Fazia algum tempo vinha querendo escrever sobre
Tom Zé, e devo (quem diria!) à Coca-Cola a transformação desse desejo em
realidade. Soa até engraçado, pois se dependesse de mim ela já teria
falido, não por ativismo político, mas simplesmente por questões
palatais. Pois bem, o fato é que fiquei sabendo por meio do "tribunal do
feicebuque" que Tom Zé havia ganhado uma grana usando sua voz pra um
comercial do supracitado refrigerante e, não conseguindo ter paz por
causa do "fogo amigo" de seus fãs, viu-se obrigado a se desfazer desse
dinheiro, doando-o pra uma banda de Irará (sua cidade natal, no interior
da Bahia) que tempos atrás o havia expulsado por considerá-lo "um filho de rico ocupando a a vaga de algum aluno pobre". E eu, que tenho sido sempre honesto com meu patrão (eu mesmo)
neste espaço, achei que era chegada a hora de dizer duas ou três
palavrinhas sobre o moço.
Tom Zé é um cabra ousado, eu também sou (no meu caso, como um desconhecido, dizem "sem noção", mas dá no mesmo). Por isso havia pensado em catalogá-lo na humilde (e famigerada) coluna Ninguém me Conhece. Voltei atrás, mas, se tivesse tido coragem, tenho certeza de que Tom Zé me absolveria. Principalmente por causa de seu depoimento ao programa Ensaio da TV Cultura (menino, não disse que estudei o Tom?) de 1990 e bolinha, no qual dizia que David Byrne comprara desavisadamente um disco seu quando, visitando o Brasil em 1986, pesquisava em lojas de discos acerca de música brasileira e achou o genial Estudando o Samba. Continuou Tom Zé que, tempos depois, já em Nova York, Byrne, assustado, ligou pra Arto Lindsey e perguntou: "Que diabo de país é esse que tem um artista como esse e ninguém conhece?". Sacaram?
O fato é que quase 30 anos depois, embora Tom Zé não seja um grande vendedor de discos, é um cara conceituado, que frequenta os mais variados programas de tevê, desde o do Jô e o Roda Viva, passando pelo do Ronnie Von até chegar no do Ratinho, mas, dada essa questão da "polêmica" propaganda da Coca-Cola, eu me perguntei: será que algum fã conhece Tom Zé de verdade? E mais, será que esses fãs patrulheiros, burgueses e bem-nascidos, comunistas de direita, conhecem de verdade um ídolo que seja? A resposta me caiu na cabeça como um tijolo: não! E por isso cá estou, pra falar do Tom Zé que ninguém conhece, do mesmo modo como já falei do outro lado de artistas como Zé Rodrix, Sérgio Sampaio, Tavito, Vicente Barreto (parceiro de Tom Zé e meu - ô, sorte!) etc... mas na coluna Os Manos e as Minas, pra não melindrar intolerantes.
Acentuando a sinceridade, tenho de agradecer a Roney Giah, pois foi assistindo a um arranca-rabo entre compositores em seu perfil feicibuquiano que tive acesso a essa informação coca-colística. Mas o que mais me chamou a atenção foi que Roney, sabedor dos percalços da vida de artista (ele mesmo um deles), defendendo o ganha-pão de nosso querido Tom, chamou-o de gênio, e, nesse momento, outra patrulha, a do gosto pessoal de cada um, desviou a temática, alfinetando Zé, digo, Tom, em seu calcanhar de aquiles. E qual é o calcanhar de aquiles de um compositor que se preze? Percentualizar quantas (e quais) canções esse camarada tem na boca do povo. Tal polêmica me chocou por dois motivos: 1) vi parceiros meus julgando o baiano pela falta de hits (vejam que nem escrevo sucessos); e 2) tampouco eu sabia mais do que dois ou três refrões desse ilustre filho de Irará!
Quanto ao item 1, perdoo meus parceiros (não vou citar nomes, pois seria antiético), pois nós, compositores "lado B" deste Brasil de ninguém, sabemos que sucesso e/ou fracasso não têm necessariamente que ver com qualidade. Já em relação ao item 2, me atirei, com gosto e com gozo, na obra de Tom Zé e me senti tão constrangido quanto maravilhado com ela. Constrangido por, pesquisador que sempre me senti, não a conhecer. Maravilhado por saber que a música brasileira é tão rica que, por mais que pesquisemos, sempre haverá alguém ainda a nos surpreender. E Tom Zé, graças a Deus, me surpreendeu. E aqui deixo um depoimento: música depende muito do momento de cada um. Uma amiga, Suzy, já tentara, nos primórdios, me sensibilizar com a música de Tom Zé, em vão. Anos depois o milagre se deu.
Glória (Tom Zé)
Tom Zé é um cabra ousado, eu também sou (no meu caso, como um desconhecido, dizem "sem noção", mas dá no mesmo). Por isso havia pensado em catalogá-lo na humilde (e famigerada) coluna Ninguém me Conhece. Voltei atrás, mas, se tivesse tido coragem, tenho certeza de que Tom Zé me absolveria. Principalmente por causa de seu depoimento ao programa Ensaio da TV Cultura (menino, não disse que estudei o Tom?) de 1990 e bolinha, no qual dizia que David Byrne comprara desavisadamente um disco seu quando, visitando o Brasil em 1986, pesquisava em lojas de discos acerca de música brasileira e achou o genial Estudando o Samba. Continuou Tom Zé que, tempos depois, já em Nova York, Byrne, assustado, ligou pra Arto Lindsey e perguntou: "Que diabo de país é esse que tem um artista como esse e ninguém conhece?". Sacaram?
A Gravata (Tom Zé)
O fato é que quase 30 anos depois, embora Tom Zé não seja um grande vendedor de discos, é um cara conceituado, que frequenta os mais variados programas de tevê, desde o do Jô e o Roda Viva, passando pelo do Ronnie Von até chegar no do Ratinho, mas, dada essa questão da "polêmica" propaganda da Coca-Cola, eu me perguntei: será que algum fã conhece Tom Zé de verdade? E mais, será que esses fãs patrulheiros, burgueses e bem-nascidos, comunistas de direita, conhecem de verdade um ídolo que seja? A resposta me caiu na cabeça como um tijolo: não! E por isso cá estou, pra falar do Tom Zé que ninguém conhece, do mesmo modo como já falei do outro lado de artistas como Zé Rodrix, Sérgio Sampaio, Tavito, Vicente Barreto (parceiro de Tom Zé e meu - ô, sorte!) etc... mas na coluna Os Manos e as Minas, pra não melindrar intolerantes.
Senhor Cidadão (Tom Zé)
Acentuando a sinceridade, tenho de agradecer a Roney Giah, pois foi assistindo a um arranca-rabo entre compositores em seu perfil feicibuquiano que tive acesso a essa informação coca-colística. Mas o que mais me chamou a atenção foi que Roney, sabedor dos percalços da vida de artista (ele mesmo um deles), defendendo o ganha-pão de nosso querido Tom, chamou-o de gênio, e, nesse momento, outra patrulha, a do gosto pessoal de cada um, desviou a temática, alfinetando Zé, digo, Tom, em seu calcanhar de aquiles. E qual é o calcanhar de aquiles de um compositor que se preze? Percentualizar quantas (e quais) canções esse camarada tem na boca do povo. Tal polêmica me chocou por dois motivos: 1) vi parceiros meus julgando o baiano pela falta de hits (vejam que nem escrevo sucessos); e 2) tampouco eu sabia mais do que dois ou três refrões desse ilustre filho de Irará!
Botaram Tanta Fumaça (Tom Zé)
Quanto ao item 1, perdoo meus parceiros (não vou citar nomes, pois seria antiético), pois nós, compositores "lado B" deste Brasil de ninguém, sabemos que sucesso e/ou fracasso não têm necessariamente que ver com qualidade. Já em relação ao item 2, me atirei, com gosto e com gozo, na obra de Tom Zé e me senti tão constrangido quanto maravilhado com ela. Constrangido por, pesquisador que sempre me senti, não a conhecer. Maravilhado por saber que a música brasileira é tão rica que, por mais que pesquisemos, sempre haverá alguém ainda a nos surpreender. E Tom Zé, graças a Deus, me surpreendeu. E aqui deixo um depoimento: música depende muito do momento de cada um. Uma amiga, Suzy, já tentara, nos primórdios, me sensibilizar com a música de Tom Zé, em vão. Anos depois o milagre se deu.
Tô (Elton Medeiros - Tom Zé)
Mas queria tratar de dois assuntos agora. Um, a
Coca-Cola, e dois, genialidade. Comecemos pela Coca, Cola. Vamulá: mais
da metade de meus parceiros músicos/compositores vive numa eterna
pindaíba no que se refere a grana por justamente tentar manter certo
nível musical em suas composições. Até aí nada de novo, a novidade
consiste em eu saber que 90% desses camaradas (eu incluído) não teriam o
menor pudor de compor uma canção em qualquer estilo considerado menor, caso contactado por algum artista que se dedique a tais gêneros. Certa vez Raul Gil, em seu programa,
lamentou o fato de a MPB ser tão inacessível a programas populares. Pois
bem, Tom Zé não o é! Quem tiver dúvidas veja o olé que Tom Zé deu no programa do Ratinho (eis o link).
Na Parada de Sucesso (Vicente Barreto - Tom Zé)
Resumindo: todo artista tem o direito de viver
dignamente de seu trabalho, seja via canções, jingles ou o que bem lhe
der na veneta. E, se algum fã resolver pôr em xeque tais trabalhos,
sugiro que, em vez de criticar, espernear e proibir, pense antes no que
faria se estivesse no lugar dele. Pensaram? Esse é um calcanhar de
aquiles geral. Eu critico meu ídolo por ele não poder fazer o que eu faria.
Eu, "enquanto" público consumidor, posso, ele não! Jamé! Seria o fim das
ideologias! Hummm... interessante... Em seguida, se o complexo de culpa
doer muito por você sobreviver enquanto os guevaras da MPB morrem, faça
uma vaquinha no fb, um bingo beneficente ou algo que o valha, e
preserve seu ídolo enviando-lhe a $oma atingida. Afinal, quanto mais
desmatam nossa música, menos temos caras como Tom Zé!
Classe Operária (Tom Zé)
Em segundo lugar: a questão da genialidade. Hoje em
dia todo mundo é gênio. E, quando se vulgariza o sentido da genialidade,
vulgariza-se também de fato o que é ser gênio. Há vários parâmetros pra
se medir um gênio. O primeiro (e mais equivocado deles) é, sem dúvida, a
quantidade de canções que estão na boca do povo, ou seja,
"assoviáveis". Ah, mas aí o critério é, além de cruel, injusto, pois
sabemos, até pelos festivais, que o vencedor de hoje pode ser o anônimo
de amanhã. E outra: quanto mais ignorante é um povo, menos relevante é a música radiofônica. E, como nosso povo se encaixa perfeitamente nesse quesito, basta ligar o rádio pra comprovar.
O segundo parâmetro da genialidade é o que um artista representa pra um país, sobretudo internacionalmente. Nesse quesito, tanto Tom Jobim quanto Tom Zé sentiram na pele o que é o descaso brasuca ante a admiração gringa. Aqui nada posso acrescentar. Afinal, dor de cotovelo pode significar, no caso de Jobim, vendido, e, no caso de nosso Tom em questão, que ninguém assovia suas canções. A originalidade cobra seu preço. Há ainda os gênios desconhecidos do grande público que não tiveram um Byrne em suas vidas, mas isso é prosa pra outro estudo. Por ora me despeço deixando com vocês nos entreparágrafos deste texto um pouco mais desse artista único, que não tem medo de dar a cara ao tapa. Quantos dos críticos de plantão teriam essa capacidade?
Amor do Rio (Tom Zé)
Tom Zé e Zélia Duncan
O segundo parâmetro da genialidade é o que um artista representa pra um país, sobretudo internacionalmente. Nesse quesito, tanto Tom Jobim quanto Tom Zé sentiram na pele o que é o descaso brasuca ante a admiração gringa. Aqui nada posso acrescentar. Afinal, dor de cotovelo pode significar, no caso de Jobim, vendido, e, no caso de nosso Tom em questão, que ninguém assovia suas canções. A originalidade cobra seu preço. Há ainda os gênios desconhecidos do grande público que não tiveram um Byrne em suas vidas, mas isso é prosa pra outro estudo. Por ora me despeço deixando com vocês nos entreparágrafos deste texto um pouco mais desse artista único, que não tem medo de dar a cara ao tapa. Quantos dos críticos de plantão teriam essa capacidade?
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Ensaio, TV Cultura
Fabricando Tom Zé, documentário
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Ensaio, TV Cultura
Fabricando Tom Zé, documentário
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Pois é Leo,
ResponderExcluirSabe vosmicê que ouvi uma frase boa dia desses:
- Toda crítica é uma confissão :)
Vou confessar, Roney: concordo! rs
ExcluirAbração,
Léo.
Eu gosto de Tom Zé, mas goto do que eu gosto, não do que já comprei. Também nao gosto do que tentaram me vender, e pra ser sincero, acho interessante David Byrne ter tirado o tom Zé do ostracismo, provavelmente tirou David do ostracismo brazuca que ele amargava.
ResponderExcluirtambém acho esse tribunal dos fás uma das coisas mais babacas dos ultimos tempos rsrsrs qem tem fãs assim não precisa de inimigos... a Coca-cola segue no lucro, porque no novo marketing o que manda é o buzz, o auê.
Nao precisamos ter a ingenuidade de achar que o Tom Zé tem projeçao internacional só porque o David Byrne o lançou? Inflemos Vicente Barreto então e heraldo monte, que foi quem realmente fez o que encantou o Byrne em "Estudando o samba". A gente compra os gênios que a vida nos vende, mas não olhamos os créditos nunca
Sonk, mano, o Tom Zé que me agrada mais é justamente o menos incensado: o Tom Zé compositor de canções. Ele ficou muito conhecido pelo experimentalismo, por usar coisas inusitadas como instrumentos, por arranjos incomuns etc. Isso aí num show é até divertido, mas um disco não se segura só de experimentalismos; se não tiver canção, tudo o mais é só pra inglês ver. E Tom Zé tem canção, é bom de samba, bom de bossa (seu CD "Estudando a Bossa" também é ótimo), pena que alguém um dia o fez acreditar que ele não era bom nisso, pois a partir daí ele trocou um pouco a canção pelo experimentalismo. Mas sua obra como um todo é de mestre. Discos como "Estudando o Samba", "Se o Caso É Chorar" e "Todos os Olhos" são pérolas do cancioneiro brasuca. Quanto a sua projeção internacional, não disse que ele é superconhecido, mas não podemos negar que de vez em quando faz umas turnezinhas pelo globo, né? Quanto aos fãs, tô contigo, assim como em relação ao Vicentão, este sim merecedor de muito mais destaque do que o que tem. Mas esse é o nosso Brasil, injusto Brasil. Aqui neste microuniverso tento apenas fazer minha parte contra tais (e tantas) injustiças.
ExcluirAbração,
Léo.