quinta-feira, 7 de maio de 2015

Crônicas Desclassificadas: 161) Alguns pensamentos barulhentos sobre o panelaço-aço-aço-aço

Terça-feira passada, durante os dez minutos do programa do PT em rede nacional, novamente os paneleiros fizeram seu carnaval. Segundo a Folha de S.Paulo, o tal panelaço ocorreu em dez Estados mais o DF. Vejamos: fora o Distrito Federal, o Brasil possui 26 Estados. Se dez deles "panelaram", significa, se não erro a conta, que 16 deles ficaram em silêncio. Portanto, a manchete da Folha poderia bem ter sido "Durante programa do PT, 16 Estados não fizeram panelaço". Percebem como as coisas sempre podem ser vistas por ângulos diferentes? E mais: nesses dez Estados + DF, não foram em todas as cidades nem em todos os bairros que a barulheira ocorreu. Ou seja, se fizermos a conta de forma isenta, chegaremos a um resultado pífio.

Não é de hoje que a mídia tende a espetacularizar manifestações anti-PT. Já desde antes do surgimento do ex-presidente Fernando Collor era assim. E, quando penso nos porquês dessa ojeriza, só posso chegar à conclusão de que ainda hoje há quem tema que o Brasil possa virar uma grande Cuba (ou Venezuela, como prefiram). Mas sejamos sensatos: se o PT quisesse isso, após Lula ter governado por oito anos Dilma estar em seu quinto, já teria havido tempo suficiente pra que tal processo tivesse sido posto em marcha, não? Em contrapartida, há muito paneleiro com complexo de vira-lata que sonha com o dia em que o Brasil venha a se tornar os EUA da América do Sul. Nesse dia, nosso país dominará a parte de baixo do continente e descontará nos vizinhos a exploração sofrida por parte do Tio Sam.

Coincidentemente, acabo de assistir ao filme J. Edgar – de Clint Eastwood, com Leonardo DiCaprio no papel principal, em sua melhor atuação na telona até hoje –, que conta a história, obviamente, de J. Edgar Hoover, o cara que durante 48 anos dirigiu o FBI. Durante essas quase cinco décadas, Hoover teve ideias brilhantes, como a de manter um arquivo dos cidadãos por suas impressões digitais, mas também não se furtou a burlar a lei, com provas falsas, escutas telefônicas etc. Inclusive, como era racista, fez de tudo pra que Martin Luther King recusasse o Nobel da Paz. Sem êxito, claro. Conta-se também que ele, que nunca se casou, era um homossexual reprimido que manteve, às escondidas, um longevo relacionamento com seu vice-diretor, Clyde Tolson.

Mas a vida sexual de Hoover só a ele interessa(va); escrevi o parágrafo acima apenas porque o achei uma figura bem complexa, que se considerava um mocinho, mas, com seus paradoxos e contradições, utilizava-se de métodos no mínimo polêmicos no intuito de proteger os Estados Unidos dos, digamos, bandidos (qualquer lembrança a Hitler não será mera coincidência). Citei-o sobretudo porque ele ganhou fama no começo da carreira por perseguir... comunistas. E "possíveis" comunistas, entre os quais figuraram artistas ilustres como John Lennon e Charlie Chaplin. Este último, como todos sabem, acabou perdendo seu visto estadunidense em 1952 e teve que se exilar na Europa durante décadas, só voltando aos EUA 20 anos depois pra receber um oscar especial pelo conjunto de sua obra.

Algum paneleiro surdo pode estar se perguntando agora o quê que Edgar tem a ver com o andar da carruagem. Respondo-lhe, nobre reaça: toda vez que ouço "Fora, Dilma", "Fora, PT", seguidos de um estridente e insuportável barulho de bater de panelas, não sei se tenho pena da ingenuidade do obediente pau-mandado ou se temo seriamente pelo futuro dessa nossa imensa naçãozinha. Já disse aqui várias vezes que sou um esquerdista crítico que não cansa de apontar os erros do PT, contudo não posso aceitar um bando de meninos mimados, escoteiros barbeados, querendo solucionar os problemas do país extirpando do mapa um partido que, admita-se, é dos poucos que fizeram algo relevante pra que o brasileiro comum ganhasse um pouco mais de dignidade.

E eu pergunto ao ingênuo paneleiro: nobilíssimo cidadão, quais são suas reais intenções ao exigir que o PT seja extinto? Por acaso você acha que com isso a corrupção no Brasil acaba? E aí, suas excelências Renan Calheiros e Eduardo Cunha, cada um deles em seu respectivo trono, transformarão nosso país num mar de rosas? Deixe-me ver se entendi: então os professores deixarão de tomar porrada da polícia e passarão a receber salários dignos, é isso? Ou será que suas intenções permeiam o umbigo e você quer mais é que o pobre volte pro arrabalde, o preto pra senzala e o professor cada vez ganhe menos e tome mais porrada? Sim, porque professor de pobre tem mais é que tomar porrada mesmo, né? Fica aí pondo minhoca na cabeça de moleque remelento...

Talvez o paneleiro ache que o Brasil precisa mesmo é de um Hoover pra botar ordem na casa. Sei lá, um cara com o perfil de Jair Bolsonaro, pra mandar todos os "cumunistas" pra Cuba. Daí, o que aconteceu nos EUA com Chaplin & cia. poderia acontecer por aqui também, né? Essa corja de esquerdistas famosos ia ser varrida de vez de nosso cenário: Chico BuarqueJosé de Abreu, Oscar NiemeyerJorge Amado... ops! Esses dois, o Deus dos reaças já tratou de levar! Mas demorou, né? Enfim, são tantos os nomes de arcaicas personalidades que, mais que artistas, são utopistas, que, fazendo uma varredura séria, este poderia vir a ser um novo país. Um país sem Paulo Freire (o Uruguai já perdeu Galeano – um a menos) seria tudo de bom, não, companheiro, digo, paneleiro?

Quem sabe nesse dia você não precisaria mais ter a incômoda vizinhança de um pobre no assento ao lado do seu num voo pro Nordeste; talvez até a maioridade penal cairia logo pra 14 anos e a gente já varria a pixotalhada das ruas; a terceirização facilitaria sua vida, assim sua empresa gastaria menos – em vez de pagar ao funcionário, pagaria ao atravessador; e uma coisa muito importante: finalmente veríamos um enxugamento do Estado, que esse papo de Estado-pai já tá qualquer coisa, né? Se são todos incompetentes e/ou ladrões, melhor que fiquemos logo nas mãos dos banqueiros, empresários e demais capitalistas sérios e empreendedores. Nesse dia, o estado deixaria de ser laico (assim já acabaríamos com a bicharada) e, o mais importante: finalmente implantaríamos a pena de morte no Brasil!

Nesse dia, vossa panelência poderia devolver a metálica peça pra cozinheira e ir cuidar de seu vil metal, pois isso aqui ia virar uma Suíça. Só há um problema: faça uma pequena pesquisa e veja quem são os trabalhadores braçais desse alvo país. Quando não temos quem faça, sempre pode sobrar pra quem não quer fazer...


***

2 comentários:

  1. Eu tenho pena dos obedientes ingênuos, alienados, misturados com os mal intencionados, e temo pelo futuro dessa nossa imensa naçãozinha.
    E se quem sabe, caminharmos, mesmo, em direção a concretização desse imaginário paneleiro, provavelmente acabaria em uma fogueira no meio da praça.
    Não sei o que acontece comigo, não consigo virar para o lado direito, de jeito nenhum.....rsrsrsrsrsrsrs!

    Beijo e sucesso, Léo!

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    1. Vanessa:

      Se tal catástrofe se realiza, juro que faço como a crônica dessa semana do Antonio Prata (muito boa, como de costume): me mudo pro Uruguai. Hahaha! Toc toc toc...

      Beijos,
      Léo.

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