A exemplo do que escrevi no Trinca de Copas, repito aqui: Pra não gerar melindres entre os parceiros, optei pela já manjada (porém democrática) ordem alfabética por título. E, aos apressadinhos e àqueles que quiserem pular o lero-lero, aviso que no final da página há o link pra audição das canções.
1) FENDA

O fato é que minha não menos querida parceira Lis Rodrigues, em seu primeiro CD, o recém-nascido Artista de Sinal, escolheu duas de minhas parcerias com Clarisse pra dele fazer parte, o que muito me deixou orgulhoso. Queria neste espaço falar de uma dessas canções, a elogiada Fenda. Essa canção é o exemplo de como uma boa melodia pode ajudar uma letra menor a dar seu recado. Depois do pequeno sucesso de nossa Roma, encontrei em Clarisse a parceira perfeita pra exercitar meu buarqueano eu lírico feminino. Nessa época nasceram letras inspiradas como a já citada Roma, Marca Registrada, Orquestra, e outras nem tanto, como Fenda. Mas Clarisse é do tipo que, quando acredita numa letra, extrai dela sua essência. Daí que, quando ela me mandou a gravação, fui tomado por uma emoção imensa (e um tantinho de vergonha), ao ver/ouvir algo tão bonito feito sobre versos que eu menosprezara. Ao final deste texto segue o link. Ouçam e tirem suas própria conclusões.
FENDA
Entre pela fenda
É ilusão a cerca
Não tema, se perca
Só não me ofenda
Não sou da sua turma
Nem seu melhor amigo
Deite-se comigo
Só não durma
Eu não tenho bula
Eu não tenho seita
Não tenho receita
Só há gula
Eu não quero cobre
Eu não fico rubra
Me descubra e cubra
Só não me cobre
Se o pior pode acontecer,
Pode crer que acontecerá
Mas, enquanto eu te cegar,
Sossegue
Me releve ao me revelar
Só me vele sem me levar
Pois eu hei de te rejeitar
Aceite
***
2) O QUE EU QUERO

Certa vez Danny postou uma letra inacabada e me convidou a arredondá-la. Alguns amigos, como
Sérgio-Veleiro, discordam desse tipo de parceria, mas eu o adoro. Acho muito fácil e reconfortante trabalhar sobre ideias alheias, seja consertando-as, seja cosendo-as, seja de que forma for. E a verdade é que a letra de Danny era bem interessante, mas por carecer de métrica não era lá muito musicável. O que fiz? Trabalhei os versos de maneira a que tivessem uma métrica mais musical e, mantendo minhas características, dei ênfase às rimas e à sonoridade. Danny aprovou o resultado e mandou esta a que chamamos de O Que Eu Quero pra outro compositor carioca da M-Música, Tony Pelosi, que a musicou lindamente.
Tony acabou sendo o produtor do primeiro CD de Danny, que chegou a minhas mãos há poucos dias (pelas do próprio Tony, parceiro bom de prosa - e de macarrão - que conheci na casa de Tato Fischer). Por falar nisso, o CD chama-se Todo Dia (também nome da maravilhosa parceria de Guilherme Rondon com Alexandre Lemos), e é, além da parte musical, de primeira, um deslumbre aos olhos. A arte gráfica é um primor, cheia de detalhes e nuances. A única coisa que depõe contra é que, como tem um formato diferente do tradicional, é difícil guardá-lo nas gavetinhas onde costumamos pôr nossos CDs. Mas também isso deve ter sido proposital.
O QUE EU QUERO
Eu quero um amor assim
De brisa fresca no rosto
Paisagem boa de se olhar
Desejo de mergulhar
Pra ir buscar o sol posto
Eu quero esse amor pra mim
Sorrindo que nem moleque
Que colhe fruta no pé
Me leva a voar porque
Já nasce sem breque
Amor de edredom e luva
De mar que corre pro rio
De chuva depois do estio
E de estio depois da chuva
Amor amigo e maduro
De uma infância sem fim
Pra me embalar no futuro
Quando eu me cansar de mim
Só quero se for assim
***
3) PIAUÍ

Acabei fugindo do tema, mas esse é um desabafo que queria fazer há tempos. Isto posto, a gravação da referida canção Piauí me deu uma alegria maior ainda pelo fato de ter sido gravada por um artista do Amapá, Cléverson Baía, a quem não conheço (em seu roqueiro e pulsante Arte & Ira), por conta dessa mágica que a música nos proporciona, desconhecendo distâncias geográficas. Já falei da feitura dessa canção no texto que escrevi sobre meu parceiro Enrico Di Miceli, que é um paraense que mora em Macapá. O que teria a acrescentar é que tenho um carinho especial por esta nossa Piauí porque nela consegui tratar de um assunto que acho da maior relevância em nosso país e que em tempos pós-ditadura vem sendo pouco explorado. Todo mundo está satisfeito com o crescimento do Brasil, mas o preconceito continua, a educação se mantém precária e, embora a classe baixa tenha tido mais acesso ao "paraíso" do consumismo, o abismo cultural ainda é uma cratera que se abre a cada dia sobre a qual ainda não ergueram nenhuma ponte. É triste ver tantos ignorantes endinheirados de um lado e do outro uma aristocracia estagnada e ofendida pelo aumento do poder aquisitivo daqueles. Uma problemática até agora sem solucionática!
PIAUÍ
Embaixo da ponte tem gente
Em cima da ponte tem carro
Tem, dentro do carro, fumante
Dentro do bueiro, cigarro
No trem do subúrbio, lotado
Um bando em pé… e cansado
Na frente do prédio tem shopping
Atrás desse prédio, barraco
Embaixo do shopping tem parking
Tem obra que abre buraco
E pobre que é soterrado
Um bando que morre cansado
Tem gente cansada por aí
Querendo apagar o Piauí
Tem gente que olha pro umbigo
Cansada, de barriga cheia
Não vê o olhar do mendigo
Não vê o menor, quando cheira
E aquele, no carro blindado
Com vidro fumê… tá cansado
Tem alvo pra bala perdida
Doméstica fazendo bico
Tem santa que entra pra vida
Banqueiro ficando mais rico
A sola de um pé sem calçado
É que sabe o que é estar cansado
Tem gente cansada por aí
Querendo apagar o Piauí
***
A-do-rei, Léo parceirinho!!!! Obrigadíssima pela parte que me toca! Hahahaha!
ResponderExcluirEu discordo totalmente do Veleiro. Acho que toda maneira de amar (e de musicar, e de fazer arte), desde que sincera, vale a pena!
E letrinha? Desde quando você faz letrinha? Eu achei "Fenda" um letraço!
É por isso, aliás, que tanta gente tem gravado suas músicas...
Outra coisa que tenho em comum com a Lis é que nós duas gravamos "Todo Dia"! rs
Outra coisa: nosso show de lançamento vai ser no mesmo dia, 29 de abril. Eu aqui no Rio, ela aí em Sampa.
Já falei pra ela que precisamos ainda nos juntar nos palcos da vida. Acho que os astros conspiram! :)))
Fato é que a minha letra, que no início era um poema sem muitas pretensões, virou uma bela letra! Serei eternamente grata por isso, até porque você "captou" o que eu disse só nas entrelinhas!
Um beijão!
Parceirinha!
ResponderExcluirEu que agradeço pela alegria dessa parceria e por poder participar desse tão belo trabalho.
Beijos do
Léo.
Minha ex-professora de literatura, a (agora) doutora Mayra, após um mea culpa, resolveu passar por aqui e me deixar umas palavras, que não pôde publicar por incompatibilidade com os perfis disponíveis. Mandou-me por e-mail e autorizou-me a publicá-lo aqui. Ei-lo:
ResponderExcluirLéo querido! Passei por aqui, rápido, pra te dar um alô. Bacana seu blog. É um baita registro das suas andanças musicais. Como você sabe, não costumo passear por esse gênero, mas me parece que você está tecendo um registro raro e precioso do seu caminho musical. É isso? Ouvi Fenda. Muito linda. E discordo de você quanto à qualidade da letra! Beijão,
Mayra.
Mayra, querida, bom te ler por aqui após longas férias suas. Agradeço por suas palavras de incentivo. Apenas acrescento que este blog é mais ambicioso no que se refere a caminhos musicais, pois, além dos meus, dedica-se a relatar o de outros artistas igualmente "esquecidos" pela mídia. Quanto a Fenda, realmente agora, com música, não a acho má de todo.
ResponderExcluirBeijão do
Léo.
Viu, viu, viu? Ela é professora de literatura e viu qualidade na letra de "Fenda". Como diria aquele personagem do Jô Soares, "não se deprecie, mulherrrrrr"! No caso, homem! rs
ResponderExcluirBeijo!
Hahaha! Desculpe o atraso na resposta. E obrigado.
ExcluirBeijos,
Léo.