quarta-feira, 11 de julho de 2012

Ninguém me Conhece: 67) Creo que he visto una luz: Jorge Drexler

Canções são capazes de mudar vidas? Em minha opinião, sim. Aliás, eu não diria apenas canções, mas a arte como um todo. Pra quem tem a mente e o coração abertos, a arte vive mudando sua vida. Minha experiência de vida me deu vários exemplos consecutivos: ler O crime do padre Amaro, de Eça de Queiroz, mudou, de certa forma, os rumos de minha vida; tempos depois, ouvir pela primeira vez Construção, de Chico Buarque, com quase 20 anos de atraso, também; e, mais alguns anos depois, assistir a Diários de Motocicleta, de Walter Salles, deu uma guinada violenta em meus interesses como compositor, o que interferiria de forma direta em minha vida.

1) Una canción me trajo hasta aquí (Jorge Drexler)


Passei toda a adolescência sem dar a menor peteca pra América Latina. Só tinha olhos (e ouvidos) pros EUA. Daí descobri Chico Buarque, e atrás dele toda a música brasileira; então bye-bye americans. Foram, sei lá, década e meia só me fartando com o cancioneiro brasuca. Até que a experiência de assistir a Diários de Motocicleta me deu um nó nas ideias. Roubei pra mim o discurso de aniversário do jovem Ernesto Guevara e chorei com ele atravessando o rio... Ao som da canção de Jorge Drexler.

Al otro lado del río era o nome dela. Foi a primeira vez que ouvi a delicada voz desse uruguaio que é até hoje o único que conquistou o oscar de melhor canção com uma de língua não inglesa. E o camarada era tão desconhecido, que nem o deixaram interpretá-la, apesar de ser ele o autor... E, convenhamos, cantar muuuuito melhor que Antonio Banderas! Mas seu discurso de agradecimento calou os que o calaram. Se há alguém que ainda não viu, vale a pena (eis o link do youtube).

Venho querendo escrever acerca de Jorge Drexler há tempos. Ele foi o Moisés que abriu o mar que me separava da língua e da cultura hispânicas. Depois do dia em que, assistindo ao filme, ouvi Al otro lado del río, passei a consumir compulsivamente a música do moço. Completei mesmo sua discografia. E viajei ao Uruguai três vezes! E estudei espanhol na faculdade. E descobri outros compositores de língua espanhola. E outros escritores. E o cinema. E...

2) Todo se transforma (Jorge Drexler)

... E todo um universo que até então me era desconhecido. Cheguei mesmo a fazer amigos e parceiros uruguaios, argentinos e cubanos. E pensei que o que o Che morrera tentando, politicamente falando, eu viveria tentando, musicalmente falando, claro. E sem nenhuma modéstia! Mas, voltando a Drexler, foi ele também o responsável por eu ter descoberto a delícia que é compor versões. Ouso dizer que ele é o mais brasileiro dos compositores uruguaios. Costuma dizer em entrevistas, inclusive, que aprendeu português ouvindo canções brasileiras!

Daí que tal "brasilidade", melódica, harmônica, poética, inspirou-me a verter umas 20 canções suas pra língua de Camões. E Drexler, como eu, gosta de brincar com as rimas, o que faz a busca por elas, também nas versões, um jogo dos mais divertidos. Como sou sonhador, e sonho alto, cheguei a pensar até num disco de Drexler em português, com versões minhas. Fui atrás do muchacho, falei com ele pessoalmente após um show que ele fez no Sesc Pinheiros, trocamos e-mails nos quais eu lhe mostrei várias delas, mas a coisa não vingou.

Afinal, Drexler é dos poucos hispânicos que fazem sucesso no Brasil cantando em seu próprio idioma. Ou melhor, suceeeesso mesmo, não; um sucessinho, talvez. Mas, como sucessinho não é sucessão, tive a cara de pau de escrever-lhe um Ninguém me Conhece, pra comemorar esses dois anos de blogue. Afinal, ele merecia, como ganhador do oscar e amante do Brasil, ser mais conhecido por aqui. Ah, por falar em sucesso, Paulinho Moska, que também é envolvido com a causa latino-americana, chegou a gravar duas canções dele, uma em espanhol (Dos colores: blanco y negro) e uma versão sua em português (A Idade do Céu - La edad del cielo). Aliás, MoskaDrexler e o argentino Kevin Johansen, meio de brincadeira, fundaram o movimento Mercosurf.

Mas Drexler, pra meu espanto, não é unanimidade no Uruguai. Sua (falsa) timidez buarqueana e sua voz econômica, com ecos de João Gilberto, não fazem a cabeça de muitos uruguaios. Alguns acham mesmo que as canções de Drexler são burocráticas. É, santo de casa não faz milagre mesmo! Eu, obviamente, não compartilho desse ponto de vista. A esses "defeitos" eu chamo estilo. Não à toa o moço já há muitos anos trocou Montevidéu por Madri. E, numa de suas canções mais recentes, afirma: "Hay gente que es de un lugar/ No es mi caso/ Yo estoy aquí de paso."

3) Al otro lado del río (Jorge Drexler)

No primeiro parágrafo eu questionava o poder que têm as canções de mudar vidas. No cotidiano das pessoas as canções também têm o poder de ser companhia, trilha, fotografia sonora de momentos inesquecíveis, sejam alegres ou tristes. No primeiro semestre de 2010 tive um dos períodos mais difíceis de minha vida. Não vou entrar em detalhes, pois não vem ao caso. Mas calhou que na época eu havia comprado Amar la Trama, atual CD de Drexler, que, por sua vez, também vivia um momento de mudança. Daí que as canções desse disco acompanharam de perto meu sofrimento, minhas lágrimas... E a volta por cima. Sus canciones me trajeron hasta aquí.

De tal modo que posso dizer que ErnestoJorge e eu atravessamos o mesmo rio. E chegamos ao outro lado. ¡No todo está perdido!

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Visite o site de Drexler aqui.


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8 comentários:

  1. Leo!! compartimos el mismo amor por Drexler y por Buarque y por tantos otros!
    Esa canción, "Al otro lado del río" es una de mis preferidas.
    Y latinoamérica será una.. alguna vez...tengo esperanzas, y cada uno de nosotros aporta su granito de arena..
    abrazos!!

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    1. Sí, Marce! Así lo espero, con mi granito de arena en mano!

      Besos,
      Léo.

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  2. No dia que esse cara ganhou o Oscar eu fui procurar a música, pra ver dos méritos...caspita, chorei que nem bebê, achei de uma beleza e delicadeza incríveis. Na verdade fiquei ouvindo no repeat e chorei por 3 dias.

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    1. A canção é mesmo linda, Sonk. No contexto do filme, então, vira obra-prima. Oscar merecidíssimo!

      Abração,
      Léo.

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  3. Drexler também tem estado muy presente em minha vida. O cara é simplesmente foda! ECO especialmente para mim, é um daqueles trabalhos q te marcam e te fazem zerar o contador...Abraço, Le Daros

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    1. Verdade, Le Daros! E Drexler tem uma coisa interessante, que é sempre surpreender seu público, tirando-o da zona de conforto. Ou seja, depois de um trabalho de sucesso, quando se espera mais do mesmo, ele vem com um disco completamente diferente, seja nos arranjos, seja nas canções e na própria formação musical.

      Abração do
      Léo.

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  4. reo que existe una luz, al otro lado do tunel

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    1. Haha! É, Sonk, mas santo de casa não faz milagre, mesmo. Observei nas estatísticas dessa semana que não houve nem uma visita sequer do Uruguai. Caramba!

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