O assassinato da vereadora carioca Marielle Franco — que, pra informação a quem não mora neste planeta, era negra, lésbica, mãe, nascida e crescida no Complexo da Maré, graduada em Ciências Sociais e eleita na mais recente eleição municipal vereadora pelo Psol, tendo sido a quinta mais votada em sua cidade —, além de gerar comoção Brasil afora, tem servido também pra que desocupados mal-intencionados propaguem suas baboseiras. Entre aqueles que não compartilham dos ideais de Marielle, li alguns relativizarem sua morte e outros mesmo tentarem achar justificativas pra tragédia, ligando-a ao tráfico de drogas.
Difamar um morto fala mais sobre o caráter (ou a falta deste) de quem difama do que o do próprio morto, que não tem mais condições de se defender. E sobretudo quando esse morto foi assassinado e mais ainda quando foi executado. Sim, porque assassinatos vemos aos montes todos os dias, muitas vezes casos de pessoas vitimadas por assaltos seguidos de morte ou mesmo balas perdidas — no Rio isso até se banalizou. No entanto, uma execução está num patamar acima, o da premeditação, o que nos leva a imaginar acerca dos possíveis motivos do(s) assassino(s).
Por essas e outras, quando ouço/leio alguém diminuir a importância desse assassinato, comparando-o com outros mais comuns, tendo a crer que essa pessoa que fala por falar ou é burra ou é cafajeste. Cada morte tem seu peso e cada morto tem aqueles que o chorarão, mas quando vemos uma pessoa pública ser assassinada num ato premeditado, sobretudo quando essa pessoa exercia um cargo político pro qual foi eleita pelo voto de grande parcela de um eleitorado, temos que nos preocupar não só por essa morte como também pelo assassinato desses votos.
E aqui o importante nem é tanto a questão de ideologia, mas de representatividade. Um político eleito, quer gostemos dele ou não, representa uma parcela da sociedade que o elegeu por compartilhar de seus ideais/objetivos. Suponhamos que você não se sinta representado por Marielle e por isso a rotule disso ou daquilo. Ok, lá com seu travesseiro é seu direito; agora, em público é desrespeito a ela e a seus eleitores. Só pra exercitar o raciocínio, tente trocá-la por seu candidato. Percebe a gravidade da coisa? Hoje, matam uma vereadora, amanhã podem matar um prefeito, governador, presidente...
Claro, Marielle era peixe pequeno; já quando o negócio acontece no escalão de cima, cinco tiros na cabeça do excelentíssimo senhor fulano de tal podem sair pela culatra, pois aí a comoção é em nível nacional e a vítima pode virar um mártir. Nesse caso, é menos complexo manipular as leis e tentar, por exemplo, tirar da jogada um(a) presidente por meio de um impeachment. Pra isso, basta que a quadrilha seja grande o suficiente pra atingir o número necessário de votos. Afinal, quando os ladrões fazem as leis, sempre se dá um jeitinho de culpar inocentes e inocentar culpados. E o dinheiro que rola nessas negociatas nunca vem de seus próprios bolsos.
Da mesma forma que juízes tendenciosos e partidários podem fechar os olhos pro que acontece do lado de seus "chegados" e agir com o mais extremo rigor em relação a quem se encontra em campo adversário. Em situações assim, nem são necessários promotores; os próprios juízes já tomam pra si também essa função. Podem até, nos bastidores, trocar figurinhas pra que as penas coincidam. E, como eles representam a lei, mostrar provas que incriminem de fato o sujeito não importa, basta um blá-blá-blá retórico e enfadonho que faça a plateia dormir e se desinteressar do caso.
É, a coisa tá feia pra nós da esquerda. Aceitar entrar numa partida sabendo que o juiz e os bandeirinhas estão comprados ou é pra herói ou pra louco. E o mais triste nisso tudo é ver o modo como a lavagem cerebral é feita, como no caso da intervenção militar no Rio, que, em vez de, pra usar um pouco de metáfora, cortar a árvore do tráfico pela raiz, opta por simbolicamente arrancar seus frutos dos galhos. Até porque é bem mais fácil justificar a guerra contra a violência prendendo ou matando meia dúzia de laranjas do que fazer essa mesma intervenção em bairros mais nobres, onde os manda-chuvas se regalam.
Porque a intenção nunca foi acabar com o tráfico e tirar o ganha-pão dos amigos graúdos; e sim dar circo a quem quer pão. Nesse picadeiro, dos tiros disparados na vereadora sobram balas perdidas pra todos nós, balas que não alcançam certos helicópteros e seus pós.
Difamar um morto fala mais sobre o caráter (ou a falta deste) de quem difama do que o do próprio morto, que não tem mais condições de se defender. E sobretudo quando esse morto foi assassinado e mais ainda quando foi executado. Sim, porque assassinatos vemos aos montes todos os dias, muitas vezes casos de pessoas vitimadas por assaltos seguidos de morte ou mesmo balas perdidas — no Rio isso até se banalizou. No entanto, uma execução está num patamar acima, o da premeditação, o que nos leva a imaginar acerca dos possíveis motivos do(s) assassino(s).
Por essas e outras, quando ouço/leio alguém diminuir a importância desse assassinato, comparando-o com outros mais comuns, tendo a crer que essa pessoa que fala por falar ou é burra ou é cafajeste. Cada morte tem seu peso e cada morto tem aqueles que o chorarão, mas quando vemos uma pessoa pública ser assassinada num ato premeditado, sobretudo quando essa pessoa exercia um cargo político pro qual foi eleita pelo voto de grande parcela de um eleitorado, temos que nos preocupar não só por essa morte como também pelo assassinato desses votos.
E aqui o importante nem é tanto a questão de ideologia, mas de representatividade. Um político eleito, quer gostemos dele ou não, representa uma parcela da sociedade que o elegeu por compartilhar de seus ideais/objetivos. Suponhamos que você não se sinta representado por Marielle e por isso a rotule disso ou daquilo. Ok, lá com seu travesseiro é seu direito; agora, em público é desrespeito a ela e a seus eleitores. Só pra exercitar o raciocínio, tente trocá-la por seu candidato. Percebe a gravidade da coisa? Hoje, matam uma vereadora, amanhã podem matar um prefeito, governador, presidente...
Claro, Marielle era peixe pequeno; já quando o negócio acontece no escalão de cima, cinco tiros na cabeça do excelentíssimo senhor fulano de tal podem sair pela culatra, pois aí a comoção é em nível nacional e a vítima pode virar um mártir. Nesse caso, é menos complexo manipular as leis e tentar, por exemplo, tirar da jogada um(a) presidente por meio de um impeachment. Pra isso, basta que a quadrilha seja grande o suficiente pra atingir o número necessário de votos. Afinal, quando os ladrões fazem as leis, sempre se dá um jeitinho de culpar inocentes e inocentar culpados. E o dinheiro que rola nessas negociatas nunca vem de seus próprios bolsos.
Da mesma forma que juízes tendenciosos e partidários podem fechar os olhos pro que acontece do lado de seus "chegados" e agir com o mais extremo rigor em relação a quem se encontra em campo adversário. Em situações assim, nem são necessários promotores; os próprios juízes já tomam pra si também essa função. Podem até, nos bastidores, trocar figurinhas pra que as penas coincidam. E, como eles representam a lei, mostrar provas que incriminem de fato o sujeito não importa, basta um blá-blá-blá retórico e enfadonho que faça a plateia dormir e se desinteressar do caso.
É, a coisa tá feia pra nós da esquerda. Aceitar entrar numa partida sabendo que o juiz e os bandeirinhas estão comprados ou é pra herói ou pra louco. E o mais triste nisso tudo é ver o modo como a lavagem cerebral é feita, como no caso da intervenção militar no Rio, que, em vez de, pra usar um pouco de metáfora, cortar a árvore do tráfico pela raiz, opta por simbolicamente arrancar seus frutos dos galhos. Até porque é bem mais fácil justificar a guerra contra a violência prendendo ou matando meia dúzia de laranjas do que fazer essa mesma intervenção em bairros mais nobres, onde os manda-chuvas se regalam.
Porque a intenção nunca foi acabar com o tráfico e tirar o ganha-pão dos amigos graúdos; e sim dar circo a quem quer pão. Nesse picadeiro, dos tiros disparados na vereadora sobram balas perdidas pra todos nós, balas que não alcançam certos helicópteros e seus pós.
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Excelente texto, Léo! Obrigada!
ResponderExcluirValeu, Esthercita! Lo siento, só me deparei com seu comentário hoje, mais de um ano depois... Por falar nisso... Quem...?
ExcluirBeijos,
レオ。
Primeiro, seu texto é sempre ótimo.
ResponderExcluirDaí, vem, o amplo sofrimento numa época horrível no Brasil, de uma pessoa que luta pelos Direitos Humanos - o que me diz que ela tinha muito mais a dar no futuro, nestas eleições. Não quero dar uma de bola de cristal, mas me parece que, por sua força, Marielle, poderia ser candidata a um cargo de enorme representatividade.
Sofri com a morte de Marielle, muito, choro quando vejo a força, a beleza, o sorriso determinado de quem quer fazer, depois de ter vencido várias etapas de sua vida. Vejo uma jovem do presente e do futuro ser exterminada da maneira mais vulgar e aviltante - mesmo que contrários, vulgar e aviltante, chegam a significar no contexto em que ela foi atacada, porquê, como, a perseguição, a premeditação, "a Matrix tirando do meio alguém que ajudaria a exterminá-lo"....(Viajei? Não!)
Meu lamento é enorme. Intuo um quadro negro, bem mais negro pra o Brasil. Mas espero que minha outra intuição, de que exterminar tal "garota", mulher tão linda, seja o avesso do que esperaram os que fizeram este absurdo. Que acorde o povo anestesiado, que reorganize a capacidade de indignação, de cidadania, de apropriação das capacidades de cada CIDADÃO, cuidando mais dos seus, em todos os níveis - de igual forma, se necessário.
Marielle, meu beijo pra você. Que prossiga em paz sua jornada. Que seu grito calado contamine. Isto é o que realmente espero, como celebração à sua existência!
Léozim, beijo pra ti, continue contundente, verdadeiro, sincero, matando a cobra e mostrando o pau!
Ô, querido! Assim como o comentário da Esther, acima, só li hoje o seu. E, pra pesar meu, pouca coisa aconteceu desde então. Sem falar nos 80 tiros que aquele músico levou, dentro de seu carro, indo passear com a família... E os retardados fazendo arminha...
ExcluirAbraços, mano meu!
レオ。