Por Fernando Freitas |
O primeiro acontecimento foi este: num de nossos mais recentes encontros, Dodô (é assim que eu o chamo), à queima-roupa, me lançou um convite pra que encampássemos o projeto de um disco só com parcerias nossas. Na hora, me senti deverasmente lisonjeado, mas algum tempo depois comecei a achar que era só mais uma ideia jogada no ar por esse meu amigo de mais ideias que realizações. Contudo, com o decorrer dos dias subsequentes vi que ele estava realmente animado, pois passamos mesmo a falar quase que diariamente, sempre com o intuito de lapidar a pedra bruta. E detectamos, com alegria, que tínhamos uma infinidade de belas canções em parceria, tantas que, num segundo encontro, resolvemos até abrir mão daquelas que tivessem um terceiro parceiro – fui voto vencido, queria deixar registrado; o voto de minerva coube a Solange "Marin" Rocco.
Voltando no tempo, gostaria de lembrar um fato que se tornou recorrente em nossa longa trajetória de, mais que parceiros, comparsas em tantas empreitadas musicais: Dodô foi o primeiro de meus tantos parceiros que (pasmem!) cometeu o disparate de me enviar uma letra pra que eu musicasse. E, percebam, não estou me referindo a um compositor zé-mané; Adolar (aqui preciso chamá-lo pelo nome, pra enfatizar o respeito) é um dos melhores compositores que conheço que estão na ativa. Baita melodista, letrista inspirado e verdadeiro, instrumentista fera, além de dominar os caminhos da harmonia como poucos, o cara tinha que ser louco ou ter um grande coração (ou ambas coisas) pra cometer esse gesto de grandeza... e ousadia.
Mas acrescento alguns dados à prosa: ele já sabia que eu brincava (e ainda brinco) de inventar melodias vez em quando. Tenho mesmo o hábito (já comentei isso por aqui) de compor letras cantarolando. Na maioria das vezes, a melodia resulta sofrível ou pouco original, assim a dispenso e repasso a letra. Só que, vez por outra, contrario o hábito de errar na mão e acerto uma melô até interessante. Assim, pra resumir, após muito sofrimento, muito suor e algumas lágrimas, consegui transformar os "marineiros" versos numa canção bem bonita (modéstia às favas). Chamou-se Gerúndio (e contou, a bem da verdade, com pequena, mas importante, colaboração de Élio Camalle, que me ajudou a resolver o final melódico e a harmonizou – dei-lhe parceria, embora contrariado; queria ter tido a capacidade de finalizá-la só), e foi a primeira de muitas.
Sim, porque de lá pra cá Dodô, animado com o fato de o resultado inicial ter ficado acima de suas expectativas, acostumou-se a repetir a dose, o que resultou em cerca de meia dúzia de parcerias às avessas, ou seja, canções com melodia minha e letra dele. Uma ou outra deve fazer parte desse disco novo que ora engendramos. Aliás, por falar em disco, no primeiro parágrafo comentei acerca de acontecimentos recentes que me motivaram a conceber este texto-homenagem, e um desses acontecimentos foi justamente uma entrevista recente que Dodô concedeu e na qual pela primeira vez falou em público sobre esse disco, tornando-o assim, digamos, oficial. Pode até ser que não vingue, mas esse carinho "no ar" já merece, e aumenta, minha supracitada gratidão.
Principalmente porque em minha longa e esburacada trajetória musical (construída sobre estrada de terra – e em dias de chuva) tenho notado que é muito difícil pra maioria dos artistas (muitos dos quais parceiros meus) tirar as luzes dos holofotes de cima de si e lançá-las sobre terceiros; e Adolar vem sendo, desde sempre, uma rara exceção. E este é outro aspecto que nos aproxima; não coincidentemente, ambos desenvolvemos projetos paralelos que se irmanam em sua essência: eu venho levantando, tijolo a tijolo, as paredes deste meu bloguinho tratando (quase sempre) de parceiros e amigos queridos, além de outros que admiro e não têm comigo nenhuma relação; já ele tem feito o mesmo, e com maestria (e boa companhia), por meio de seu maravilhoso Na Minha Casa (veja aqui).
Pra terminar, e como a proposta deste texto é fazer a Dodô uma homenagem, roubo pra cá trechos de release que lhe escrevi há algum tempo: "Seria um sambista com influência do Clube da Esquina, um roqueiro que caiu na bossa, um erudito pop, um jazzista tocador de MPB, um bluseiro fazedor de baiões? Em qual prateleira o lojista poderia ordenar os CDs de Adolar Marin? Alguns artistas têm sua obra facilmente classificada; não é o caso desse paulistano que ouviu do Ipiranga os primeiros sons do mundo... e nunca mais parou. De tanto ouvir, soou. Já com 8 anos de idade, quando um violão desavisadamente lhe caiu nas mãos e surgiu no garoto o desejo de "violá-lo", o instinto lhe disse que nascera pr'aquilo. Adolescente, apaixonou-se pela guitarra e, entre pedais e microfones, começou a arriscar as primeiras composições próprias. Mais tarde, descobriria a poesia, o que iria "contaminar" pra sempre suas letras, repletas de dúvida e fé.
"[...] Mas Adolar é, antes de tudo – e como todo bom artista –, um inquieto. Depois da aura de clássico na qual foi envolto o Atemporal [seu segundo CD], e indo na contramão das expectativas, eis que ele traz à luz um terceiro trabalho completamente diferente de tudo o que havia feito antes. Com formação enxuta e roqueira, chega às lojas em 2013 Epílogo, não mais um disco de Adolar, mas do Adolar Marin Trio [...]. Adolar explica que nesse disco tinha a intenção de fechar um ciclo (daí o título), voltar ao início, quando, ainda garotão, apresentava-se em bandas de rock. Mas, como tudo o que vem do artista, tampouco Epílogo poderia caber na prateleira de discos de rock, porque, apesar da formação roqueira, o trabalho do artista tem outro 'peso'." (Leia o release na íntegra aqui.)
É isso! Na categoria luta contra moinhos, Adolar Marin é peso-pesado, e eu tenho o maior orgulho de ser seu Sancho Pança. Pra cima deles, Dodô!
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PS: O bom matador de cobras não mostra o pau, mas sim a cobra morta. Portanto, finalizo estas escrevinhações com a entrevista da qual tratei acima e aproveito pra trazer outra, um pouco mais antiga, assim quem quiser, agora ou futuramente, saber um pouco mais desse grande artista por suas próprias palavras, já sabe onde encontrar.
1) Programa Hora do Rango – apresentação de Colibri (Rádio Brasil Atual):
2) Programa Sons do Brasil – apresentação de Serginho Sagitta (Rádio Usp):
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Que lindo, Leléo!!! Sou suspeita, mas adoro o que fazem!
ResponderExcluirEu sou mais suspeito ainda, Sossô, e também adoro. rs
ExcluirBeijos,
Léo.
Que coisa maravilhosa Léo.... Falar sobre Adolar Marin é não ter final de assunto... Muita coisa a dizer e ainda amparado por este Sancho Pança das letras.... É assunto pra mais de metro!!!! Abrax!!!!
ResponderExcluirValeu, Serginho! Estamos em sintonia! Seu Sons do Brasil e meu bloguinho posso dizer que se irmanam nos objetivos.
ExcluirAbração,
Léo.
Manoléo e sua escrita fina me enchem de alegria e gratidão neste momento. O que dizer?
ResponderExcluirLeléo e eu, eu e Leléo... juntinho!!
Segue a saga, muita coisa por vir, simbora!
Abraçolar
É isso aí, Dodô! Estamos só começando!
ExcluirAbraçaço,
Léo.
Eu não sou suspeita de nada e adoro o q fazem!
ResponderExcluirComo não é suspeita? Cê tá no topo de minha lista de suspeições! rsrs
ExcluirBeijos e obrigado, queridona,
Léo.
Hahahahaha...
ExcluirHehehehehe...
ExcluirLéo, neste momento caótico, "saber" e compartilhar da gratidão, do bom encontro, da cumplicidade nos anima!
ResponderExcluirVida linga a esta linda parceria!
Gratíssimo, Cida!
ExcluirBeijos,
Léo.
Leozim, muito legal o texto. É ótimo, pra quem tá longe, apesar de tão perto - ou é o contrário? - saber que dois ótimos e queridos amigos estão levando adiante um projeto que desafia reciprocamente e que já possui resultados legais.
ResponderExcluirFã que sou de vocês, espero mesmo é chegar a hora do cd estar em minhas mãos (e escutá-lo bem alto, segundo orientações do Dodô...rsrs).
Abração aos dois! Viva esta parceria!
Valeu, Erico, queridão!
ExcluirAguarde as novidades! Do lado de cá, também estou muito ansioso e contente com esse projeto.
Abração,
Léo.