segunda-feira, 16 de julho de 2012

Versão Brasileira: 1) "Al otro lado del río" por Élio Camalle

Como tratei há pouco de Jorge Drexler, resolvi inaugurar esta coluna justamente com ele. Na verdade Drexler, antes de Sabina, foi alvo de meu desejo de gravar um disco de versões. Na época falei com Vasco Debritto, produtor responsável pelo disco Imigrante, de Kana, que se interessou por bancá-lo, desde que contasse com a participação do próprio Drexler. O cantor do disco seria Élio Camalle.

Como frisei no outro texto, o projeto não vingou porque simplesmente perdi o contato com Drexler, que, a exemplo de Sabina, devia ter coisa mais importante a fazer. Mas as versões estão aí, e, parafraseando Zé Rodrix, que dizia "o importante são as canções", digo que, nesse caso, o importante são as versões, que não deixam de ser canções. 

Camalle chegou a fazer uma demo com três delas. Com o tempo tratarei das outras. Não há mais muito o que acrescentar além do que já escrevi no Ninguém me Conhece dedicado a Drexler. Vamos, então, à versão da primeira, Al Otro Lado del Río, que deu início a tudo:

DO OUTRO LADO DO RIO

Cravo meu remo na água
Levo seu remo no meu
Penso que avisto uma luz do outro lado do rio
O dia vai avançando, diminui o frio
Penso que avisto uma luz do outro lado do rio

Sobretudo penso: nem tudo está perdido
Tanta lágrima, tanta lágrima, e eu sou um copo vazio

Ouço uma voz que me chama, quase um suspiro
Rema, rema, rema

Na margem de cá do mundo, o que não é presa é baldio
Penso que avisto uma luz do outro lado do rio

Eu, bem sério, vou remando, mas, por dentro, sorrio
Penso que avisto uma luz do outro lado do rio

Sobretudo penso: nem tudo está perdido
Tanta lágrima, tanta lágrima, e eu sou um copo vazio

Ouço uma voz que me chama, quase um suspiro
Rema, rema, rema

Cravo meu remo na água
Levo seu remo no meu
Penso que avisto uma luz do outro lado do rio

A original:

AL OTRO LADO DEL RÍO

Clavo mi remo en el agua
Llevo tu remo en el mío
Creo que he visto una luz al otro lado del río
El día le irá pudiendo poco a poco al frío
Creo que he visto una luz al otro lado del río

Sobre todo creo que no todo está perdido
Tanta lágrima, tanta lágrima y yo, soy un vaso vacío

Oigo una voz que me llama casi un suspiro
Rema, rema, rema

En esta orilla del mundo lo que no es presa es baldío
Creo que he visto una luz al otro lado del río

Yo muy serio voy remando muy adentro sonrío
Creo que he visto una luz al otro lado del río

Sobre todo creo que no todo está perdido
Tanta lágrima, tanta lágrima y yo, soy un vaso vacío

Oigo una voz que me llama casi un suspiro
Rema, rema, rema

Clavo mi remo en el agua
Llevo tu remo en el mío
Creo que he visto una luz al otro lado del río

***

Lembrei que, no dia em que encontrei Drexler, chegando em casa escrevi um e-mail a um amigo contando de minha alegria e de como o dia tinha sido iluminado. Daí que, tomado por um sentimento de nostalgia, embora essa alegria tenha dado em seguida com os burros n'água, resolvi publicá-lo aqui, só pra não se perder no tempo. Ei-lo:

Hoje foi um dia perfeito! Preparei o material: carta, letras e CD e lá fui eu pro Sesc Pinheiros. Os ingressos estavam esgotados já havia uma semana... E eu não tinha o meu! Mas resolvi confiar no destino, ou melhor, fechar os olhos e me guiar por meu farol interior. Meu camarada, quando eu quero uma coisa muito, mas muito, MUITO, dificilmente não consigo.

Cheguei lá umas 20h20. Dei uma bela volta pelo local, sondando o terreno. Minha esperança era que algum cambista aparecesse com um ingresso, nem que tivesse que pagar mais caro. Afinal, quem está na chuva é pra se molhar. Um casal tinha dois ingressos sobrando, mas eles estavam esperando dois amigos. Se eles não chegassem até as 21h10, me venderiam um. Chegaram às 21h05... Naquele momento, levantei-me decidido a aplicar o golpe do "sou convidado... o quê? Meu nome não está na lista?". Caminhei até o balcão de ingressos para convidados e, quando já estava ensaiado pra dizer que era convidado da Gisele (nome falso, pra proteger a integridade desta amiga de Adolar que trabalhou na produção), lá estava ela! Não dava pra dizer pra ela que eu era convidado dela...

Mudei de tática: aproximei-me, e lhe disse: "Oi, Gisele, tudo bem? Lembra de mim? Sou o amigo do Adolar que estava no show da Mercedes Sosa". Ela me arregalou os olhos como quem diz "E daí?". Mas, um segundo depois, sorriu e disse: "Oi, tudo bem?". Perguntei-lhe se tinha como me arranjar um ingresso, daí uma outra, que devia ser a chefe dela, atravessou: "Os ingressos são pros convidados". Indaguei: "passado o horário os ingressos não são liberados?". Ela repetiu, como um papagaio telemarqueteiro: "Os ingressos são pros convidados. Não estão à venda".

Nesse momento, minha confiança no destino fraquejou, mas ainda tive força de espírito pra lançar um último olhar pra Gisele, e já estava pra deixar o material com ela, quando ela me piscou o olho por trás da megera e passou um ingresso, por baixo do balcão, pra um rapaz que trabalhava com ela. Ele me olhou, com cara de poucos amigos e disse, com voz de segurança: "Senhor, pode me acompanhar?". Acompanhei-o alguns metros e ele me sorrindo disse: "A Gisele pediu pra te entregar. Bom show". Agradeci-lhe, ainda incrédulo, e fui voando, pois o show já estava pra começar. Entrei, peguei um baita dum bom lugar, afinal, vip é vip.

O show: voz, violão e efeitos de luzes e som. Ele, simples, simpático, falante (em bom português), se mostrou como se estivesse na sala da casa de um amigo. Mostrou as canções, atendeu a pedidos, e ainda nos deu um presente. Disse que tinha pensado em preparar algo pra São Paulo, daí resolvera fazer uma versão de Sampa em espanhol, hoje, no mesmo dia do show. Saiu correndo a buscar a letra e as cifras pela internet, mas tudo que achou era ruim. Foi pro youtube e achou uma interpretação do João Gilberto, com um milhão de acordes... Já estava desistindo, quando encontrou um anônimo, parece que de pijama, cantando Sampa com a harmonia igualzinha à original. Lá foi ele tirar a harmonia. Fez a canção e ofereceu aos uruguaios em Sampa, trocando, na letra, "novos baianos" por "montevideanos". Resumindo, o cara tem a força da verdade como uma aura ao seu redor...

Findo o show, eu já estava com a bola toda, pois tudo tinha dado certo até então. Hoje à tarde consegui falar com o Vasco Debritto, do Japão, que tá a fim de bancar o projeto. Ele me disse que vai lançar pela gravadora dele no Japão o Arnaldo Antunes! O mesmo que fará três shows com Drexler em Brasília, a partir de amanhã. Depois de uma meia hora (ele teve que dar uma entrevista pra um canal de TV antes), lá veio ele, sorridente e sem nenhum cansaço, receber os fãs. Falou, escutou, sorriu, autografou, tirou fotos. Eu, como dizia uma música do Gil, "ao menos aprendi a ser o último a sair do avião".

Quando o último fã se foi, apresentei-me e, embora timidamente, fui direto ao ponto. "Jorge, encantado. Soy Léo Nogueira, compositor, y tengo más o menos veinte versiones en portugués de canciones tuyas". Ele: "Uau! No son pocas! Déjame ver". Mostrei, e ele começou a ler ali mesmo. Disse, em português: "Rapaz, isso é muito bom! Pelo pouco que vi, me agradou muito!". Foi a deixa, falei do Vasco, do projeto, do Camalle (dei-lhe um CD do Camalle), e falei que a gravadora interessada era a mesma que acabara de lançar no Japão o Arnaldo. Ele me sorriu e falou, como se eu não soubesse: "Nossa, vou tocar com ele amanhã!".

A produção pegou no meu pé: "Senhor, rápido, por favor". Ele me disse: "Vou te dar meu e-mail particular. Me escreva e fale mais sobre o projeto. Tenho o maior interesse". Deu-me, abraçou-me carinhosamente, tiramos uma foto e eu saí dali após ter vivenciado um dos raros dias perfeitos em minha vida, em se tratando de música.

O juiz apitou. Agora sim começou o jogo.

São Paulo, 5 de setembro de 2007.

***

O jogo começou, terminou, e eu perdi. Paciência. "Ficaram as canções..." Pra terminar, em vez de subir o vídeo de Al Otro Lado del Río, que já subi no texto sobre Drexler, achei melhor compartilhar com vocês a versão dele pra Sampa, em gravação que alguém fez naquela mesma noite em que ele a apresentou pela primeira vez.




***

4 comentários:

  1. Fantástica canção! Adorei a versão e a voz do cantor! Parabéns!!!

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  2. Boa Noite Léo!
    Ganhei minha noite
    ou melhor, minha madrugada.
    Descobrindo Jorge Drexler através de seu texto - quer coisa melhor?
    Amando vocês!
    Beijos

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    Respostas
    1. Valeu, queridona! E eu ganhando meus dias com seus comentários!

      Beijão do
      Léo.

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