sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Minhas Top5: 2) Outro retrato de Djavan

Fuçando num grupo do facebook dedicado a Jorge Drexler, descobri que esse uruguaio cidadão do mundo acaba de fazer uma linda participação no mais recente trabalho de Djavan, Vesúvio, cantando uma versão em espanhol de uma das canções desse disco. Bastou isso pra eu me pôr a reouvir Djavan, este que, como Lulu, é um hitmaker de mão cheia. Só que Djavan, embora tenha também uma veia pop acentuada, é mais, digamos, classudo, jazzístico e emepebístico, tanto em suas melodias elaboradas quanto em suas letras únicas — e não raro ininteligíveis, dizem as más línguas.

Então, resolvi trazer pra cá e compartilhar com vocês minhas top5 dele. Mais uma vez, missão inglória, visto que eu poderia dizer que houve um empate técnico entre pelo menos umas 15 — senão mais. Aliás, antes de começar a dissecá-las, urge dizer que o que reforçou meu desejo de tratar de tais canções foi justamente o fato de ter ouvido dizer que o moço das Alagoas em entrevista recente se manifestou esperançoso em relação ao novo governo, isso pra não dizer que pareceu até nutrir certa simpatia por ele. O que demonstra que, "mesmo miseráveis os poetas, os seus versos serão bons".

5) RETRATO DA VIDA

Ao contrário de minha escolha acerca das canções de Lulu, que se fixaram numa curta linha do tempo, minhas top5 de Djavan são mais elásticas nesse quesito. A começar por esta, Retrato da Vida, parceria dele com o genial (e saudoso) Dominguinhos, faixa pertencente ao disco Bicho Solto, de 1998, que contou com aquela já clássica canção que dizia "te devoraria tal Caetano a Leonardo DiCaprio". A bem da verdade, embora a gravação desse disco seja memorável, escolhi trazê-la mais por Dominguinhos, esse fantástico melodista que muitas vezes acaba ficando em segundo plano por ter sua obra gravada por parceiros do naipe de Chico e Gil, por exemplo. Mas a letra de Djavan caiu como uma luva na melodia, sem dúvida mérito deste, o que me faz crer ser esta uma das mais belas canções do cancioneiro brasuca.

Retrato da Vida
DominguinhosDjavan

4) NUVEM NEGRA

O ano era 1993, e a musa de todas as estações Gal Costa, implacável, emplacava um novo e retumbante sucesso nas rádios de todo o Brasil com uma desabusada canção que Djavan fizera sob encomenda pra ela. Sim, estamos falando de Nuvem Negra, fabuloso petardo extraído da mais fina cepa djavanística. E não preciso dizer que eu também fiquei estático embaixo dessa nuvem, quase a ponto de que um raio caísse sobre minha cabeça; inclusive, comprei o disco por causa da famigerada canção, e não parava de ouvi-la dia após dia. Algumas canções acertam em cheio quando conseguem dizer algo que nós pensamos, mas não sabemos verbalizar, como "tá difícil ser eu sem reclamar de tudo".

Nuvem Negra
Djavan

3) OUTONO


Pra ser bem sincero, pra mim até hoje essa canção não pertence a Djavan, mas a meu amigo e parceiro Julinho Camargo (hoje, proprietário do Garagem Vinil, charmoso espaço de resistência que se dedica, entre outras coisas, à música independente — não só — de Sampa). Explico: há milhares de anos, frequentava eu o saudoso Boca da Noite, minúsculo e maravilhoso bar de MPB entocaiado nas quebradas do bom e velho Bixiga; e lá conheci muita gente boa que mudaria os rumos de minha vida, como, entre outros, o parceiro Élio Camalle, a diva Maria Martha e, naturalmente, Julinho. Todos estes eram músicos da casa e se revezavam de hora em hora. 

Lembro como se fosse hoje que eu costumava ficar ali, embasbacado, numa mesa de canto tomando um chope, muitas vezes só, deliciando-me com o bom gosto do repertório da moçada, naquela Disneylândia pra adultos que era o Boca da Noite. Não poucas vezes vi o dia nascer e a casa fechar ali, naquela mesma mesa, praticamente sem piscar. E lembro também que Julinho fazia a última entrada já alta a madrugada, pegava seu violão e ficava lá cantarolando como que pra ninguém, ou melhor, pra si próprio, todas aquelas canções de que ele gostava e que eu aprendi a amar por ouvi-lo/vê-lo cantá-las assim tão apaixonadamente. É essa a lembrança que tenho de Outono, na voz dele, fazendo primavera em meu peito.

Outono
Djavan

2) NEM UM DIA

Continuando a saga bixiguense, em 1996 conheci nesse mesmo Boca da Noite uma garota por quem tive uma rápida paixonite aguda, razoavelmente correspondida. Não revelarei o nome da pimpolha pra preservá-la, basta apenas dizer que foi ela a responsável por eu às vezes sair de minha confortável mesinha de canto e ir lá pra varanda jogar conversa fora (dentro?) com ela. E, mais uma vez, o sucesso do momento era de Djavan, agora cantado por ele mesmo, e se chamava Nem Um Dia. Acho que a garota em questão nem curtia tanto assim essa canção, mas confesso que eu adorava ficar em casa, na maior melancolia, curtindo esse som e cantando, desafinadamente, em cima "um dia frio, um bom lugar pra ler um livro, e o pensamento lá em você; eu sem você não vivo"... Tempos depois, conheci nesse mesmo bar outra garota, e mudei a trilha sonora. Acrescento que com esta aprendi a compor a minha própria, se é que me entendem.

Nem Um Dia
Djavan

1) PÉTALA

Em 1982, eu tinha de 10 pra 11 anos (como sou de dezembro, a idade "vareia"), nem sabia ainda o que era o amor (saberei hoje?); portanto, essa canção lançada nesse ano dentro do disco Luz só foi me fisgar anos depois, quando já de barba feita comprei o primeiro disco de Djavan. Ela foi a primeira, e, como dizem, a primeira a gente nunca esquece, né? No mesmo disco, havia Capim, Sina, Samurai, Açaí etc., todas lindas e todas pertencentes a minha trilha sonora afetiva; mas nenhuma delas despetalei (e fui por ela despetalado) tanto quanto Pétala, aquele tipo de canção que não nos faz lembrar apenas de uma paixão, mas de todas. Ainda hoje, quando a ponho pra tocar e ouço seus primeiros acordes, me "arrupeio" todo. "Por ser exato, o amor não cabe em si; por ser encantado, o amor revela-se; por ser amor, invade, e fim."

Pétala
Djavan

***

PS1: A relação que cada indivíduo desenvolve com certas canções é, abusando da redundância, individual. E varia de tempos em tempos. Se eu tivesse feito essa lista um ano atrás, o resultado poderia ter sido diferente; da mesma forma, daqui a um ano provavelmente as top5 já serão outras. Nós mudamos com o tempo, e nosso gosto sofre variações de acordo com essas mudanças. Por isso, vocês notaram sentidas ausências nessa lista. Porque meu momento não é o de vocês, e vocês não são eu, e a recíproca é verdadeira, com o perdão da obviedade. Mas não será isso o que faz a raça humana ímpar e, ao mesmo tempo, gera curiosidade em relação ao outro? Ah, queria deixar registrado que Tanta Saudade, parceria de Djavan com Chico Buarque, não entrou na lista por pouco; digamos que perdeu por pontos.

Então, digam aí, quais são suas top5 do homem que sabe djavanês?

***

PS2: Como a bendita canção de Djavan interpretada por Drexler foi responsável por esse rodamoinho de recordações, nada mais justo que trazê-la pra cá também, né? Como uma faixa-bônus, fora da competição, mas nem por isso desprovida de valor. Aliás, vou trazer as duas, a original e a versão, assim agrado a uruguaios e alagoanos. Ei-las:

Meu Romance
Djavan

Esplendor (Meu Romance)
Djavan/versão: Jorge Drexler 

***

Minhas Top5; todas:


***

22 comentários:

  1. Leozito, como assim? Você agora lê pensamento, é??! Eu te juro por tudo que é mais sagrado que essas são justamente algumas das minhas top dele! Podem até não ser as cinco, porque eu nunca saberia citar apenas cinco, mas certamente essas estão entre as minhas preferidas, ponto! Talvez, dentre 5 (ô tarefa inglória!), eu citasse Milagreiro no lugar de Pétala, que eu já curti muito mais e acho que enjoei... Mas só por isso. Eu amo uma bem menos festejada da lavra djavanística: Irmã de Neon! Pra ser diferentona, mas não só. Presta atenção nessa letra e nessa melodia! Coisa, sim, de gênio!

    Beijos exclamativos!

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    1. Ah, pra "piorar" a situação, eu também comprei o CD da Gal só por causa de Nuvem Negra! :-)

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    2. Hahaha! Dannoca, só faltava você ser de sagitário. rs

      Com tanta coincidência assim, bem que cê podia cantar mais umas canções minhas, né? Hehe!

      Fiquei feliz com as coincidências. Espere pela coluna de número 3.

      Beijos,
      レオ。

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    3. Não sou de sagitário, mas sou leonina, serve? :-)

      Bem que eu podia cantar um pouco mais... Essa vida de revisora e tradutora não tá me deixando muito não! rsrs... Mas quando tiver oportunidade, bem que vou catar umas musguinhas de sua lavra!

      Menino, eu fui lendo e me surpreendendo! Cada parágrafo um "eita"! rsrs

      Beijão!

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    4. Hahaha! Meu pai é de leão. Serve. rs

      Ó, parafraseando um antigo sucesso de Tim Maia, #ficaadica:

      [
      Você quer viver
      Legal, legal
      Você quer sentir
      Legal, legal
      Comece desde já a cantar
      Vem amar
      Vem amar, vem amar
      Vem amar, vem amar
      Vem amar
      E "revise" menos
      ]

      Beijos,
      レオ。

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    5. Sabe como é, a música não me dá dinheiro... A revisão e a tradução sim. rsrs
      Beijo!

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    6. "Divinha o que primeiro
      Vem amor ou vem dindim
      Dindinha, dê dinheiro,
      Carinho e calor pra mim."

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    7. Hahahahahaha! Salve Baleiro (e Ceumar)!
      Pagar umas contas não é exatamente privilegiar o dinheiro... Cê sabe, né?
      Beijo!

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    8. Tô ligado, Dannoca! Ainda tô esperando o dia em que o dinheiro ganho me possibilite fazer só o que quero. Tô sonhando muito alto?

      Beijos,
      レオ。

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  2. Olá Léo e Kana, tão suave como seda a sua escrita é sempre uma homenagem aos visados. Vou responder ao meu top 5 mais tarde, pois minha culpa minha culpa

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    1. Oi, Mi! Bom te ler por aqui de novo! Fico à espera de suas top5.

      Abraços,
      レオ。

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  3. Léo, que bico de sinuca! Escolher 5 canções desse grande poeta. Vou tentar (risos). Primeiro: "Meu bem querer", lembra? Estávamos andando de madrugada pela Avenida Engenheiro de Armando Arruda Pereira, acho que voltávamos do Boca da Noite e cantávamos essa canção aos quatro ventos quando fomos surpreendidos por aplausos vindo de um prédio do outro lado da avenida, eram várias janelas abertas e os vizinhos ao invés de ficarem irritados, agradeceram esses aventureiros com calorosos aplausos. As outras canções são: "Flor de Lis", "Esquinas", "Sina" e "Faltando um Pedaço".

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    1. Totó, esse é sem dúvida nenhuma um dos momentos mais emocionantes de minha vidinha. E o fato de você estar lá mais uma vez é que faz que minha consideração por você só aumente (e, com isso, as cobranças... rs). Quase pus "Meu Bem Querer" entre as top5; foi briga de foice no escuro. Provavelmente, se eu tivesse optado por fazer um top15 todas as suas estariam nela. Aí não teria graça, né? rs

      Abraçaço,
      レオ。

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  4. Realmente, fazer um top5 de Djavan é um desafio. Gostei das escolhas e das razões das escolhas. Ainda mais porque Djavan é um puta músico, melodista e digamos que, na ludicidade da canção, ele se mostra o mais criativo em suas letras "ininteligíveis", esta é uma parte que gosto muito, sendo a melhor parte a produção musical que sempre coloca seus discos entre os melhores sons, mixagens, etc.
    Por este motivo, nem um pouco por me atentar às letras, tenho em "Romance" uma das melhores gravações dele, que se une a Hermeto Paschoal, a fazer um jazz quase forrozado, o que, pela união me fazem dar a qualidade de melhor gravação. Acho que poucas canções ganharam tanta leveza na produção como esta, talvez pela presença do brincante Hermeto, que deve ter forçado bastante à leveza produzida. Já vi várias participações do Hermeto em discos de muitos artistas que admiro e elas ganham um brilho especial, prevejo, na própria pré-produção, porque Hermeto e Djavan sai som do bom.
    Bom, não quis negar sua lista. Estou com ela e não abro. Mas "Romance", pela "massa sonora" que tanto falo, me diz mais do que qualquer letra "inteligível"... ahahah
    Abração

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    1. Erico, valeu pelo comentário e pela canção que "acrescentou" à lista. Acabo de ouvir; não conhecia. Interessante que você, como músico, escolheu essa canção mais por motivos, digamos, estético-musicais; já eu fui movido mesmo pelos sons do coração.

      Abraços,
      レオ。

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    2. Leozim, a questão é, como princípio, nenhuma lista atenderá aos mesmos princípios - isto é redundante, mas foi o que me veio à cabeça, sem querer colocar-me à frente de nada.
      Mas, como lhe disse anteriormente, eu sou completamente movido pela "massa sonora" - mal escuto letra, escuto o somm da voz junto com todo o resto de som que foi produzido. Esta canção, eu a escolhi do coração, pois a tal da massa sonora me satisfaz, me traz sobretudo o lúdico. Vejo mesmo que o Hermeto chegou e bagunçou tudo e deu seu "trato estético", o que pra ele, considero, é uma grande questão instintiva-lúdico-estética, cujo resultado traz pra mim "o que deve ser feito numa música".
      Juro pra você que, talvez, só recentemente, me liguei a captar o que é cantado e, se canto, é algo completamente intuitivo, apreendido por muito ter ouvido. Não me preocupei, em qualquer instante, com a qualidade da letra - que é o princípio do Djavan (nas letras ininteligíveis, como dizem), e também deve ser o do Hermeto, o que trouxe características especiais (que não conosidero), mas me fazem dançar, cantar (inclusive outra letra ou vocalises com outras melodias, entrando na brincadeira deles).
      Sempre tive todos os LPs do Djavan, e outras já foram minhas top5, inclusive esta só veio a ser a top1 do Djavan quando, por ouvir outras coisas, me liguei no grande som que é feito aí.
      Sugiro que, para entender o que falo, ouça a música Tempo Perdido com a Ná Ozzetti, onde o Hermeto está também. Nesta, além da letra ser super, há uma grandeza de sons, jazz, feito lá, que é uma loucura.
      Que bom que ela foi para as suas canções. Adoro poder apresentar música para as pessoas, e com nossa parceria, trazer-lhe algo que o cativa é um presente pra mim.
      Abraços, bicho réi fêi

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    3. Erico, já tivemos esse papo antes, mas vou registrá-lo aqui: eu, ao contrário de você, sempre me liguei na letra primeiro. Não à toa, sou letrista. No mais, nunca tive bons aparelhos de som, e, sim, tive (e tenho) um ou outro bom fone, mas, como sou meio surdo de um ouvido, sempre perco certos detalhes dos arranjos. Já com as letras isso não acontece. Quer dizer, a não ser quando o cantor pronuncia mal palavras inusuais... mas aí já é pra outras listas.

      Abração,
      レオ。

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    4. Entendo bem a sua questão de ligar-se à letra, e sei que a maioria das pessoas estão ligadas nela, tanto que muitos elegem as canções como melhores pela letra, e não pelo som feito - que nem sempre corresponde a uma qualidade que vem como necessidade a mim.
      Mas, algo que sempre me extasia é quando, depois de entrar na massa sonora, eu conseguir entender a letra, ou quando tudo é tão bem feito que a letra pula e eu a acompanho e entendo. Isto eu sinto falta: que o som seja bem feito, em respeito à canção como todo. Eu fico fascinado quando isto acontece e há vários compositores e autores que conseguem isto comumente.
      Bom, este comentário a mais é para concordar com o que você disse sobre como letrista atentar às letras. Também tenho minhas letras e músicas, e algumas coisas que já fiz, e algumas eu realmente não concordo com o som que foi produzido. Tenho minhas restrições a mim mesmo, no processo de produção do que cantei, ou das músicas instrumentais em que quero fazer algo que não chego LÁ. Mas, este é o processo desta arte, como todas, vem o risco e a possibilidade de acerto, por tantos itens concorrerem para a qualidade da música. E assim, a gente vai trabalhando pra chegar na forma melhor que nos é permitida trabalhar e chegar.
      Que o risco se transforme em traço que se transforme em forma. E é o que nós todos almejamos.
      O Djavan é ótimo exemplo disso tudo.
      Valeu brô.
      Abraço e perdoe se algo parece insistência.

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    5. Tranquilo, Baymma.

      No mais, acho que doravante, com mais pessoas gravando seus sons nem sempre nas melhores condições, e com o agravante de as chamadas grandes gravadoras produzirem cada vez manos artistas (e de qualidade duvidosa), prevejo que seus ouvidos irão sofrer muito. rsrs

      Abração,
      レオ。

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