Li que hoje é o Dia do Rock. Pensei, "ferrou"! Quando algo (ou alguém) precisa de um dia pra ele é sinal de que foi relegado à categoria de minoria. Hoje é dia do rock, mas houve um tempo em que todo dia era dia de rock. Que nem antes era de índio, como na canção. E, falando em canção, passeando pelo facebook me deparei com mensagem de Júlia Rodrix, na qual dizia de sua saudade do marido e postava um vídeo de uma canção cujo nome é, a propósito, Hoje Ainda É Dia de Rock*. Estou me referindo, claro, a Zé Rodrix, que, entre outras coisas, ficou conhecido como um dos mentores do rock rural.
Falando em Zé, esta semana recebi um e-mail de sua filha, minha parceira Bárbara Rodrix, avisando que estava pondo à venda a biblioteca do pai. Havia vários destinatários, então, conhecendo a biblioteca de seu pai, entrei em contato logo pra chegar primeiro. Aliás, voltando no tempo, lembro-me de ter ficado estupefato a primeira vez que fui à casa dele e me deparei com um cômodo à parte da casa cujas paredes estavam totalmente cobertas de livros. Fosse noutra casa seria o "senzalal" quarto de empregada; ali, era seu tesouro.
Por isso, não foi sem uma pontada de dor no coração que li sobre o fim dessa biblioteca. Porém, repensei, e cheguei à conclusão de que a biblioteca não ia ter fim; ao contrário, ia se multiplicar, pois ia, fragmentada, morar em vários lares, onde, antropofagicamente falando, vários leitores beberiam da mesma fonte na qual Zé bebeu um dia. E ele bebeu muuuito! Não sei se já disse aqui antes, embora não concordasse com ele em tudo, Zé Rodrix foi a pessoa mais inteligente com quem tive o privilégio de conversar. Além disso, o homem falava umas cinco ou seis línguas fluentemente!
Marquei com Bárbara e lá cheguei no finalzinho da tarde chuvosa que fez ontem. Quando entrei na rua, bateu-me uma melancolia danada, afinal, quando pisara naquela casa pela última vez, Zé ainda estava vivo. Com custo reconheci a fachada. Ao penetrar na casa, novo susto. As salas principais haviam se convertido numa espécie de sebo improvisado. Bárbara catalogava os livros e separava por assunto. Livros de arte, filosofia, medicina, política, religião, teatro, poesia, romances, biografias... Os interesses de Zé iam muito além da música.
Se pudesse, teria levado muitos mais do que os que escolhi. Mas me dei por satisfeito. Adquiri algumas raridades a bom preço e, de quebra, trouxe um pouquinho do velho Zé pra minha pobre biblioteca. Na volta pra casa fiquei pensando nessa decisão da família de se desfazer desse tesouro. Livros existem pra ser compartilhados. Deveria haver uma biblioteca em cada esquina, daí não precisaríamos cultivar esse apego a eles. Em minha própria casa eles já me causam sérios problemas, pois não tenho espaço físico pra conter esse meu vício. Não seria melhor fazer como Sabina, que, após terminar uma leitura, joga o livro pela janela?
A família deu prioridade aos amigos, mas pretende abrir ao público em breve, assim que tenha todos os livros catalogados. Aos interessados, visitem a página do facebook de Bárbara Rodrix, cujo link é este. Ainda há muita coisa interessantíssima lá. Eu mesmo, finalmente, comecei a ler Ulisses, de James Joyce (edição de 1966, com tradução de Antônio Houaiss), com o luxo de ter rodapés escritos a mão pelo próprio Zé. Espero de verdade que esses livros ganhem bons destinos. Afinal, as cinzas dele foram jogadas ao mar, mas nesses livros residem, como direi? ... as partículas de sua essência.
***
*Zé Rodrix era (e ainda é) a prova de que rock'n'roll é, mais que indumentária, atitude. Deixo-os com o vídeo sugerido por Júlia:
Oi Léo! Acho que você disse tudo! Levar um pouquinho do Zé para casa...Ele deve estar feliz com essa decisão da família de seus livros serem espalhados como suas cinzas, espalhando sua sabedoria e fazendo parte agora, de um enorme universo...
ResponderExcluirConcordo, Marlene. Acho que o Zé iria aprovar. Na minha casa, pelo menos, ele já está.
ExcluirBeijos,
Léo.
Eu também já encomendei um pouquinho do Zé para ter aqui comigo. É triste saber que a coleção vai ser dispersa. O conjunto diz muito do Zé. Bom seria se uma instituição comprasse todo o acervo e abrisse para o público. Mas, já que não foi possível, pelo menos é bom ver que os livros vão ficar em boas mãos.
ResponderExcluirE os discos?
Pois é, Alan, sabe que eu pensei nisso? Ia dar o maior pé, hem? Biblioteca Zé Rodrix! Pena que não rolou...
ExcluirSobre os discos eu não sei, mas acho que devem ir pelo mesmo rumo...
Abraço,
Léo.
Que beleza!
ResponderExcluirQue maravilha!
Excluir