quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Os Manos e as Minas: 34) Meus três salvadores no Japão (parte 1) — A bênção, Afonso Padilha!

Acho que a maioria de vocês já sabe que sou cearense. Falsificado (cresci em Sampa City), mas cearense. O importante não é onde ficava meu CEP, muito menos onde fica agora (Tokyo, Japan... quer dizer, 日本の東京 — creu n'eu, papudo?), mas sim o sangue que corre em minhas veias, esse misturado com baião de dois, rapadura, farinha, carne de sol e sol bagarai (refiro-me ao astro-rei, visto que lá nos cafundós de Senador Pompeu chuva é algo quase tão raro quanto neve). Assim sendo, sim, sou um cabra engraçado. É lugar-comum dizer que todo cearense é engraçado? É, mas que culpa tenho eu se é verdade? O cearense é engraçado até involuntariamente; até aqueles sem-graça são engraçados. Deve ser uma questão de genética, sei lá...

Só que isso não quer dizer que todo cearense seja humorista. Eu, por exemplo, sou espirituoso, chei' dos gueré-gueré (que saudade do trema!) e coisa e tal, mas não posso afirmar que sou um bom piadista. Quando abro a boca, falo merda espontaneamente, daí as pessoas riem; já quando me preparo pra contar uma piada daquelas boas que sei que vão arrebentar, muitas vezes vejo o riso amarelo do ouvinte, e a coisa piora ainda mais quando eu forço a gargalhada, que é pra ver se o cara se engabela e me acompanha... e necas! E por que tô dizendo isso? Porque humor é coisa séria. Nem todo mundo que é engraçado pode ser considerado um profissional do humor ou da comédia. 

Por essas e outras, como consumidor de humor sou dos mais chatos. Diria até ranzinza, pois não tenho paciência nenhuma pra ver algo que se propõe a ser engraçado e só arranca de mim bocejos. Então, pense: se já é difícil um (ou uma, vá lá) camarada me fazer sorrir, tirar de mim uma gargalhada sincera então já se transforma num trabalho hercúleo. Sou meio que nem aquela menina do filme O Rei do Circo, de Jerry Lewis, que só gargalha quando faz o palhaço chorar (tá, se você não viu não vai entender nada, então veja; Jerry Lewis com uma careta conseguia o que a maioria desses neo-humoristas não logra com meia hora de esforço). Daí que, pra mim, 90% do que era pra ser engraçado não é mais que ridículo.

E é exatamente por causa dos três parágrafos acima — junto com mais este quarto — que virei admiradorzaço de Afonso Padilha. Ok, como frisei preciso de mais este parágrafo pra explicar como se deu o milagre. A ele: há alguns meses, recebi de um amigo que mora nos Istêites um vídeo de um stand-up (sempre odiei stand-up!) em que certo fulano contava suas a(des?)venturas quando em solo nipônico por vez primeira. Não sei se foi a coincidência de eu morar aqui, mas aquele vídeo conseguiu alegrar meu dia. O cara do vídeo? Sim, senhoras e senhores, ele, Afonso Padilha. E, exercendo o dom do exagero (outro talento cearense), já tive dias por aqui em que a melancolia (não, não direi depressão pra não assustar) era tanta, que eu venderia a alma por um sorriso.

Mas um vídeo é pouco, né? É como um cara que na sorte acerta uma canção e nunca mais consegue emplacar outra... Eu precisava ver se o fulano tinha mais balas na agulha. E não é que tinha? A partir de então, adeus suicídio, adeus tarja-preta, adeus melancolia & demais parentada... Eu estava salvo! Na hora em que via que o bicho ia pegar, lá ia eu atrás dos vídeos do moço de sorriso fácil pra facilitar o meu. Virou um hábito que cultivo até hoje. Sim, procuro também estar sempre atento ao que anda acontecendo com meu imenso paisinho de tanta gente boa e, infelizmente, tantos neofascistinhas (preferia quando era de brunas & surfistinhas), mas é tanta merda, tanta merda, que, quando o surrealismo dos tons começa a me sufocar e vem aquela clássica pergunta "E agora, quem poderá me defender?"... volto ao Padilha.

Não ao de O Mecanismo, obviamente, mas ao Fonsim. E o interessante é que eu sempre fui desses que acreditam que um rosto meio descompensado é da maior importância pro humor. Claro, tem uns que nem são tão feios assim, mas na hora que é pra fazer rir capricham nas caras & bocas ou na maquiagem, mas o tal do Afonso ainda por cima é o maior boa-pinta. Verdade que no palco ele mete um humilde e coisa e tal (pra trazer o público pra si), e nem duvido de que ele tenha sido um adolescente um tanto fora de esquadro, mas não sei se é a autoestima ou simplesmente a genteboíce, mas o tipo é, pra dizer o mínimo, estiloso. E inclusive pessoalmente. Sei disso porque tive a alegria de trombar com ele no voo de volta às terras nipônicas.

Aliás, ele furou a fila... não, não no voo, mas da ordem de meus textos. Tava quase acabando um que seria o primeiro de minha volta (acabo de voltar de 30 dias de férias em Caos Brasilis), mas esse raro encontro me fez querer escrever sobre ele. A verdade é que já fazia uns seis meses que vinha querendo escrever sobre três caras que têm alimentado minha alma nesses tempos bicudos (bicudos tanto aí quanto aqui... e quanto os demais acolás) e, como a vida é a arte do encontro, já dizia o branco mais preto do Brasil, nada como um pra animar a gente, né? Ainda mais quando percebemos que o fulano que admiramos como profissional é também de fino trato no pessoal. Pra finalizar, sei que ele é muito mais conhecido que eu, mas ficaria felizaço se alguns de meus leitores/ouvintes/amigos/parceiros (/as) & quetais aumentassem o leque dos admiradores do moleque. 

Eu & Padilha,
formando quadrilha em Doha
Ele merece. Assim como todos os que ainda teimam em tornar a vida dos brasileiros menos pior. Não à toa, ele e seus trutas do stand-up (categoria de humor que, depois dele, não posso mais dizer que odeio) gastaram cerca de 30 horas (e daqui a uma semana, quando voltarão ao Brasil, gastarão outras 30) no intuito de animar um pouco a vida desses brasucas que aqui subvivem. E olha que muitos destes nem mereciam, visto que o presidente mais imbecil da história do Brasil foi eleito com a ajuda de grande parte desses deka-nó-cegos que nem pensam mais em voltar praquele país que tem nome de pau, mas insistem em atrapalhar a vida dos que lá vivem... Mas isso é outra história; a que queria contar hoje é a minha com Mr. Afonso & seus Padilhas. Espero que tenha sabido contar.

***

PS1: O vídeo que deu origem à saga:


PS2: Sigam o bom aqui.

PS3: Vocês podem não acreditar, mas só agora, quando já ia publicar o texto, descobri que Fonsim é, como eu e Woody Allen, de 1º de dezembro. Tá tudo explicado. Fecha a conta e passa a régua! Fui (ver mais um vídeo dele)!

***

2 comentários:

  1. Adorei! Texto ótimo e merecido em homenagem ao Afonso. Assisti o vídeo pra ver se conseguia rir - pois tenho estas coisas também com riso fácil - e o cara tem realmente um tempo da comédia, aliás, um The Flash na fala e na criatividade. Humor massa!

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    1. Valeu, Eriquim! Só pra saber: o que seria um "the flash" na fala? Perdoe minha inguinorança... rs

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