terça-feira, 13 de agosto de 2013

Crônicas Desclassifiadas: 101) O PT e os outros

Sou um cara tão honesto comigo mesmo, que nunca tive medo de pôr o dedo em certas feridas que a esquerda costuma esconder. Por isso tenho sido criticado por alguns amigos que me acham um vendido, neoburguês ou algo do tipo. Entendo pouco de política, confesso, aliás, entendo pouco de tudo. Mas, a despeito de minhas raízes "humildes", tenho orgulho de ser um teimoso, um cara que há uns 30 anos teria o direito de permanecer calado e hoje tem liberdade de expressão. Ainda me envergonho ao tentar mostrar meu pensamento quando imagino que alguns cultos "por herança" em 30 segundos de argumentação me destruiriam, mas sou reflexo de um país onde até os ignorantes já começam a ter voz, e, embora eu não seja um intelectual, não me creio ignorante de todo. E, embora míope e astigmático (ou por isso mesmo), posso dizer que costumo lançar um olhar bem peculiar sobre as coisas.

Assisti recentemente à entrevista que Rui Falcão (foto), presidente do PT, concedeu ao programa Roda Viva, da TV Cultura, e, de lá pra cá, andava com comichões, uma agonia, uma vontade enorme de desabafar, de escrever alguma coisa, enfim, de me posicionar. Sempre fui petista desde que me entendo por gente, porém, não sou um tapado que não possui senso crítico, pelo contrário, tenho-o até demais. Quem acompanha minhas postagens sabe disso. Sou polêmico, inflamado, às vezes contraditório (posto que humano), mas, quando percebo que incorri em erro, sou o primeiro a voltar atrás e dar a mão à palmatória. Tenho sido muito crítico a certas mazelas do governo do PT, mas, após ler a biografia tendenciosa de José Dirceu bancada pela Veja; ver a posição escandalizante dos médicos brasucas; e tomar conhecimento do paulistano "cartel dos trilhos" peessedebista, e sua cobertura frouxa por parte da mídia; resolvi pegar mais leve com o partido da estrelinha.

Como petista, ao ver tantos escândalos pululando, senti-me como a esposa que se descobre traída. Hoje, passado algum tempo, percebi que, nesse sistema de governo atual, sentir-se a esposa traída é algo natural. Não é a exceção, é a regra. A coligação do PT com o PMDB é um exemplo disso. Crescer e entender essa relação "matrimonial" é perceber que, quer seja o PT, quer seja o PSDB, quer seja qual partido for, nenhum deles hoje poderia governar sem tais coligações. Rui Falcão disse que se faz necessária uma "luta social", e acredito ter entendido o que ele quis dizer com isso, pois, de acordo com as regras que aí estão, nem a "salvadora" Marina Silva teria condições de exercer um governo 100% imaculado, ideologicamente falando.

Então resolvi parar no ar o soco em direção ao PT e raciocinar um pouco tendo por base todos os recentes acontecimentos. Há muita raiva nos corações, muito ódio, e isso é algo fácil de ser detectado e compreendido, porque o Brasil sempre foi de 1/3 da população, a população detentora da grana, que sempre achou que o país era exclusivamente dela. De repente o zé-povinho passou a ter voz, passou a ter condições de se transformar em consumidor e, tendo uma qualidade de vida melhor, ver-se no direito também de reclamar (protestar). Vejamos: algo como o caos nos aeroportos ou o excesso de carros nas ruas são sinais evidentes disso. Os "manos" deixaram as rodoviárias e os terminais urbanos e agora viajam de avião e têm carro próprio. É um processo (progresso?). O problema não é o pobre comprar um carro, é o governo descuidar do transporte coletivo, pois se este fosse bom a maioria dos neocondutores solitários de hoje guardaria seu carro pra fins de semana e feriados.

Apesar de saber que o programa Roda Viva pertence a uma emissora paulista estatal e, como tal, vinculada ao governo do PSDB (há milênios), reconheço que é, atualmente, um dos programas mais interessantes da rede aberta. E, graças ao youtube, tenho visto (e revisto) interessantíssimas entrevistas, como a do supracitado Rui Falcão. E algumas dessas entrevistas me ajudaram ainda mais a cultivar meu posicionamento. Numa delas, o entrevistado Diogo Mainardi, inimigo nº 1 de Lula, mostrou que uma educação aristocrática, que desrespeita o valor do trabalho, pode gerar intelectuais supernocivos (pra usar uma palavra branda) à sociedade, como é o caso dele (um cara que se declara vagabundo só podia mesmo ser contrário a um partido de trabalhadores). Noutra, vi um jovem Wagner Moura não ter medo de afirmar sua admiração pelo governo petista, enfatizando a importância de um plano que levou comida a miseráveis de vários grotões do país. Entre o primeiro e o segundo, eu seria um imbecil se me posicionasse ao lado do primeiro.

Mas o que mais me entristece é ver a classe artística se "aburguesar". Que o burguês comum, individualista e defensor de que "o pobre tem seu lugar" se irrite com o governo do PT eu até entendo, mas a classe artística, que amargou uma ditadura carregada nas tintas, com direito a torturas, assassinatos e outros quitutes, virar um lobão do lobão do homem... é realmente triste. E tudo isso porque ninguém entende mais o que eles cantam? Ora, meus caros, afinal, o que vocês queriam? Cantar sobre a pobreza em shows onde ninguém da plateia fosse pobre? Tocar musiquinha de protesto em saraus em Higienópolis? O povo, personagem principal de sua arte, sempre foi o maior ausente da festa. Agora ele está chegando, sem saber usar os talheres, sem entender sua metáfora, mas com vontade de participar. Chegou o momento de vocês explicarem pra ele o que quiseram dizer com aquele verso.

Voltando ao PT, hoje já consigo vê-lo, se não com carinho, ao menos com compreensão, sobretudo por causa do massacre midiático que Dilma vem sofrendo. Quanto mais abutre ronda sobre o Planalto, mais entendo que preciso me posicionar, e sei que hoje, dentro dessa conjuntura, ou é o PT ou são as armas. Digo isso pensando numa dualidade. Infelizmente hoje há, com interesses governamentais, o PT e o PSDB. O PMDB (e tudo o que ele representa) é que devia ser extirpado da política nacional. Ok, eles são aliados ao PT hoje, mas este apenas "herdou" uma aliança que antes fora com FHC. E não pensem vocês que o PSDB não adoraria ter o PMDB de volta a seu lado ano que vem (e o DEM, e o...). O PT está de mãos atadas. Tanto que o supracitado ex-presidente Fernando Henrique já deu declarações (no próprio Roda Viva) dizendo que, afinal, PT e PSDB não são tão diferentes assim, apenas se posicionam em siglas opostas pelo bem da democracia.

E vejam vocês o que é a idade. Só hoje, octogenário, FHC se mostra (meus amigos petistas vão me malhar por isso, mas já tô acostumado) o mais coerente entre seus correligionários. Ele, que já foi presidente, sabe que o buraco é mais embaixo. Não à toa é o único que tem coragem de falar abertamente sobre questões delicadas, como a das drogas. Aécio Neves devia aprender mais com ele, pois, agora que a possibilidade de ser o candidato do partido lhe subiu à cabeça, anda cego, babando incoerências. Ele, que parecia um camarada boa-praça, baladeiro e mulherengo (quase um Zé Dirceu deles), está cada vez mais parecido com Adolf Alckmin. Azar o deles, que abrem espaço pra que Marina Silva apareça com mais força como possível opção aos antipetistas.

Confesso que a figura de Marina sempre me foi simpática. Eu, na condição de cearense, pobre e profundo conhecedor da vida nas periferias, sinto-me naturalmente atraído por políticos com tal biografia. Como sempre me atraiu Lula. Contudo, sabê-la evangélica é algo que não se encaixa nessa equação. Aqui reconheço meu preconceito. Tenho poucos, mas eles existem. Sei das intenções escondidas por trás dessas igrejas. Claro que não podemos generalizar, mas, num todo, creio que fazem mais mal que bem. E uma pessoa com o discurso de Marina pode até crer em Deus, mas daí a ser evangélica é demais pra meu coração laico. No mais, em ela ganhando, duvido que venha a governar sem as mesmas alianças (conchavos?) que vêm sendo feitas desde sempre.

Por último, não poderia terminar sem dizer algumas palavras sobre a questão mensalão. Como já frisei acima, e nos textos deste blogue em geral, acredito na ética, portanto, não posso ser favorável a mensalão, caixa dois ou o raio que o parta. Contudo, seria muito ingênuo em abraçar os argumentos de Veja, Globo & cia. ltda. O PT usou as regras do jogo. Se as regras são corrompidas, tratemos de mudá-las. Afinal, o PT não pairava acima do bem e do mal, como pensávamos, porém, Rui Falcão me convenceu de que ainda posso depositar minhas esperanças nele. Precisamos, sim, de reforma política, precisamos, sim, dar ao povo o direito de votar esse plebiscito, mas, se no final das contas seis é igual a meia dúzia, eu prefiro a meia dúzia que ainda pensa numa parcela da sociedade que sempre foi esquecida pelos outros governos. Sinto muito, é minha natureza, é meu sangue, são minhas origens que não me deixam escolha. Tivesse eu outro sobrenome (e outra conta bancária), talvez pensasse diferente, mas sendo quem sou simplesmente não posso. Claro que se amanhã alguém me provar por A + B que há outra saída serei todo ouvidos. Quem se habilita?


Dedicado a Élio Camalle.

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4 comentários:

  1. Léo...
    Juro que tentei ler seu texto, PELO SEU TEXTO, mas ando tão de saco cheio e decepcionado com siglas e empresas citadas em seu texto, que nem seu texto, que é o melhor texto a que tenho acesso, consegui...
    :P

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    1. Ricardim, já passei por essas fases e te entendo perfeitamente. Mas o fato é que há uma grande verdade que dizem por aí: não há incorruptíveis, há aqueles que são mais caros. Eu mesmo já me peguei em várias oportunidades surpreso "escorregando" na ética. A questão é que... putz, hoje o cérebro tá funcionando só pela metade. Me lembrei de outra frase famosa e mais uma vez não me lembro de quem é. Mas o importante é o que ela diz: quem não gosta de política é governado por quem gosta.

      Daí que, mesmo frustrados, não podemos simplesmente "lavar as mãos", pois daremos maior liberdade aos mãos-sujas.

      Abração,
      Léo.

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  2. Leo,
    lá pras bandas de 1785 a França tinha 22 milhões de habitantes. Desse total, apenas 2 milhões andavam em carruagens (as Ferrari da época) e tinham todas as suas necessidades nutricionais satisfeitas. Os outros 20 milhões andavam a pé, moravam em choupanas e, acredito, tinham como única opção alimentar uma dieta de ratos, lagartos e/ou qualquer coisa digerível. Deu no que deu. Aqui a coisa tá muy parecida. Acredito que, por algum desses caprichos sincronizados da história, parece que o congresso nacional qualquer hora desses pode ter um destino de Bastilha.

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    1. Lindberg, meu caro:

      Temos que considerar que houve avanços. As pessoas hoje não só comem, mas também têm seus brinquedinhos eletrônicos. O problema na política do Brasil, contudo, é estrutural. Somos um povo de desonestos, daí nossos representantes serem corruptos é apenas um reflexo da sociedade. Há que se ter uma mudança de pensamento geral, que abranja todas as camadas. Temos muitos exemplos que deram certo em outros países. Um político precisa aprender a se comportar como um funcionário nosso, e não como um aristocrata que está acima do bem e do mal. É uma luta longa...

      Abraços,
      Léo.

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