quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Crônicas Desclassificadas: 60) De mensalão, ideologias, reforma política, voto vinculado etc.

José Dirceu (2º em pé, da esquerda 
para a direita) foi um dos 15 pre-
sos políticos soltos em troca da li-
bertação do embaixador ameri-
cano Charles Burke Elbrick
Foto: Reprodução
A página 2 da Folha de São Paulo de hoje praticamente se dedicou a espinafrar o PT, com tintas de deixar roxa a Veja! Meio que como uma edição do Jornal Nacional de dias antes das eleições, quando este dedicou cerca de vinte minutos de sua programação ao mensalão. O PT errou? Sim, errou. E está pagando o preço. Descobriu-se que o partido dos ex-barbudos não é constituído de santos, mas de gente feita do mesmo barro de onde saíram seus adversários.

Certo, entendido. Mas daí a querer demonizá-lo a essa altura do campeonato me parece quase uma infantilidade, principalmente após tão evidente vitória nas urnas. Admitamos: a corrupção existe no Brasil desde que o primeiro português quis negociar com um índio. Se o PT a tivesse inventado, tudo seria mais simples, bastava o xerife Joaquim Barbosa usar de seu poder (que será ainda maior semana que vem, quando ele passará a ser "o cara", após aposentadoria de Carlos Ayres Britto, atual presidente do STF) e pôr toda a corja ex-comedora de criancinhas pra sentar no banco dos réus.

Mas sabemos que o buraco é mais embaixo. Aliás, sempre é. Querem saber o que eu acho? Acho que armaram pro PT, deram-lhe corda pra que entrasse no clubinho, mas lhe impuseram as "normas da casa", caso contrário governariam sem governar. Afinal, sendo minoria ninguém aprova nada. E, quando os ingênuos vermelhos aceitaram as tais normas, vieram os bons e grisalhos velhinhos, por meio do pau mandado Roberto Jefferson, e lhes puxaram o tapete, pra que eles soubessem que não, não faziam parte do clubinho! Onde comem dois não comem três.

E a grande vítima dessa história toda é o Brasil, pois agora os crédulos acham que os bandidos (leia-se Dirceu, Genoino & cia.) vão pra cadeia e o país vai voltar a ser o grande parque de diversões que foi. Acho engraçado, aliás, não, não tem nada de engraçado nisso... Acho aterrorizante o modo quase nazista como alguns abrem a boca pra falar de José Dirceu, um cara que, ok, pode até ser ambicioso, mas tem um passado comprovado de lutas pelo país. E os mais felizes são os que nunca fizeram nada além de engordar o próprio gado!

O fato é que o país está sendo dividido, estamos praticamente como os EUA, de um lado republicanos, do outro democratas. Mas isso é uma grande e perigosa farsa. Queridos, crianças, o Brasil possui hoje nada menos que 30, sim, eu disse TRINTA partidos políticos! Todos de garfo e faca em riste, guardanapo no colo, bem sentadinhos à mesa da mãe gentil negociando sua fatia. Se o PT sai fora já vai tarde, é um a menos com quem dividir o boi gordo. A diferença será que, como todos pertencem ao mesmo clube, novos conchavos não irão virar novela, como o mensalão, que foi acompanhado por milhões enquanto estes comiam arroz com feijão (pra não dizer pipoca).

Lembrei de ter lido uma postagem de minha amiga Lia Buratto no facebook dia desses em que ela dizia: "Hipocrisia, eu quero uma pra viver". Pois é, a realidade é bem essa. Cada um quer uma hipocrisia pra chamar de sua hoje em dia. Ideologia? Bah, não me faça rir! Mas, um instante, maestro! Não, não venho em defesa do PT! Errou, pague. Só não acho justo que SÓ o PT pague! E justo o PT, que, bem ou mal, aos trancos e barrancos, foi um dos partidos que mais fizeram por nosso paisinho bric. Por que não vão julgar os outros? Porque são a maioria. De rabo preso, mas maioria. 

A saída vem sendo gritada por muitos, mas ninguém quer ouvir. Chama-se reforma política (seja lá o que isso for). Não dá mais pra se gastar tanta grana em campanhas eleitorais, não dá mais pra se regatearem minutos de horário eleitoral em troca de alianças, acordos, secretarias. Não, alguém tem que bater na mesa como fez o manno russo (embora no caso deste não tenha lá dado muito certo). Já passa da hora de voltarmos a pensar em ideologia. Pra que trinta partidos, se três é pouco, quatro é muito e cinco  é demais, sobretudo quando 99% deles pendem à direita ou à esquerda (ou ao centro) ao sabor do vento (leia-se: $)?

Em 1982, ano das primeiras eleições pós-ditadura, eu tinha dez anos, mas me lembro de ter ouvido falar de um tal de voto vinculado, que, soube depois, tratava-se da obrigatoriedade de que o eleitor votasse, sob risco de anulação do voto, em todos os candidatos de um mesmo partido. Ou seja, se houvesse pleito pra governador, senador, deputado etc., o eleitor tinha que escolher todos os candidatos dentro de um só partido. Ora, você que tem menos de 40 anos e que nunca tinha ouvido falar em tal sandice deve estar pensando: "Como eram idiotas!", já que você, pessoa esclarecida, acredita em pessoas, não em ideologias. Ora, você está certo, já que as ideologias foram pra caixa-prego. 

Contudo, o que você não quer ver é que, quando perceberam que o voto vinculado daria quatro anos de poder absoluto a um partido e o exterminaram, exterminaram aí a ideologia. E começou a feira livre! Se o voto vinculado voltasse a ser obrigatório, nada do circo a que assistimos hoje existiria. Claro, em vez de ver o mensalão você ia ter que ler um livro ou ir ao cinema, mas isso são "ócios" do ofício. Pense bem, meu caro "torcedor" do PSDB: até anteontem você achava que Kassab era um prefeito excepcional, mas, após ele ter jantado à luz de velas com nossa presidente, hoje ele não passa de um crápula, um vendido. Ora, ponha-se no lugar dele. Diria mais: ponha-se no lugar dos políticos que tiveram a mão molhada no mensalão. O que faria você no lugar deles?

Não, não responda agora! Aproveite esse tão merecido descanso e vá à praia lavar o esqueleto e a alma num bom banho de mar, comer camarão, tomar umas brejas e pegar uma cor. Responda-me na quarta-feira (de cinzas?).

***

16 comentários:

  1. Fui eu que escrevi "Hipocrisia, eu quero uma pra viver". Adorei o texto.

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    1. É verdade! Já está devidamente citada! Obrigado pela contribuição.

      Beijos,
      Léo.

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  2. adoreiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii

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  3. parabensssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssssss jornalista LÉO NOGUEIRA

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    1. Quem dera, Tim! Sou meramente um escrevinhador, mas agradeço pelas gentis palavras.

      Abração do
      Léo.

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  4. BRILHANTEMENTE LÚCIDO, LÉO!!!
    ASSINO EM BAIXO, POSSO??
    PARABÉNS!
    BEIJÃO,

    CAVA

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  5. Caramba!
    Eu iria escrever "Assino Embaixo", mas o Cava já o fez...
    Assino embaixo II...rsrs
    Abraçosssssssssss
    Moreirinha

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    1. Moreirinha, assim vai virar um abaixo-assinado. Hahaha! Valeu!

      Abração do
      Léo.

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  6. Excelente, já compartilhei no face. Um beijo-açu.

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  7. Sou da turma que grita, às tampas, pela Reforma Política. Parabéns pelo texto.
    Ah, sou filiado e não abandonei o PT por conta do mensalão.

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    1. Gratíssimo, Paulo Américo! Eu também continuo acreditando. Tomara que em 2013 essa reforma comece, pelo menos ideologicamente falando, pelo próprio PT. Tá na hora de ele limpar de vez essa mancha.

      Abraço do
      Léo.

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  8. Como sempre Léo, acho teus textos de uma grandeza enorme. As vezes deixo aqui minha opinião, outras vezes leio apenas uma vez e quase sempre leio mais de 10 vezes, risos, pois gosto da tua forma de expressão.
    Esta aqui um depoimento que realmente é pra ser lido, relido e repensado. Eu, concordo com tudo aqui exposto, mas achei algo interessante que eu realmente não compreendo. Por que tantos? Deixo aqui , com as tuas palavras a minha indignação ao concluir essa realidade:
    ... crianças, o Brasil possui hoje nada menos que trinta, sim, eu disse TRINTA partidos políticos! Todos de garfo e faca em riste, guardanapo no colo, bem sentadinhos à mesa da mãe gentil negociando sua fatia.

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    1. Oi, Marta! Muito me envaidece ler suas palavras. Obrigadíssimo! Quanto ao "clube dos 30", é realmente surpreendente, não? Quando fiquei sabendo disso fiquei chocado! Sabia que eram muitos, mas tantos? O Brasil será grande quando não precisar de tantos "atravessadores".

      Abraços,
      Léo.

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