quinta-feira, 16 de novembro de 2017

Notícias de Sampa: 21) Bye Bye, Brasil

É com um misto de alegria e tristeza que venho por esta avisar aos amigos e leitores que eu e consorte estamos de malas prontas pra uma mudança que, sem sombra de dúvidas, é a maior e mais ousada de minha vida. Semana que vem, zarpamos pro outro lado do mundo, pra Terra do Sol Nascente, também conhecida como Japão — ou Nihon, pros íntimos. Os sentimentos que ora me tomam são todos avassaladoramente complexos e contraditórios. Eu, que vivi o período de ditadura militar em imberbe idade e vi meus ídolos se exilarem em países distantes, ora, na fase adulta, com um tiquinho de vaidade vã e muita frustração vejo chegar minha vez.

Não, não serei um exilado político — pico a mula antes de chegar a tanto —, digo antes que parto me sentindo mais uma espécie de exilado profissional, visto que venho por ao menos dois anos enfrentando com os punhos em riste essa crise besta que hoje nos engole e só tenho durante esse período tomado porrada... muita porrada! Por vezes literalmente, como no caso de um assalto sofrido recentemente, que, além de resultar na subtração de muitos bens materiais, ainda por cima representou simbolicamente a gota d'água que faltava na taça de minhas dúvidas entre o ir e o ficar.

Em minha vida, tive poucos períodos de certa tranquilidade financeira, mas confesso que imaginava que iria entrar na casa dos 40 em melhores condições que as em que me encontro. De bônus, há o fato de que os brasileiros, em grande parte, estão se deixando levar por uma assustadora onda de conservadorismo que culminou na destituição de uma presidente que, se não era lá uma grande estadista, ao menos era honesta, sem falar que foi reeleita com 54,5 milhões de votos. E os mesmos que lhe puxaram o tapete hoje se encontram em maus lençóis, como é o caso de um dos maiores caras de pau do país, o sr. Aécio Neves, que até anteontem bradava contra a corrupção.

Mas deixemos esses temas espinhosos de lado. Queria aproveitar que o assunto é Japão e abrir um parêntese pra compartilhar com todos uma experiência literária maravilhosa e emocionante que tive recentemente, a leitura de A última mensagem de Hiroshima, livro escrito por Takashi Morita, um japonês de 93 anos radicado em São Paulo e que é um dos sobreviventes da bomba de Hiroshima. Morita san, em 1984, fundou a Associação das Vítimas de Bomba Atômica no Brasil — da qual também é diretor —, órgão responsável por reivindicar auxílio do governo japonês para os sobreviventes que vivem no país. Ele também preside a Associação Hibakusha Brasil pela Paz.

Segundo a Wikipédia, a palavra hibakusha (被爆者, vítima de bomba, em japonês) "é uma expressão japonesa usada para se referir às vítimas dos ataques de bomba atômica ocorridos no Japão da Segunda Guerra Mundial (nas cidades de Hiroshima e Nagasaki)". Nesse livro, além de relatar com riqueza de detalhes sua experiência no dia em que a bomba caiu em Hiroshima (e no período subsequente), o autor trata da luta que os hibakushas travaram com o governo japonês pelo direito de obterem indenização e cuidados médicos, visto que, nos primeiros anos, sob o domínio dos EUA, o Japão abandonou-os a sua própria sorte.

O que mais me impressionou na leitura, no entanto, é a capacidade de perdão do autor, que considerou que os responsáveis pelo lançamento das bombas sobre Hiroshima e Nagasaki estavam simplesmente fazendo seu trabalho e que o maior culpado pelo genocídio é a guerra em si. Assim, ele se tornou um pacifista e um ferrenho militante pelo desarmamento nuclear. O que me lembra que estou viajando pra seu país justamente num momento delicado, em que o gordinho louco que comanda a Coreia do Norte tem ameaçado tanto o Japão quanto os EUA com seus brinquedinhos explosivos. E o que penso? Seja o que Deus (ou Buda) quiser. Louco por louco, temo mais Temer (com e sem trocadilho).

O cabeludo da foto, Fernando Cavallieri,
se contundiu e será substituído por Sonekka,
que não aparece acima, mas aparecerá no palco
Pra finalizar, aviso a todos que nos queiram dar um último abraço antes desta nova jornada que o bota-fora oficial ocorrerá no próximo sábado (18/11) a partir das 21h no charmoso Garagem Vinil, que fica na rua Mourato Coelho, 585, no bairro paulistano de Pinheiros. Nessa noite, haverá também o tradicional encontro de compositores do Clube Caiubi e o palco estará aberto a quem quiser mostrar seu som (desde que não seja cover). Por falar nisso, vários compositores chegados aproveitarão a ocasião pra apresentar parcerias com este que lhes escreve, com destaques pra Gabriel de Almeida Prado, Kana e Sonekka, os convidados especiais da noite, que ainda contará com um pocket-show da também parceira Marília Calderón. Aproveitarei, por supuesto, pra vender meu romance Filho da preta! com desconto especial. Adquira o seu ou, se já tiver, compre mais um pra dar de presente de fim de ano (#ficaadica).

Espero vê-los por lá. Aos que não puderem ir, deixo aqui meu abraço, um grande agradecimento pelas leituras de sempre e os votos de que nos vejamos em breve. Afinal, com as tecnologias de que dispomos atualmente, o mundo está cada vez menor. Melhor ainda, digamos que vou logo ali e já volto.

***

PS: Ganhei um lindo presente que compartilho com vocês; meu mano Álvaro Cueva fez uma letra especialmente pra mim e me autorizou a mexer nela e assim entrar na parceria. Canetei-a de leve e mandei o resultado pra outro parceiro exilado, Pedro Moreno, que nos devolveu esta pérola, cuja letra colo abaixo — relevem a qualidade técnica (Pedro avisou que é só um rasucnho); ouçam com o coração:


CANÇÃO DO AUTOEXÍLIO

Minha terra tem temores
Mil misérias e ardis
Tem desprezo, tem horrores
Revestidos com verniz

Sob a pele, oculta brasa
'Inda me arde um Brasil
Levo em mim a velha casa
Busco um berço mais gentil

Mudo exílio, insosso desterro
Êxodo surdo, cego motim
Lá vou eu nesse desenterro
Parto partido em degredo de mim

Miro a pátria na miragem
Nova chama a me chamar
Meu país vai na bagagem
Minha aldeia além-mar

***


2 comentários:

  1. Velhim, eu choro, mas resisto também. Nos vemos. amanhã e por aí!

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    1. E que do pranto se façam muitas canções, maninho!

      Abraços de ultramar,
      Léo.

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