domingo, 21 de agosto de 2011

Joaquín Sabina en Portugués: 6) Daisy Cordeiro e a versão de "Jugar por jugar"



Seria cômico se não fosse trágico... Pensando bem, acho que o proparoxítono adjetivo que cabe melhor aqui é ridículo. Sim, chega a ser ridículo que em pleno século XXI ainda haja tanta intolerância no mundo. Não sei por que ainda é tão difícil viver e deixar viver... Na realidade, é mesmo um paradoxo, pois quem não vive passa os dias tendo inveja de quem vive, ao passo que muitos dos que vivem o fazem às custas dos que são obrigados a não viver...

Antigamente, quando as minorias (e nem estou me referindo às massas, que são outra qualidade de maioria; refiro-me às minorias étnicas e quetais) a tudo aguentavam sem reagir, tudo estava bem, mas bastou que se mobilizassem pra que a maioria passasse a reivindicar seus direitos de maioria.
É realmente ridículo que, em resposta à Parada Gay, necessitemos de um Dia do Orgulho Heterossexual; que uma passeata favorável à descriminalização das drogas gere outra contra (tomando o nome de Deus em vão!)... Os nervos andam à flor da pele. Se um pai abraça um filho em local público, leva porrada, pois, na dúvida, deve ser gay (e daí se for?). Uma faxineira às cinco da manhã num ponto de ônibus leva porrada, pois, na dúvida, deve ser prostituta (e daí se for?). Um bate-boca no trânsito acaba em assassinato... Pensando melhor, acho que é trágico mesmo! 

Às vezes me vem à mente um cartoon imaginário no qual um homem das cavernas, enquanto guia seu EcoSport, fala alto ao celular, consulta seu iPad e avança (sem ver) o vermelho semáforo. Chegamos a esse ponto: trogloditas informatizados! Falta só o cartaz de "Bem-vindos a Bedrock". Mas não se trata de uma cidade, trata-se do mundo! Os imbecis estão por toda parte, até na Noruega! 

Contudo, deixemo-los de lado. Esse prefácio foi só pra dizer que é bom saber que ainda existem canções que conseguem ser brados contra todo esse absurdo. Claro que o compositor, como humano que é, às vezes verte em notas sua mágoa, e tem todo o direito a fazê-lo, mas é tão bom ouvir também canções que se posicionem, mais que a favor da esperança, clamando a que sejamos soldados dela!

É o caso de Jugar por Jugar, do Yo, Mi, Me, Contigo, disco que já comentei mais de uma vez aqui. E volto a afirmar: é dos trabalhos mais inspirados de Sabina, pro qual já fiz várias versões. E esta Jugar por Jugar, além do lirismo da melodia (uma valsa), tem na letra um tom de "endurecer sin perder la ternura". Juntando a esses dois fatores um terceiro (é uma das poucas canções de Sabina cujo tema não é acentuadamente masculino), tive a ideia de convidar pra cantá-la (refiro-me a minha versão, claro) a queridíssima Daisy Cordeiro.

E ela deu um banho de interpretação! Diria mesmo que reconstruiu a canção, mudou-lhe até o ritmo! Estou há tanto tempo sem ouvir Daisy cantar que por vezes me esqueço de como canta bem! E o resultado ficou tão bonito que até perdoamos a pouca qualidade técnica da gravação (ou não lhe fazemos caso). Espero que em breve repitamos a dose em estúdio, com melhores recursos. Também preciso agradecer ao violonista Igor De Bruyn por seu generoso trabalho em aprender a canção e executá-la à exaustão enquanto Daisy tentava extrair o melhor registro dela. Sem esquecer também Edson Vargas, que se deu ao trabalho de tentar melhorar-lhe a sonoridade.

Com vocês, por um mundo melhor, Jogar por Jogar

JOGAR POR JOGAR
Ariel Rot - Joaquín Sabina/versão: Léo Nogueira

Sugiro que o mais triste condenado
Ganhe o direito a ter lençóis de seda
Bendita a boca que, no atacado,
Seus beijos nos conceda

Proponho corromper o puritano
A ver quando a vizinha se ensaboa
E ir sondar se Jesus tinha outro plano
Que não sua coroa

Surpresa vale mais que segurança
Tem que correr bem mais do que a polícia
Pra se dançar a valsa das lembranças
Ingênuo e com malícia

A vida não é papel diagramado
Mas sim um passarinho em movimento
Que nunca volta aos ninhos do passado
Porque obedece ao vento

Mas se o cansaço vem, o que te importa
É dormir sono solto sem demora
Mas é melhor deixar aberta a porta
O amor não escolhe a hora

O sapo esconde um príncipe cativo
E bocas, um prazer além do fuso
Pra se beijar não tem curso intensivo
Aprende-se com o uso

E jogar por jogar
Pra não ter que morrer nem matar
E viver ao revés
Que dançar é sonhar pelos pés

Convém entrar penúltimo na meta
Voltar a ser guri, pintar o sete
E atacar o mestre dos poetas
Com bolas de confete

Mãos de saber despir são prazenteiras
Pra se manusear o que é belo
E fazer lingeries com as bandeiras
De verde e amarelo

É salutar tirar do sério os sérios
Pra andar veloz, divagar é preciso
Fazer seresta em pleno cemitério
Depois morrer de riso

E jogar por jogar
Pra não ter que morrer nem matar
E viver ao revés
Que dançar é sonhar pelos pés

A letra original:

JUGAR POR JUGAR
Ariel Rot - Joaquín Sabina

Sugiero que el más triste de los presos
Tenga derecho a sábanas de seda;
Bendita sea la boca que da besos
Y no traga monedas

Propongo corromper al puritano,
Espiar en la ducha a las vecinas,
Ir a quitarle al dios de los cristianos
Su corona de espinas

Nada de margaritas a los cuerdos,
Hay que correr más que la policía
Para bailar el vals de los recuerdos
Llorando de alegría

La vida no es un block cuadriculado
Sino una golondrina en movimiento
Que no vuelve a los nidos del pasado
Porque no quiere el viento

Se aconseja dormir a pierna suelta
Lejos de tentaciones de diseño,
Que no pase de largo por tu puerta
El hombre de tus sueños

La rana esconde un príncipe encantado,
Tu boca un agridulce de membrillo
¡Qué ganas de un cursillo acelerado
De besos de tornillo!

Y jugar por jugar
Sin tener que morir o matar,
Y vivir al revés
Que bailar es soñar con los pies

Conviene entrar penúltimo en la meta
De la vuelta a la infancia en patinete
Y fusilar al rey de los poetas
Con balas de juguete

Por qué no doctorarse en cremalleras
Como hace la hormiguita por tu espalda
E hilvanar con jirones de banderas
Braguitas rojigualdas

Hacen falta cosquillas para serios,
Pensar despacio para andar deprisa,
Dar serenatas en los cementerios
Muriéndose de risa

Y jugar por jugar

Sin tener que morir o matar,
Y vivir al revés
Que bailar es soñar con los pies

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