segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Os Manos e as Minas: 26) Sander Mecca, desestruturando

por Vanessa Curci
Havia algumas profissões que me deixavam encafifado. Um mecânico, por exemplo. O que levaria um cara a escolher tal profissão? Daí, depois de muito pensar, cheguei a uma resposta. O amor. Sim, o amor. Há aquelas profissões que um camarada só aceita por falta de opção. Lixeiro, por exemplo, servente de pedreiro, porteiro etc. Mas mecânico, não. Um mecânico é aquele cara que adora carros, que desde moleque sempre teve curiosidade em saber mais a respeito do funcionamento desses bichinhos que caminham sobre quatro rodas. O mecânico é o médico dos automóveis. E porque os ama. Só isso explica o sujeito ficar o dia inteiro cheirando a graxa, óleo, gasolina. Eu respeito muito um profissional que escolhe sua profissão com base no amor. E é exatamente por isso que eu respeito Sander Mecca.

domingo, 20 de novembro de 2016

Grafite na Agulha: 39) Falso Brilhante, de Elis Regina

Mais uma vez conto com a contribuição da talentosa (e generosa) pena de Helena Tassara em minha coluninha sobre discos. E Helena vem preencher uma lacuna que persistia ainda por aqui: a falta de um disco de Elis. Acrescento que não houve coincidência, este texto foi pensado pra ser publicado na semana em que estreia o filme sobre a cantora. Costumo apresentar aqui o/a colaborador/a, mas, como Helena é reincidente, deixo o link de seu texto anterior, pois lá estão informações sobre ela e deliciosa prosa a respeito do disco Alucinação, de Belchior (aqui). Antes de irmos ao texto sobre Elis, preciso avisar aos apressados que se trata de leitura pra fortes, pois Helena usou e abusou de seu talento de pesquisadora pra trazer pra cá um trabalho detalhista digno de constar de cadernos de cultura de jornais de primeira linha. Aos preguiçosos, sugiro leitura em conta-gotas, pois cada palavra escrita vale muito a pena. De quebra, fica aqui também como farto material pra futuros pesquisadores. Vamos a ele, pois:


quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Crônicas Desclassificadas: 180) A história das gêmulas Lignina e Suberina

Era uma vez duas lindas e floridas irmãs, Lignina e Suberina, que, apesar da diferença de um ano entre uma e outra, eram idênticas na epiderme e pareciam duas gêmulas. Entretanto, eram completamente distintas no temperamento. Viviam elas felizes no distante e pacato reino de Catafilos. Nossa haustória teve seu começo no exato momento em que ambas deixavam seu doce fascicular pra dar um passeio de pericicleta pela periciclovia da orla, logo ali à beira da Praia dos Parasitas. Como era sábado, não havia caules, e Lignina, a mais velha, como em todos os sábados, não tendo que estudar, estava toda pilosa. Aliás, cá pra nós, Lignina era uma moçoila um tanto epífita, aluna mediana que, fraca nos caulículos, odiava exatas, principalmente meristemática, e a pulso conseguira decorar a tabular do 5.

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

A Palavra É: 20) Septo

Os poetas vemos uma
borboleta; 
e você?
Um amigo cujo nome não posso revelar, a pedido do próprio (não confundir com o mesmo!)... Hmmm... Dá pra dizer apenas que suas iniciais são MP, como as de medida provisória. Bem, o fato é que ele me confidenciou que vai entrar na faca, pra tratar do desvio do septo. E em plena véspera de meu aniversário. Marcou de propósito, pra que seja uma véspera inesquecível. Se eu fizesse festa, ele seria ausência garantida. Mas o culpado não teria sido eu, e sim o tal do septo, que faz algum tempo se desviou do caminho cepto – e o trocou pelo erradpo. Pra quem não sabe o que vem a ser o septo (como era meu caso até segundos atrás), não custa nada uma visita ao pai dos burros.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Entrevistando: 12) Zeca Baleiro no Na Minha Casa

Craque é craque. E quando dois craques se encontram já dá pra adivinhar o que vem pela frente. O toque de bola sofisticado nem carece de treino. Vavá e Garrincha, Pelé e Tostão, Sócrates e Zico, Bebeto e Romário, Rivaldo e Ronaldo, mais recentemente Messi e Neymar... Dá gosto ver, né? Do mesmo modo, botar frente às câmeras dois craques da canção como os manos Adolar Marin e Zeca Baleiro e dar a cada um deles um microfone e um violão é algo que ao mesmo tempo é previsível e surpreendente (né, Fernando Freitas?). Previsível porque sabemos que a vitória está garantida. Surpreendente porque nunca somos capazes de adivinhar as jogadas que os caras vão inventar, as tabelinhas que farão, os dribles que darão. Nesse caso, o gol, mais que ser um detalhe, é uma inevitabilidade. Nossa única certeza é a de que o placar jamais terminará em branco. Ou em brancas nuvens, como prefiram.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Grafite na Agulha: 38) A lírica de Lira

Após um razoavelmente longo hiato, volto a dar um pouco de atenção a esta coluna – uma de minhas preferidas por aqui. Na verdade, gostaria de escrever mais sobre música e/ou literatura, que são as áreas que mais me interessam e apaixonam, mas nosso imenso paisinho tem o dom de me dar infelizes matérias-primas que me acabam levando por outros caminhos e, quando percebo, já estou completamente perdido num labirinto (nada a ver com o disco em questão) de assuntos que tenho que vomitar pra não deixar que virem enfermidades. Agora mesmo, enquanto escrevia, soube da prisão de Eduardo Cunha e fiquei cá comigo pensando em por que raios não o algemaram. Deu vontade de escrever algo, mas ainda é cedo. Não sei até que ponto é sério e até que ponto é teatro. Mas deixemos Cunha saborear sua nova residência e voltemos à música.

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Os Manos e as Minas: 25) Dylan – the answer is blowin' in the wind!

Meu caríssimo editor Marcelo Nocelli (cuja editora Reformatório acaba de ter o romance A imensidão íntima dos carneiros – de Marcelo Maluf – laureado no Prêmio São Paulo de Literatura) iniciou no facebook interessante discussão sobre a escolha de Bob Dylan como ganhador do Nobel de Literatura deste ano. Segundo ele, apesar de reconhecer a genialidade de Dylan e achar que o artista merece todos os prêmios possíveis – em se tratando de música, of course –, preferia ver um escritor – na verdadeira acepção da palavra – receber o prêmio, principalmente nestes tempos modernos em que, "cada vez mais, ser apenas escritor é cada vez menos" – frase lapidar, diga-se. Finaliza parabenizando Dylan, que "merece tudo o que conquistou" e afirmando que "prêmios são sempre discutíveis; esse também é um intento das premiações".

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Ninguém me Conhece: 82) Folk na Kombi – nos levando em frente

Existem sujeitos que parecem ter nascido com o, digamos, traseiro virado pra lua. Tudo em que se metem acaba dando o maior pé. Meu querido parceiro Bezão sem dúvida nenhuma é um dos mais bem acabados exemplos desse tipo de sujeitos. Conheci-o há muitos anos numa das noites autorais do Clube Caiubi, quando ainda funcionava em seu primeiro endereço, na rua homônima. Nessa época, Bezão era um dos integrantes do Rossa Nova (que contava ainda com Juka e Xamã), um trio que fazia um som que poderia ser classificado como uma renovação do rock rural. Não à toa, era apadrinhado pelo saudoso Zé Rodrix, um dos expoentes (juntamente com Sá & Guarabyra) desse movimento musical que explodiu na década de 1970.

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Esquerda, Volver: 11) Ladainha dos golpistas

A data de 31 de agosto de 2016 será entendida no futuro como um dia que entrou pros anais... do povo brasileiro. Nossos netos se envergonharão muito dela. As conquistas sociais tão duramente alcançadas cairão por terra, como os gestos do então interino golpista já deixavam vislumbrar. E agora, com o golpista finalmente efetivado, obviamente depois de negociar alguns cargos com os senadores indeci$os, voltaremos ao século XIX. Mulheres, voltem pra cozinha; negros, voltem pra senzala; nordestinos, voltem ao trabalho braçal; gays, voltem pro armário; usuários de drogas, agora vocês são tão culpados quanto os traficantes! O país dos brancos bem-nascidos está de volta, pra alegria geral dos amarelinhos da Paulista e dos derrotados nas urnas. Esse golpe mostra ao mundo que no Brasil inexiste a igualdade de direitos; o voto de quem tem maior poder aquisitivo vale mais.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Esquerda, Volver: 10) Por que eu sou Haddad

Aos 44 do segundo tempo, vim aqui deixar meu depoimento. Vale mais que retarde do que tarde demais. Eu, cearense filho de retirantes, que sempre fora reticente antes, que me sentia um invasor, um perneta penetra, enfiado na cidade-desamor pela uretra (abaixo), e eis-me aqui dando a letra, pensando "agora me encaixo!", metendo a caneta, sentindo-me cidadão, quase orgulhoso de ser paulistano por adoção, junto com meus manos de coração e de luta, todos filhos da labuta, crescidos na família perifa, onde o pau come e a PM grifa, e tome cacetada, cacetete, pro pivete e pra rapaziada. Americanópolis City, vizinha da Vila Clara, onde o diabo teve conjuntivite, o horror deu as caras, Deus perdeu o apetite, o menoscabo da burguesia ganhou CEP e geografia... e cada lobo que se estrepe.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Crônicas Desclassificadas: 179) O homem e seu toque – um Midas ao contrário

Devia haver uma lei que proibisse o homem de se utilizar das coisas. Estas, em geral, são belas, até que vem unzinho qualquer, põe suas mãos sobre elas e... violà! Adeus, beleza! O homem nasceu pra estropiar tudo. É por isso que o mundo anda como anda hoje. A parte mais importante do homem são os olhos, que podem ver e ver e ver à vontade e nem por isso têm o poder de gastar as coisas. As coisas deveriam ficar intactas. Vejamos, por exemplo, o caso da lua. Que linda! Quantas canções de amor já inspirou, e continua lá, bela, impávida, intocável, majestosa. E por quê? Porque o homem não teve a capacidade ainda de pôr suas mãos sobre ela. Quer dizer, fora um astronautazinho mequetrefe que foi lá, fincou uma bandeira e foi embora. E o homem é tão pequeno perto da lua que nem a bandeira dá pra ver daqui.