesmo!

      O Caetano mandou um abraçaço
      Mas eu mando um beijaço, tá
      kkkkkk

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    3. E eu aceito! rs

      Outro beijaço,
      Léo.

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