quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Crônicas Desclassificadas: 9) Invasores de corpos

Sempre tive dificuldade em me adequar ao senso estético coletivo. Quando, vencido, cedia, sentia-me um alienígena dentro de uma roupa que não me traduzia. Na década de 80, por exemplo, voltou à moda o uso de cabelos compridos (esta é uma moda que sempre teima em ressuscitar), só que, desta feita, espelhando-se em Paulo Ricardo & cia ltda., o corte era aparadinho nas laterais e longo só atrás, meio que como um rabo de cavalo. Como todos os meus amigos aderissem, lá fui eu tentar o ridículo corte que em mim ficou ainda mais ridículo. Na tentativa de ficar parecido com o ex-RPM, fui traído por meus crespos cabelos, que, se rebelando, me deixaram mais parecido com um Amado Batista.

O tempo foi passando e fui ficando cada vez mais preguiçoso no trato com a moda em vigor. Nem bem me punha o guarda-roupa ao dia, já este ficava obsoleto. Na casa de meus pais até hoje deve existir ainda algum camisão esquecido assistindo a tudo, não dizendo nada. Assim, aos trancos e barrancos, eis que sobrevivemos ao século XX e nos deparamos com o futuro, este museu de grandes novidades. E ele chegou ainda mais selvagem, usando, como sempre, a crédula juventude como cobaia.

Dizem que a ranzinzice é sinal irrefutável de envelhecimento. Como sempre fui ranzinza, tenho dificuldade em identificar o passar dos anos. Ainda me sinto mais um jovem fora de moda que um tiozinho ranzinza. E, como tal, vou observando os flagelos impostos à juventude, que, na ânsia de estar na moda, paga caro pelo barato. Como pensar é um exercício que precisa ser renovado diariamente, a falta de seu uso acaba por atrofiar os "músculos" do cérebro. Da mesma forma, a ausência do exercício da dúvida traz danos por vezes irreparáveis à saúde do corpo. Vejamos: essa feia argola maior que uma moeda de um real metida no lóbulo de uma orelha o que vem a ser? Como uma pessoa em pleno exercício de suas faculdades mentais martiriza o próprio corpo com tão desmazelado aparato? Será que, ao mirar-se no espelho, esse indivíduo se acha bonito? (A parte do piercing vou pular, pois esta tribal inutilidade já tanto se banalizou que eu nem estranharia se encontrasse minha própria mãe ostentando um em seu respirador)

Outra abominação é esse novo tipo de tatuagem, abstrato, que os brucutus (e até alguns intelectuais!) inventaram de usar no lugar da camisa. O que é aquilo, aquela coisa preta geometricamente disposta cobrindo avantajados bíceps, tórax e costas? Será uma nova ordem? Uma yakuza ocidental? Fico pensando nesses "neogregos" daqui a uns trinta anos, cheios de pelancas, murchos, com seus rabiscos surreais adaptando-se às mazelas do corpo...

Já essas calças com os bolsos abaixo da altura das nádegas... Experimentei uma e, após passar alguns minutos sentado, fiquei com a coxa doendo ante o contato desta com a espremida carteira. O cara que a desenhou deve ser um gênio! Sem falar em cuecas e calcinhas à mostra. A antigamente chamada roupa de baixo, ou íntima, está ganhando ares de protagonista. Não digo nada se daqui a pouquíssimo tempo aposentarem as calças e passarem a sair às ruas em trajes menores.

Contudo, creio que o ponto mais polêmico seja o aspecto híbrido desses jovens de cabelos lambidos pela vaca, com sua magreza anoréxica e sua sexualidade duvidosa. Parecem tão frágeis que chego mesmo a acreditar que, se pegam uma ventania das boas, dessas que derrubam árvores, podem se tornar repentinamente, e a contragosto, alados. Um adendo: tratar de sexualidade hoje é perigoso, pois é assunto facilmente mal interpretado. Tenho que explicar que não estou me referindo aos homossexuais. Refiro-me ao excesso de liberdade dado a pré-adolescentes que, antes mesmo de terem seus corpos definidos, já passam a querer agir (com o consentimento - ou o descaso - dos pais) como se perante a lei fossem responsáveis por seus atos. E não são! Hoje há jovens de 15 anos que, sem saber, já são alcoólatras-mirins!

Peguei pesado? Terei me tornado um conservador? (pensando... pensando... pensando...) Não! Seguramente não! Não conheço ninguém que defenda mais que eu a liberdade de expressão. O problema é que as "liberdades" acima enfileiradas não são liberdades, visto que são impostas de forma tão sutil como se fossem sugeridas. E a maioria delas, como as grotescas tatuagens, é irreversível! Antigamente um jovem podia ser comunista e depois se tornar deputado por um partido de direita. Essa é uma liberdade; por mais que discordemos das escolhas do indivíduo, somos obrigados a acatar. Ele pode voltar atrás. Já as crianças que, mal deixam de brincar de bonecas, começam a fazer o próprio corpo de boneca... Poderão elas voltar atrás?


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5 comentários:

  1. Haha! Tu num é velho nem ranzinza... Tu só é careta! Caretaaaço... "Quadradão"! :-))

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  2. Pô, Luc! Não queima meu filme! Eu sou jovem, jovem é outro papo, sacou!!! (by Chico Anysio... hehe! Viu como eu sou jovem?)

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  3. comentário que se faz, a partir dos 40 - "jovem é estado de espírito"... pura bullshit rsrsrs
    Abs Tony

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  4. Salve, Tony! Não sei quanto a você, mas, partindo desse princípio, sou praticamente um bebê. Hehe!

    Abração do
    Léo.

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  5. P.S. Não tinha reparado no "bullshit". Que merda! Hehe! Quer dizer então que eu não sou jovem, pô? Hahah! Ranzinza, sim, véio, never!!!

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