domingo, 15 de novembro de 2015

Filho da preta! – na boca dos leitores (5) – por Kléber Albuquerque

Sabe o tamanho da alegria que um autor sente quando um cara que ele admira pra caramba escreve, generosamente, umas linhas sobre seu trabalho? Se você não souber, não serei eu quem vai lhe explicar, porque, embora tal fato tenha ocorrido comigo, faltam-me palavras pra qualificar essa alegria; tudo o que ousar dizer poderá parecer pouco. Assim, deixo que as palavras falem por si. Não as minhas, obviamente; as de Kléber Albuquerque, que gostou tanto de meu livro a ponto de permitir que sua mãe o lesse (confesso: ainda não tive a coragem de induzir minha própria mãe à leitura dessas páginas, por medo de ver, "verdadeiramente", a coisa ficar preta!). No fim das contas, o amor materno sobreviveu ao ponto final (que não há) e eu ganhei este presente que ora emolduro aqui:


Filho da preta!

Minha mãe detestou o Filho da preta!, romance de estreia de Léo Nogueira, e a culpa é toda do autor.

Bom, talvez a culpa não seja toda do Léo, mas, antes que eu tenha de dar uma de Homer Simpson e dizer “a culpa é minha, eu coloco em quem eu quiser”, vamos por partes.

O primeiro ponto que chama a atenção na prosa diabolicamente desabusada deste Filho da preta! é a singeleza, simplicidade, doçura até, de sua narrativa em primeira pessoa, o que, na minha opinião, já possui o enorme mérito de não querer ser aquele tipo de escrita que quer se parecer com literatura. Com maestria rara para um primeiro romance, Léo Nogueira fia seu texto como uma conversa cabocla de colorido intenso e isso impõe uma cadência rítmica que torna a leitura muito divertida e prazerosa. Esse truque nos coloca bem pertinho do personagem, e assim, meio cúmplices, vamos acompanhando a narrativa dessa figura simplória que vai se desvelando em nossa frente. O cara é um tanto tosco, mas parece ser gente fina. E, assim, com aquela natural simpatia adquirida pelo costume de nossa cordialidade seletiva para com as pessoas que estão mais perto da gente – especialmente quando as julgamos meio “café com leite” –, vamos aos poucos ficando a par dos acontecimentos, sempre, é claro, pelo ponto de vista dele, Isidoro, o personagem que conta a história.

Nesse ponto, entra a minha mãe. Deixa eu explicar: não é porque é minha mãe, mas a minha mãe é superlegal. Sério. Mesmo. Entre as mil coisas legais de minha mãe, uma delas é que, embora tenha tido pouca oportunidade de estudo na juventude, gosta muito de ler. E lê muito. Não é porque é minha mãe, não. Tempinho atrás, ela foi em casa e viu meu exemplar do Filho da preta!, com dedicatória e tudo, que eu tinha acabado de pegar das mãos do próprio Léo Nogueira poucos dias antes. Com a edição caprichada da Editora Reformatório favorecendo minhas pretensões de angariar orgulho materno, comecei a falar para ela o quanto o Léo escreve bem, que o livro era duca e coisa e tal. Já havia falado dele para ela antes. Tanto que minha mãe já tinha virado fã do blog dele, O X do Poema, e já conhecia a neymariana facilidade do (meu amigo!) escritor no trato da bola da palavra.

Mas o raio, o problema, a desnatureza, é que, embora sendo livro daqueles de se ler numa só pegada, na ânsia, no afã, emprestei-o para minha mãe sem ter adentrado em suas páginas negras. A arte esperta da edição é quase um spoiler: a coisa vai ficando preta. Literalmente. Literariamente literalmente. E, porra, Léo, mas minha mãe não precisava ver o tamanho do buraco da alma humana!

O caso é que, na medida em que enegrecemos a leitura, para além das questões raciais e éticas que a prosa macia de Isidoro, o personagem, suscita, um desconforto sobressalente nos engasga: pelas artes e pelos engodos da palavra, a gente vai se identificando com aquela figura. E isso ao mesmo tempo que nos damos conta do terror em que estamos imersos. E – terror dos terrores! – ao mesmo tempo que nos damos conta de quem somos na trama.

Por isso, a menos que sua mãe goste de fortes emoções, recomendo que guarde a obrigatória leitura deste Filho da preta! somente para você.

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PS: Você tem três opções pra adquirir o livro: 1) entrando em contato comigo; 2) pelo site da Reformatório (aqui); ou 3) na Livraria Cultura (aqui).

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